Sem vacina, sem aula. E com vacina?

José Fernandes José Fernandes -
(Foto: Reprodução)

O Governo Federal, o Governo de Goiás e a Prefeitura de Anápolis já se manifestaram sobre o retorno às aulas presenciais. O protocolo de Biossegurança que o Governo Federal divulgou inclui medidas de proteção e prevenção à Covid-19, parâmetros para a gestão da retomada de atividades presenciais e monitoramento após o retorno das aulas.

O Governador Ronaldo Caiado por reiteradas vezes condicionou o retorno às aulas presenciais à vacinação dos professores, e no último 08 de junho afirmou em entrevista que via condições de os professores estarem aptos para irem às salas de aula em agosto.

Por sua vez, a Prefeitura de Anápolis se manifestou, através da Secretaria Municipal de Educação, afirmando que as aulas presenciais retornarão no 09 de agosto, e adotará o sistema híbrido atendendo também aqueles que optarem pelo ensino remoto.

Logo, o retorno ao modo presencial será opcional e caberá aos responsáveis pelos alunos decidir se levam ou não para a escola.

Algumas pessoas estão questionando:

1) Do que adianta um professor vacinado, numa sala de aula com 35 alunos não vacinados?
2) Com ou sem vacina, é prudente o retorno das aulas em um país que é o 2º com mais mortes de crianças por Covid-19?
3) Porque não aguardar a vacinação também dos alunos para o retorno seguro às aulas presenciais?

Dos arautos do pessimismo até aos mais ousados e considerados irresponsáveis por estimular o retorno às aulas presenciais, a ideia desse artigo é trazer algumas reflexões importantes, incluindo as respostas aos questionamentos anteriormente citados.

Dos casos reportados no mundo de infecção por coronavírus, crianças e adolescentes representam 9% dos casos, sendo que de 2% a 3% do total foram hospitalizadas.

Óbvio que a vida de uma única importa, mas está comprovado cientificamente que crianças contribuem pouco para a cadeia de transmissão da doença, o que reduz significativamente o impacto da reabertura das escolas na pandemia.

Ao contrário de outras infecções respiratórias virais, as crianças não são os principais vetores da transmissão.

É imensurável o dano que essa geração sofrerá em sua formação educacional, social e humana devido ao fechamento das escolas, consequência da pandemia.

Mas, além da formação educacional, devemos atentar que a ausência de aulas presenciais oferece riscos irreversíveis à saúde das crianças, agravando condições psiquiátricas, comprometendo a segurança alimentar, aumentando o número de abusos e maus tratos, uso de drogas, violência e a taxa de gravidez infantil. Divulguei maciçamente esse tema, enquanto médico e agente público sobre a Campanha do “Maio Laranja”.

Independente da classe social, há evidências de graves danos à saúde física e mental das crianças e adolescentes. Um estudo da Academia Americana de Pediatria (2020) com quase 13 mil crianças, registrou taxas significativamente mais altas de comportamentos suicidas (até 3,7 vezes maior em relação ao ano anterior) nos 3 meses de grande isolamento social e de escolas fechadas, sem socialização. Em tempo, quero deixar registrado que sou a favor do “Homeschooling” sob determinadas condições, mas isso é tema para outra oportunidade.

No Brasil, um estudo conduzido pelo Instituto Sou da Paz, UNICEF e Ministério Público do Estado de São Paulo mostra que 83% dos estupros de vulnerável durante a pandemia ocorreram dentro de casa, sendo que três em cada quatro vítimas de estupro no período são crianças. Essa realidade, tenho o desprazer de vivenciar durante os plantões como médico legista aqui em nossa cidade de Anápolis.

Haverá benefícios com o retorno das aulas. Por exemplo: a redução da desigualdade educacional, redução dos impactos negativos na saúde da criança e adolescente em médio e longo prazo, manutenção de emprego e redução do impacto econômico do fechamento de escolas privadas (vale ressaltar que já começaram as aulas presenciais com número reduzido de alunos).

Mas os desafios do retorno são conhecidos pelos gestores públicos e já foram elencados no início desse artigo e vale repetir, como a busca de informações de qualidade com vistas a seguir os protocolos de biossegurança e treinamento das equipes escolares.

Sobre a vacinação para crianças e adolescentes, a Organização Mundial de Saúde se manifestou há três dias, afirmando que não recomenda a vacina nesse momento para pessoas entre 12 e 18 anos de idade, já que ainda não existe evidência suficiente de bons índices risco-benefícios. O que afasta, ao meu ver, o argumento de que é mister aguardar a vacinação desse público para o retorno às aulas presenciais.

Concordo com o retorno como programado pelos gestores públicos, com os professores vacinados e oferecendo a todos um ambiente de aprendizagem seguro e acolhedor, sem prejudicar ainda mais nossas crianças, e a História balizará os erros e acertos de todas essas medidas.

José Fernandes é médico (ortopedista e legista) e bacharel em direito. Atualmente vereador em Anápolis pelo PSB. Escreve todas às sextas-feiras. Siga-o no Instagram.

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