Hoje uma família está chorando na sala ali ao lado

"Quando decidi ser médico, não imaginava que encontraria tantas vezes com a morte"

José Fernandes José Fernandes -
(Foto: Ilustração/ Reprodução)

Se tem uma coisa que não desejo a ninguém, é que me encontrem na sexta-feira. Por quê? É o dia em que trabalho no IML, há 12 anos, e faço exame cadavérico em todas as mortes violentas da cidade.

A violência não significa necessariamente uma pessoa contra a outra. Acidentes de trânsito, complicações pós-operatórias supostamente com erros médicos, vítimas de acidente de trabalho e outros.

Há poucos minutos fiz a necropsia de uma pessoa que estava no trabalho e infelizmente sofreu uma descarga elétrica. Um raio fatal o atingiu e o ponto de entrada foi na cabeça. De imediato ele caiu do telhado da casa onde estava trabalhando e veio a óbito.

E daí? Quero chamar a atenção ao fato de que o boné era o seu único EPI (Equipamento de Proteção Individual) que estava usando.

Não estou apontando responsáveis e nem fazendo pré-julgamento, mas é comum observarmos a negligência de empregadores e trabalhadores, principalmente na construção civil.

Quando decidi ser médico, não imaginava que me encontraria tantas vezes com a morte. Nesse tempo, aprendi que ela chega através das brechas da omissão. Nesse caso específico, enxergo que o Poder Público também é responsável, ao não fiscalizar a execução das leis trabalhistas que existem e visam proteger todos os envolvidos.

Hoje uma família está chorando ali na sala ao lado. Na próxima sexta-feira espero não te encontrar.

É isso.

José Fernandes é médico (ortopedista e legista) e bacharel em direito. Atualmente vereador em Anápolis pelo MDB. Escreve todas às sextas-feiras. Siga-o no Instagram.

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