Entidades criticam ‘bolsa-arma’ para mulheres vítimas de violência em Goiás: “piora o problema”

Aprovado na Assembleia Legislativa, projeto concede benefício de R$ 2 mil para que o grupo adquira arma de fogo

Emilly Viana Emilly Viana -
Fachada da Assembleia Legislativa de Goiás (Alego-GO). (Foto: Divulgação)

O projeto de lei que cria uma bolsa para aquisição de armas de fogo às mulheres vítimas de violência é descrito como “absurdo” e “incoerente” por representantes de entidade que defendem os direitos das mulheres em Goiás. A matéria foi aprovada, em votação definitiva nesta terça-feira (13), na Assembleia Legislativa.

A presidente do Conselho Estadual da Mulher (Conem), Ana Rita Marcelo de Castro, diz que, além de não ser eficiente, a medida pode agravar a situação. “Trabalho diretamente com essas vítimas e vejo que uma arma não evitaria novas agressões, é uma coisa absurda. Estamos falando sobre mulheres que estão vulneráveis diante da violência que sofreram e de um objeto que pode ser usado contra elas. O projeto tem boa intenção, mas piora o problema”, afirma.

Na luta contra a reincidência das agressões – uma das justificativas da proposta, de autoria do deputado Major Araújo (PL) – os principais desafios estão, sobretudo, garantir que a mulher consiga denunciar o caso. “Em mais de 90% dos feminicídios, não houve denúncia anterior. Se o acesso à Justiça é difícil e as medidas demoram, estamos contribuindo para a insegurança. Uma legislação mais severa também ajudaria a acabar com o medo”, acrescenta.

Para Fabíola Rodrigues, presidente Comissão da Mulher Advogada da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional de Goiás (OAB-GO), a ação dá à mulher um “dever de polícia”. “É incoerente. Somos orientados pelas forças de segurança a não resolver crimes por conta própria e agora querem dar arma para a mulher se virar. Seria muito melhor usar esse dinheiro para que as vítimas consigam se prover fora dos lares onde sofrem violência”, avalia.

O conselho da OAB Goiás deve ser reunir na próxima segunda-feira (19) e pautar o assunto. Segundo Fabíola, a entidade pode emitir uma recomendação para que o governador Ronaldo Caiado (UB) não sancione o projeto. “A Ordem já se manifestou em outros casos, então creio que seja essa a tendência. Ainda estamos avaliando a matéria, que é recente, até mesmo quanto à constitucionalidade”, informa.

‘Discussão equivocada’

A ex-vereadora e ex-secretária de Direitos Humanos de Goiânia, Cristina Lopes, considera que o projeto reflete como o Legislativo goiano enxerga a pauta de violência contra a mulher. Dra. Cristina, como é conhecida, já foi vítima de uma tentativa de feminicídio e avalia que faltou tempo de debate e consulta a especialistas.

“É uma discussão equivocada e chama a atenção pela ausência de contraponto. Falhou-se em estabelecer um debate em uma questão tão fundamental, onde era necessário ouvir as instituições que trabalham com as vítimas”, afirma.

A falta de representatividade na Assembleia, com apenas duas deputadas diante de 41 cadeiras nesta legislatura, também contribui para falhas no debate e desenvolvimento da matéria, segundo a ex-vereadora. “Quando não há diversidade, isso acontece. Precisamos ter todos os setores da sociedade bem representados, para que  a discussão seja ampla e as perspectivas, corretas e reais”, pontua.

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