SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, afirmou nesta sexta-feira (23) que a quantidade de ajuda humanitária liberada por Israel à Faixa de Gaza desde o início da semana “equivale a uma colher de chá”, quando “uma enxurrada de assistência é necessária”.
“Sem acesso rápido, confiável, seguro e sustentado à ajuda, mais pessoas morrerão -e as consequências a longo prazo para toda a população serão profundas”, disse Guterres a jornalistas.
Cerca de 300 caminhões de ajuda entraram no território palestino pela passagem de Kerem Shalom desde a última segunda-feira (19), quando Tel Aviv levantou um bloqueio de 11 semanas. A quantidade, porém, não é suficiente para aplacar a crise humanitária -antes da guerra, os mais de 2 milhões de habitantes de Gaza precisavam de 500 caminhões por dia de ajuda, segundo a ONU.
Além disso, o transporte dos suprimentos dentro do território é um desafio diante de falta de combustível e das estradas destruídas por bombardeios. Até o momento, apenas cerca de um terço desses caminhões foram transportados da passagem para armazéns em Gaza devido à insegurança, segundo Guterres.
Apesar da situação descrita como catastrófica por entidades locais, Israel resiste a fazer uma abertura mais ampla sob a justificativa de que o Hamas estaria desviando ajuda, o que o grupo terrorista nega. Em vez disso, Tel Aviv quer retomar a assistência após um novo modelo de distribuição apoiado pelos Estados Unidos e administrado pela recém-criada Fundação Humanitária de Gaza esteja em funcionamento.
A proposta envolveria o uso de empresas de segurança privadas para transportar ajuda aos centros para distribuição e estaria pronta no final do mês, segundo o Estado judeu. Organizações humanitárias, porém, falam que tirar o plano do papel em meio a um conflito demoraria semanas.
A ONU, por exemplo, afirma que a ideia não é imparcial nem neutra e que não estará envolvida. Nesta sexta, o secretário-geral sinalizou novamente que as Nações Unidas não participarão de um novo plano de distribuição apoiado pelos EUA.
“As Nações Unidas foram claras: não participaremos de nenhum esquema que desrespeite o direito internacional e os princípios humanitários de humanidade, imparcialidade, independência e neutralidade”, disse Guterres. Segundo ele, a ONU e seus parceiros têm um plano para levar a ajuda necessária a Gaza.
“Os suprimentos -160 mil paletes, o suficiente para encher quase 9.000 caminhões- estão esperando”, disse o chefe da ONU. “Este é o meu apelo por ajuda vital para o povo sofredor de Gaza: vamos fazer direito. E vamos fazer isso imediatamente.”
A pressão de aliados ocidentais de Israel, responsável pela tímida abertura no início da semana, segue nesta sexta.
Um porta-voz do governo da Alemanha, por exemplo, afirmou que o auxílio era “muito pouco, muito tarde e muito lento”. “Agora é uma questão de aumentar significativamente (…) e garantir que esses suprimentos de ajuda cheguem à população para que o sofrimento na Faixa de Gaza chegue ao fim”, afirmou.
Já o ministro das Forças Armadas Britânicas, Luke Pollard, discordou dos comentários do primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, que na quinta acusou os líderes de França, Reino Unido e Canadá de apoiarem o Hamas por criticarem o Estado judeu.
Ao programa Today, da rede britânica BBC, ele afirmou que a melhor forma de levar a paz ao Oriente Médio “é com um cessar-fogo imediato sendo restaurado em Gaza, com o Hamas libertando os reféns sem mais demora e com a chegada de grandes quantidades de ajuda ao povo palestino em Gaza”.
“Apoiamos o direito de Israel à autodefesa, desde que a conduza dentro do direito internacional humanitário; uma posição que temos desde aqueles terríveis ataques de 7 de outubro. Também temos plena clareza de que precisamos que a ajuda chegue às pessoas que estão realmente sofrendo em Gaza”, afirmou.
A porta-voz do governo da França, Sophie Primas, disse não aceitar essa acusação. “Não confundimos o povo israelense com as políticas adotadas hoje por Binyamin Netanyahu”, disse Primas. “Vocês sabem das grandes e imensas reservas que temos, particularmente em relação ao que está acontecendo em Gaza.”