Quilombola é amarrado e espancado por comerciante no interior do RN

Caso ganhou repercussão a partir desta segunda-feira (13), depois de o vídeo da agressão viralizar nas redes sociais

Folhapress Folhapress -
O quilombola Luciano Simplício, 23, que foi amarrado, arrastado e agredido com pontapés por comerciante em Portalegre (RN), no último sábado (11) (Foto: Divulgação)

Luiz Henrique Gomes, do RN – Um quilombola foi amarrado, arrastado e agredido com pontapés por um comerciante no último sábado (11) no município de Portalegre (RN), distante 373 quilômetros de Natal.

O caso ganhou repercussão a partir desta segunda-feira (13), depois de o vídeo da agressão viralizar nas redes sociais. Nele, o quilombola Luciano Simplício, 23, aparece deitado no asfalto com as mãos e os pés amarrados por uma corda e recebe pontapés de um comerciante identificado como Alberan Freitas -que alega que Simplício arremessou uma pedra em seu comércio.

O inquérito para apurar o caso foi aberto pela Polícia Civil ainda no sábado. Nesta terça (14), a delegada-geral do Rio Grande do Norte, Ana Cláudia Saraiva, afirmou que as imagens apontam para o crime de tortura e maus-tratos, mas que ainda é preciso aguardar o término da investigação.

“É prematuro afirmar se o agressor vai ser indicado por tortura ou maus-tratos porque há nuances entre um crime e outro que só podem ser ditos no final da investigação”, disse.

Segundo a delegada, Freitas também pode ser indiciado por racismo, mas isso depende de elementos testemunhais colhidos no inquérito. “Também vamos apurar, a partir das testemunhas, se houve motivações racistas para a agressão. É algo que vai depender do que ele expressou naquele momento da agressão”, disse.

A possível participação de outras pessoas no crime também é investigada. O inquérito deve ser concluído até este final de semana, de acordo com a Polícia Civil.

A agressão teria acontecido após Freitas e Luciano discutirem na frente do estabelecimento do comerciante. Relatos dos moradores afirmam que o quilombola teria sido chamado de “bandido e drogado” por Freitas e acabou arremessando uma pedra contra o local.

“O que é meu eu tenho o direito de defender”, disse o agressor no vídeo, enquanto Simplício grita de dor.

Freitas afirmou à Polícia Civil, em seu depoimento, que a discussão com Simplício começou após o quilombola pedir um pouco de comida em uma confraternização do comerciante com os amigos e se recusar a sair depois de ter o pedido atendido.

Segundo ele, Simplício “se alterou” e começou a ameaçá-lo de morte. Depois de pedir para que ele se afastasse, o quilombola teria arremessado a pedra no estabelecimento, vizinho à casa em que mora. A reação teria sido uma forma de “defender o patrimônio”, segundo o comerciante.

A reportagem não conseguiu ouvir Freitas nesta terça.

Os dois foram conduzidos no mesmo dia pela Polícia Militar para a 4ª Delegacia Regional de Polícia de Pau dos Ferros, município vizinho a Portalegre, antes de o vídeo ganhar repercussão nas redes sociais.

Simplício foi autuado por depredação e Freitas, por lesão corporal. Os policiais que conduziram os dois não presenciaram a agressão.

Após a repercussão do vídeo, um áudio atribuído ao comerciante também passou a ser difundido nas redes sociais. Entretanto, até esta terça, ele não havia chegado ao conhecimento da delegada-geral.

Nele, uma voz masculina, supostamente de Freitas, afirma que repetiria novamente a agressão.

Segundo relatos de moradores da região, Simplício é quilombola da comunidade do Pega, em Portalegre, e está em situação de rua desde que perdeu os pais. A partir daí, ele teria passado a fazer uso abusivo de álcool.

A governadora Fátima Bezerra (PT), numa rede social, afirmou que havia determinado a “apuração imediata e rigorosa” do caso e que o estado “não será conivente”.

O caso também é acompanhado pela Conaq (Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos) e pela Coordenadoria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial do Rio Grande do Norte (Coeppir). As duas entidades afirmaram que estão dando apoio jurídico e de proteção à vítima.

A Conaq afirmou que o crime se configurou tortura e uma reprodução da escravidão. “Para a Conaq, a agressão foi motivada pelo racismo e a certeza de impunidade. O linchamento de jovens negros pela sociedade brasileira evidencia segregação racial e social tão presentes no dia a dia do povo preto do Brasil”, afirmou, em nota.

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