Esquerda usa ‘Bolsonaro réu’ e aniversário do golpe e descola de governo em atos contra anistia e 1964
Foram anunciadas ao menos 30 manifestações entre sexta (28) e terça-feira (1º), em 20 cidades


JULIANA ARREGUY E VICTÓRIA CÓCOLO
Animados pela decisão que tornou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) réu sob acusação de envolvimento na trama golpista, movimentos de esquerda marcaram uma sequência de atos ao longo desta semana contra pedidos de anistia aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro e em memória dos 61 anos do golpe militar.
Foram anunciadas ao menos 30 manifestações entre sexta (28) e terça-feira (1º), em 20 cidades.
As frentes Povo Sem Medo e Brasil Popular farão 29 mobilizações, em municípios de diversos estados do país. Já o coletivo de advogados Prerrogativas promoverá um ato na segunda-feira (31), na PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), na capital paulista.
Pelo segundo ano consecutivo, o governo Lula (PT) não realizará atos oficiais em memória da data que marca o golpe militar de 1964.
No ano passado, no aniversário de 60 anos, o presidente orientou os ministérios a não fazerem nem críticas nem cerimônias ligadas ao tema, em uma tentativa de não tensionar a relação com os militares.
Em 2025, no entanto, o clima proporcionado pelo julgamento de Bolsonaro incentivou grupos próximos ao governo a lembrarem a data.
O grupo Prerrogativas –com ao menos cinco integrantes em cargos públicos na gestão Lula– coordena o ato público Sem Anistia na PUC-SP, que contará com integrantes históricos do PT, como José Dirceu e José Genoino. O mote é oposição ao perdão aos envolvidos no 8 de janeiro e o aniversário do golpe de 1964.
Parte do grupo manifestou arrependimento por não ter organizado nenhum evento no ano passado. Integrante do governo demonstraram certo incômodo com o ato, segundo interlocutores. Para um membro da secretaria nacional do PT, que disse compreender o simbolismo, o tema da anistia não deveria ser abordado, porque poderia intensificar a tensão no país.
O ex-presidente da Comissão da Verdade de São Paulo Adriano Diogo (PT) diz que outro fator importante para a realização do ato da PUC-SP foi a repercussão do filme “Ainda Estou Aqui”, que conta a história do ex-deputado Rubens Paiva, morto pela ditadura.
“A culpa de não ter tido nada oficial do governo no ano passado foi do José Múcio [ministro da Defesa, responsável pela articulação com o Exército]. O que mudou a conjuntura foi o filme e o Oscar de Ainda Estou Aqui, tanto que a família Paiva foi recebida no Palácio do Planalto”, afirmou Adriano Diogo.
No ano passado, Lula disse que preferia não ficar “remoendo” sobre o golpe de 1964 porque isso “faz parte do passado” e ele queria “tocar o país para frente”.
Questionado, o presidente do Prerrogativas, Marco Aurélio de Carvalho, afirmou não considerar a postura do governo omissa.
“Lula tem comemorado a vitória da democracia no dia 8 de janeiro, o que também é uma forma de recordar os períodos pelos quais nosso país passou. Nós, como sociedade civil, faremos nossa parte”, afirmou.
O Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania afirmou que a pasta demonstra, por meio de ações, seu compromisso com a democracia, a verdade e a memória da história política do Brasil. Em nota, destacou ações em março sobre o tema.
Entre eles, está o pedido de desculpas da ministra Macaé Evaristo às famílias de mortos e desaparecidos por negligência da União na guarda e identificação de remanescentes da vala de Perus.
Apesar da falta de eventos oficiais por parte do governo, as frentes Povo Sem Medo e Brasil Popular esperam para o ato de domingo (30), em São Paulo, quadros da base do governo Lula, como o líder do PT na Câmara Lindbergh Farias (PT-RJ) e os também deputados Erika Hilton (PT-SP) e Guilherme Boulos (PSOL-SP).
A ideia é uma caminhada da avenida Paulista até o antigo DOI-Codi (Destacamento de Operações de Informação – Centro de Operações de Defesa Interna), principal centro de tortura da ditadura militar na cidade.
As frentes são integradas por militantes de PT, PSOL, PCdoB, PV e Rede, além de entidades como CUT (Central Única dos Trabalhadores), MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) e UNE (União Nacional dos Estudantes).
Coordenadora nacional do MTST e da frente Povo Sem Medo, Ana Paula Ribeiro diz que a proximidade das datas do julgamento da denúncia de Bolsonaro e do golpe de 1964 tornou a realização do ato ainda mais simbólica.
“A gente quis juntar essas duas pautas porque elas se relacionam demais. Bolsonaro, nos seus quatro anos de governo, investiu nesse tema [da ditadura] dizendo que não foi golpe, alimentou a vida política de militares, tratou os militares da ditadura como heróis. E a gente continua nas ruas por memória e justiça, lembrando dos presos e torturados na ditadura e atuando para que isso não se repita”, afirmou.
Ela disse também declarou que os movimentos sociais sempre se manifestaram na data, independentemente de apoio do governo federal. “É uma opção do governo [a ausência de atos oficiais], não nos cabe julgar nesse aspecto”, disse.
O grupo também manifestará repúdio às articulações no Congresso pela anistia aos envolvidos nos ataques de 8 de janeiro.
“O Brasil exige justiça”, disse Guilherme Boulos, que tem feito publicações nas redes sociais convocando para o ato em São Paulo.
Cidades com atos marcados:
28.mar
– Goiânia (GO): Praça Universitária, às 16h
29.mar
– Campo Grande (MS): Praça do Rádio, às 9h
– Feira de Santana (BA): Praça do Nordestino, às 9h
– Itabuna (BA): Praça Adami, às 9h30
30.mar
– Belém (PA): Praça da República, às 8h30
– Belo Horizonte (MG): Praça da Independência, às 9h
– Recife (PE): Parque Treze de Maio, às 9h
– São Luís (MA): Praça Benedito Leite, às 9h
– Curitiba (PR): Praça João Cândido, às 9h30
– Brasília (DF): Eixão Norte, às 10h
– São Paulo (SP): Praça Oswaldo Cruz, às 13h
– Fortaleza (CE): Estátua da Praia de Iracema, às 16h
31.mar
– Niterói (RJ): Reitoria da UFF, às 10h30
– Ribeirão Preto (SP): Esquina Democrática, às 16h
– Fortaleza (CE): Sede do PT no Ceará, às 18h30
1°.abr
– Aracaju (SE): Calçadão da João Pessoa, às 8h
– Campo Grande (MS): Praça do Rádio, às 9h
– Feira de Santana (BA): Praça do Nordestino, às 9h
– Itabuna (BA): Praça Adami, às 9h30
– Niterói (RJ): Reitoria da UFF, às 10h30
– Brasília (DF): Quadra 01 Bloco J (Setor Bancário Sul), às 12h
– Salvador (BA): Praça da Piedade, às 14h30
– João Pessoa (PB): Prédio da OAB/PB, às 15h
– Rio de Janeiro (RJ): Dops/AIB, às 15h
– Teresina (PI): Praça do Fripisa, às 16h
– Ribeirão Preto (SP): Esquina Democrática, às 16h
– Uberlândia (MG): Câmara Municipal, às 17h
– São Paulo (SP): Pateo do Collegio, às 18h
– Fortaleza (CE): Sede do PT no Ceará, às 18h30