O conluio de Renan e a falência das instituições brasileiras

A nós, cidadãos e eleitores, fica o estarrecimento por viver em um país onde o presidente do Senado é investigado em 16 inquéritos, o estranhamento de que seu sucessor seja um investigado pela Lava Jato e a indignação ao perceber que todos eles juntos se consideram acima da Lei

Carlos Henrique Carlos Henrique -

Ontem (06) à tarde, enquanto eu finalizava um texto sobre a ascensão de Jorge Viana à Presidência do Senado e conjecturava a respeito do significado disto para o Parlamento, fui surpreendida juntamente com todos os outros brasileiros pela decisão em conjunto da mesa diretora daquela Casa pela desobediência ao STF.

Que Brasília é uma cidade cheia de histórias inacreditáveis todo mundo já sabe, mas o que aconteceu nas últimas 48h com o afastamento de Renan Calheiros da Presidência do Senado, a perspectiva da chegada do petista Jorge Viana à Presidência e por último com a decisão dos próprios senadores pela permanência de Renan no cargo, parece uma daquelas sequencias surreais dos filmes de Quentin Tarantino.

Recapitulando: na Segunda (05), o ministro Marco Aurélio Mello acatou o pedido da Rede Sustentabilidade para que o Supremo considerasse que o exercício dos cargos que estão na linha de substituição da Presidência da República por pessoas que sejam réus seja incompatível com Constituição Federal, e como Renan se tornou réu em um processo de peculato (desvio de recursos públicos) em decisão do próprio STF semana passada, ele foi afastado.

Um dia depois a própria mesa diretora do Senado decidiu em conjunto pela permanência de Renan no cargo, argumento ter decidido aguardar pela apreciação do tema em plenário pelo STF, o que ocorre nesta quarta, dia 07/12. Os senadores que optaram pela desobediência ao STF são do PMDB, PP, PT e PSDB, sendo que o próprio Jorge Viana esteve no STF conversando com 6 dos 11 ministros explicando a “gravidade da situação”.

Volto. Não vou entrar aqui no mérito da liminar do ministro do Supremo – que vem recebendo críticas de vários juristas por seu individualismo institucional. A questão é que discordar de uma liminar do supremo não justifica o descumprimento de uma ordem judicial do STF.

A decisão da Mesa Diretora do Senado de apoiar a atitude de Renan Calheiros (PMDB-AL) de não acatar a determinação do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Marco Aurélio Mello, de afastá-lo da presidência da Casa é vista por procuradores da República como um crime de desobediência. Integrantes do Ministério Público Federal ouvidos reservadamente pela reportagem usam a expressão “golpe institucional” para classificar a resistência do Senado – capitaneada por Renan – em cumprir uma decisão da Suprema Corte.

Neste caso, o crime de desobediência não teria sido cometido só por Renan, mas por toda a Mesa Diretora que assinou nesta tarde o comunicado no qual se recusa a cumprir a decisão do STF.

Numa demonstração de que não entregará o cargo sem longa e dolorosa batalha, Renan apresentou na terça, um terceiro recurso, já à noite. Agora pretende anular o julgamento que deu maioria à tese de que um réu não pode integrar a linha sucessória da Presidência da República.

Para mim, mais grave que a decisão em si é o que ela representa: a total falência do funcionamento das instituições que deveriam salvaguardar o funcionamento da República. Isto já tem assustado o mercado e ontem à tarde antes do fechamento da bolsa corriam boatos do afastamento de investidores internacionais que não sentem segurança em colocar seu rico dinheirinho em um país aonde não existe o menor respeito entre os 3 poderes.

Renan parece acometido de uma megalomania exacerbada que o faz pensar estar acima da lei, tanto que ontem ele despachou o oficial de justiça por duas vezes e insinuou que tal decisão do Ministro seja por medo de corte nos vencimentos, uma referência ao projeto apoiado por Renan que pretende colocar os vencimentos do judiciário no teto constitucional.

A questão é que não cabe a Renan ou à surreal mesa diretora do Senado questionar a ordem do Supremo e sim cumpri-la pois para o questionamento existem os caminhos legais. Com este conluio os senadores sapateiam na decisão do Ministro Marco Aurélio Mello e jogam gasolina na crise institucional brasileira.

A nós, cidadãos e eleitores, fica o estarrecimento por viver em um país onde o presidente do Senado é investigado em 16 inquéritos, o estranhamento de que seu sucessor seja um investigado pela Lava Jato e a indignação ao perceber que todos eles juntos se consideram acima da Lei. Dá aquela sensação de que não temos pra onde correr e de que não há representantes comprometidos com o povo no legislativo brasileiro, dá aquela apreensão que sentimos nas sequências dos filmes de Tarantino mas infelizmente aqui não é fantasia mas vida real. A vida da nossa dilapidada Nação.

Eva Cordeiro é economista e professora universitária. Escreve todas as terças-feiras.

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