Especialistas explicam por que discurso de palestras em Anápolis remetem à “cura gay”

Debate a respeito de liberdade religiosa e discriminação teve início após membros da Church City promoverem falas transfóbicas em colégios do município

Augusto Araújo Augusto Araújo -
Fachada do CEPI Dr. Mauá Cavalcante Sávio, no Residencial Pedro Ludovico, em Anápolis. (Foto: Samuel Leão/ Portal 6)

Depois que vieram à tona palestras com discursos transfóbicos de integrantes do movimento ‘Resgatados’, braço da igreja Church City, feitas em colégios de Anápolis, uma grande discussão surgiu a respeito de discriminação e liberdade religiosa.

Portal 6 conversou com especialistas para tratar dessa questão e explicar o porquê das falas propagadas pelos missionários remetem ao tema da ‘cura gay’.

O advogado Alex Costa, especialista em Direitos Humanos, Direito da Homoafetividade e LGBTI+, explicou que não há problemas em movimentos religiosos manifestarem a própria fé, doutrinas e códigos sagrados em locais públicos, como escolas.

No entanto, o profissional destacou que as palestras promovidas pela Church City são problemáticas por entrarem em um discurso discriminatório.

Isso porque uma das missionárias faz um relato pessoal onde afirma ter sido um homem trans, mas que se arrependeu e reverteu o processo de identificação de gênero, após conhecer Jesus.

Alex Costa é advogado especialista em Direitos Humanos, Direito da Homoafetividade e LGBTI+. (Foto: Reprodução/Redes Sociais)

“Essas crianças e adolescentes LGBTs estão em um processo de formação de personalidade, de identidade, com diversos conflitos. Ao dar esse testemunho pessoal dela, a missionária dá de uma forma muito negativa, falando que não era feliz, que fez escolhas erradas – como se sexualidade fosse uma escolha – e que vivia uma vida vazia, que só foi preenchida ao conhecer Jesus. Assim, essa criança trans vai começar a se auto-rejeitar, pensando que ser quem ela é não é bom”, afirma Alex.

O especialista ainda destacou que esse discurso discriminatório é feito de uma forma muito velada. No entanto, ele atinge essa população, que acaba constrangida e reprime a própria identidade.

“Essas crianças e adolescentes muitas vezes ainda não tem a maturidade para entender a mensagem que eles querem realmente passar. É como se dissesse ‘Você pode ser LGBT, mas Jesus te cura. Deus te aceita, mas ele te transforma. Mas uma pessoa pode ser trans e cristã. Qual é o problema?”, argumentou.

Bruno Ferreira, psicólogo e professor universitário, explica ainda que a maioria dos homossexuais sofrem não é por não aceitarem a condição, e sim, pelo preconceito. “Se a gente entende que ninguém decide ou escolhe ser homossexual e dentro desse contexto é apresentado uma proposta que é possível, entre aspas, ser uma pessoa normal, como defende alguns religiosos, aumenta o sofrimento”, explica.

O especialista acrescenta que o sofrimento tem como base o preconceito, não aceitação da família e a sociedade como um todo. “Os preconceitos são respaldados nessas falas, de que é só querer que você muda. E não é assim que funciona. Infelizmente a gente tem esse discurso reforçado o tempo. E esse discurso é perigoso porque tem jovens que vão ouvir e pensar que o existir dele é errado por conta desse tipo de fala”, finaliza.

Bruno Ferreira, psicólogo e professor universitário. (Foto: Reprodução/Redes Sociais)

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