Partido de Mandela perde 71 assentos no Parlamento e começa a negociar aliança

De acordo com os resultados oficiais, divulgados neste domingo (2), o CNA (Congresso Nacional Africano) conquistou 40,1% do eleitorado, abaixo dos 50% necessários para garantir uma maioria e governar sem necessidade de coalizão.

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(Foto: Freepik)

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Os eleitores sul-africanos deram ao histórico partido de Nelson Mandela, dominante na cena política nos 30 anos desde o fim do apartheid, seu pior resultado nas urnas da história democrática da África do Sul.

De acordo com os resultados oficiais, divulgados neste domingo (2), o CNA (Congresso Nacional Africano) conquistou 40,1% do eleitorado, abaixo dos 50% necessários para garantir uma maioria e governar sem necessidade de coalizão.

Fustigado pela alta no desemprego, forte desigualdade e os constantes apagões que viraram símbolo da crise na África do Sul, o CNA perdeu 71 assentos e deve ter 159 das 400 vagas do Legislativo.

Em seguida, o partido de centro-direita AD (Aliança Democrática), principal força de oposição e liderado por John Steeinhuisen, marcou 21,8%, garantido 87 cadeiras no Parlamento. Duas siglas populistas de esquerda que surgiram a partir de dissidências do CNA também tiveram resultados relevantes: o MK, do ex-presidente Jacob Zuma (2009-2018), conquistou 14,5% do eleitorado, equivalente a 58 assentos, e o CLE (Combatentes da Liberdade Econômica) teve 9,5% e elegeu 39 parlamentares.

Com esse resultado, o CNA terá de escolher um caminho para continuar governando: uma aliança com a AD, o que daria uma feição moderada e pró-mercado ao governo, ou fazer o movimento oposto, coligando-se com um dos partidos populistas de esquerda, o que deve descredibilizar o país, visto que tanto o MK quanto o CLE defendem a estatização de boa parte dos serviços e do setor de mineração, importante para a economia.

Qualquer um desses cenários terá o efeito de um terremoto político, com repercussões em toda a África. Não é comum, afinal, um partido de libertação nacional ser rechaçado dessa forma pelos eleitores no continente e o CNA, além de carregar o imenso legado de Mandela, é descendente de um dos mais antigos movimentos anticoloniais da África.

Ainda existe a possibilidade de que o presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, permaneça no poder, mas o resultado eleitoral decepcionante pode forçar o líder a renunciar.

“Os sul-africanos esperam agora que os partidos possam se entender, resolver suas diferenças e agir em conjunto para o bem de todos. Foi isso que a população disse nas urnas”, afirmou Ramaphosa depois que os resultados oficiais foram anunciados. Ele chamou o pleito de “uma vitória da nossa democracia”, e disse que “é hora de colocar a África do Sul em primeiro lugar”.

Os partidos do país têm duas semanas até a posse do novo Parlamento para entrar em um acordo e formar uma coalizão escolher o presidente que, ainda que não seja Ramaphosa, provavelmente será um nome do CNA, visto que o partido ainda é o maior no Legislativo. A liderança da sigla afirmou no domingo que está disposta a conversar com todos os partidos para negociar uma coalizão.

Autoridades do CNA disseram que o resultado das eleições foi duro e que não havia nada a se comemorar. O secretário-geral do CNA, Fikile Mbalula, afirmou que não aceitará pressão para a renúncia de Ramaphosa.

“Sim, nós cometemos erros, ao governar e em outras áreas também, mas estamos comprometidos em formar um governo que seja estável e eficiente”. A liderança da sigla vai se reunir na próxima terça-feira (4) para discutir os próximos passos.

A principal central sindical do país também demonstrou apoio à permanência de Ramaphosa na presidência. “O mais importante é que a coalizão seja liderada pelo CNA e por Ramaphosa”, disse um porta-voz do Cosatu (Congresso Sul-Africano de Sindicatos).

O líder do principal partido de oposição, John Steenhuisen, da AD, confirmou no domingo que seu principal objetivo será impedir uma coalizão do CNA com os partidos de esquerda MK e CLE um cenário que Steenhuisen chamou de “apocalipse”.

“Enfiar a cabeça em um buraco enquanto a África do Sul enfrenta a sua maior ameaça desde a redemocratização não é uma opção para nós da AD”, afirmou.

Steenhuisen, que é membro da minoria branca do país, fez uma campanha baseada na ideia de recuperar a eficiência do governo sul-africano. No último comício antes da votação, em Joanesburgo, chegou a arriscar algumas palavras em idiomas africanos para passar uma mensagem de meritocracia.

“Nosso partido não é apenas ‘khuluma, khuluma e khuluma’ [falar, falar e falar], nosso partido entrega, entrega e entrega”, discursou Steenhuisen (pronuncia-se “stenrêisen”), usando uma palavra na língua zulu. A AD é acusada por opositores, especialmente por membros do CNA, de ser um partido que representa apenas os brancos, cerca de 9% da população sul-africana.

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