Cabides de arame viram símbolo em ato a favor do direito ao aborto nos EUA

Segundo protestantes, eles simbolizam o modo que os abortos eram feitos antes da liberação

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Número de abortos caiu 60% no Texas após entrada em vigor de lei mais restritiva dos EUA (Foto: Flickr)

RAFAEL BALAGO
WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS) – Na tarde desta terça (3), centenas de pessoas foram até a frente da Suprema Corte protestar contra o possível fim da liberação do aborto no país. Ainda surpresos com a noticia de que a Justiça pode derrubar esse direito por completo, manifestantes pediam medidas para tentar manter o aborto liberado, como aumentar o número de juízes da corte e, assim, anular a maioria conservadora atual.

No protesto, várias mulheres erguiam cabides de arame. “Eles simbolizam o modo que os abortos eram feitos antes da liberação, e esta é a direção em que estamos indo, se este direito for tirado”, comentou Marcy Marquuis, 57, que levava vários deles.

A ponta dos cabides era uma ferramenta usada por mulheres que queriam tentar interromper a gravidez mas não tinham acesso a apoio médico para isso. O ato pode trazer sérias complicações e riscos.

“Isso vai se tornar perigoso agora, estar grávida e não saber que está”, comenta Mary Eyrn, 56, uma das manifestantes que também exibia um cabide. Leis aprovadas nos últimos meses, em estados como o Texas, impedem o aborto com poucas semanas de gravidez, quando muitas vezes a gestação ainda não foi sentida.

Eyrn contou que veio protestar para tentar defender os direitos de sua nora, que é colombiana. “Ela já tem um filho, e quero que ela possa ter escolha sobre ter outros ou não.”

Uma versão inicial de uma decisão da Suprema Corte, revelada na noite de segunda (2) pelo site Politico, mostrou que os juízes consideram derrubar por completo a decisão chamada de Roe x Wade, que liberou o aborto nos EUA em 1973. A decisão, no entanto, ainda não foi tomada de modo oficial pela corte. Isso deve ocorrer até julho.

Logo após a divulgação da notícia, ainda na noite de segunda, manifestantes foram protestar na frente da Suprema Corte. Na tarde desta terça, havia algumas centenas de manifestantes que defendiam o direito de escolha da mulher, e cerca de dez que defendiam o veto ao aborto.

Ativistas pró escolha fizeram discursos pedindo pelo aumento de juízes na Suprema Corte. “Eles querem que fiquemos sem esperanças, que fiquemos tristes. Mas isso não vai acontecer, porque temos um plano. Aprovar uma lei [no Congresso] para garantir o direito ao aborto não é suficiente. O suficiente é ter mais assentos”, disse Maya Patel, uma das ativistas que discursaram.

Com a criação de mais quatro cadeiras, o presidente Joe Biden nomear mais magistrados e, assim, eliminar a atual maioria conservadora na corte, de 6 a 3.

A medida foi endossada pelo senador democrata Ed Markey, de Massachussets. Em discurso para os ativistas, na porta da Suprema Corte, ele defendeu que a medida compensaria o que ele considera dois assentos roubados pelos republicanos. Ele chamou a situação atual da Suprema Corte de “maioria ilegítima”.

Em 2016, a oposição impediu Barack Obama de nomear um novo juiz, pouco antes das eleições presidenciais. Em 2020, fez o oposto: acelerou procedimentos para que o presidente Donald Trump pudesse fazer uma indicação meses antes do fim de seu mandato.

“Expandir a Suprema Corte não é simplesmente uma posição de princípios. É uma necessidade prática. A ala extremista de direita não vai parar, e nós também não vamos. O Congresso já fez isso antes e deve fazer isso agora de novo”, defendeu. “Vocês estão prontos pra lutar?”

No entanto, aumentar o número de assentos na Corte demanda também acabar com a regra chamada de filibuster, que permite ao partido minoritário travar medidas que não tenham 60% de apoio no Senado.

Atualmente, a Casa tem 50 senadores de cada partido, o que permite aos republicanos barrar o avanço de medidas de interesse dos democratas. A questão é que se a regra for extinta, os próprios democratas podem perder esse poder de veto, caso sejam minoria no futuro.

Ativistas ouvidos pela reportagem disseram terem sido surpreendidos com a notícia de que o aborto poderá ser banido por completo e que não sabem bem o que esperar do futuro. “Nunca pensei que o direito ao aborto poderia ir embora. E a ideia de ter mais juízes pode virar realidade, mas acho que vai levar um bom tempo”, avalia Eyrn, que defende o direito ao aborto.

“Fiquei realmente chocado. Não esperava que viesse uma mudança neste sentido”, comentou Jonathan Darnell, 40, contrário à interrupção da gravidez, que segurava um cartaz com uma enorme foto de um feto de seis semanas.

Darnell avalia que o cenário futuro, caso Roe x Wade seja derrubada de fato, será de confusão, com parte dos estados permitindo o aborto e parte deles vetando. “Se você comete um crime em um estado, você tem de ser extraditado para o seu estado, mas não acho que isso vá acontecer neste caso. Esse tipo de coisa precipitou nossa guerra civil. Não sei o que vai acontecer.”

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