Ansiedade, revolta e traumas: as sequelas psicológicas das vítimas que se feriram no Festival Rap Mix

Portal 6 conversou com pessoas feridas no evento, que apontaram viver com medo e dificuldades no cotidiano

Augusto Araújo Augusto Araújo -
Imagem mostra rampa que desabou durante Festival Rap Mix, em Goiânia. (Foto: Divulgação / PCGO)

Além dos ferimentos físicos, o desabamento da estrutura de uma rampa durante o Festival Rap Mix, no dia 09 de julho, deixou sequelas emocionais e psicológicas nas vítimas do incidente.

Portal 6 conversou com algumas pessoas que se machucaram durante o evento, apontando que tiveram a vida completamente alterada após aquele dia.

Um deles foi Pedro Marcondes, de 20 anos. O estudante de Relações Públicas da Universidade Federal de Goiás (UFG) apontou que vem sofrendo muito com a ansiedade desde então.

Pedro Marcondes, estudante de Relações Públicas que se feriu durante o Rap Mix. (Foto: Reprodução / Instagram)

“Nos primeiros dias, eu tinha dificuldade de dormir. Quando eu fechava os olhos, parecia que a imagem ficava passando em looping na minha cabeça, em que eu estava caindo, chegando no chão”.

O universitário afirmou que, ao perceber que estava caindo, chegou a pensar que aqueles milésimos de segundo poderiam ser os últimos momentos da vida dele.

Pedro destacou que está recebendo auxílio psicológico, com um profissional contratado pela organização do evento, o que vem ajudando nesse processo até voltar à normalidade.

No entanto, o estudante apontou que desenvolveu algumas fobias após o incidente.

Isso porque ele é participante de um projeto de extensão da UFG que faz coberturas esportivas para a Rádio Universitária.

Só que o jovem indicou que teve dificuldades ao retornar aos estádios para a disciplina. “Ver o movimento de muitas pessoas ali me deu uma crise de ansiedade muito grande”.

Já para Letycia Oliveira, autônoma de 23 anos, o principal sentimento é de revolta com todo o ocorrido, ainda mais após a perícia da Polícia Civil (PC) apontar que houve uma montagem inadequada da estrutura da rampa que desabou.

Na manhã desta quinta-feira (27), a jovem postou um vídeo nas redes sociais, após ter conhecimento das falhas cometidas pela organização do evento.

“Saber que a gente está nessa situação por irresponsabilidade de outras pessoas é muito difícil. A gente tenta pensar positivo, que Deus tem um propósito, mas quando a gente vê essas coisas é revoltante”.

 

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Uma publicação compartilhada por Letycia Oliveira (@letycia_0)

Em entrevista ao Portal 6, ela afirmou estar extremamente abalada e não conseguir mais assistir filmes mais gráficos sem se lembrar do acidente e ter uma crise de ansiedade.

“Eu não consegui nem olhar as fotos e vídeos que gravei do evento. Eu sonho com o acidente. Escuto os gritos. E eu sinto uma raiva, uma revolta constante de saber que eles não estão nem aí pra gente”.

Durante o ocorrido, Letycia teve uma grave lesão na coluna e precisou fazer uma cirurgia de implantação de pinos para conseguir manter o torso erguido.

Além disso, ela ainda preciso de auxílio de um andador e cadeira de rodas para poder se locomover dentro de casa ou em consultas no médico.

No entanto, a jovem revela: “Levantar da cama dá medo, porque fico com medo constante de cair. Ir no banheiro é difícil, porque eu vou sentar no vaso e me dá um medo absurdo de cair. Eu fico segurando na minha irmã ou mãe e pedindo, pelo amor de Deus, para não soltar”.

Por fim, a trabalhadora autônoma afirma que sair de casa já é uma luta, visto que, infelizmente, precisa passar por uma rampa para se deslocar.

Tratamento

A reportagem também entrou em contato com profissionais da saúde mental, para entender melhor como lidar com essa situação de trauma.

Caroline Costa, psicoterapeuta especialista em Psicologia da Saúde, apontou que esse tipo de reação é normal entre pessoas que passaram por situações de perigo eminente.

“[A vítima] fica mais suscetível a desenvolver medos, crises de ansiedade, pânico, por estar se sentindo ameaçada a todo momento, o que pode vir a desencadear um transtorno de estresse pós-traumático”, detalhou.

Dessa forma, uma forma de enfrentar esse trauma seria através da busca por uma rede de apoio, fazer um grupo de pessoas que estavam presentes no incidente e que possam compartilhar as experiências, além de amparar um ao outro.

“Ter apoio familiar, nesse momento, também é muito importante, para dar um auxílio, seja psicológico ou emocional”, concluiu.

Já Mauro Elias Mendonça, professor de psiquiatria e psicologia da Universidade Federal de Goiás (UFG), apontou que é também necessário o organismo das pessoas acidentadas “descarregar” esse stress acumulado.

“A reação natural, em situações como estas, é tentar acalmar o corpo de forma artificial, até mesmo com uso de calmantes. No entanto, isso vai bloquear os recursos naturais do corpo e, como a pessoa ainda está “carregada”, ela vai ficar revivendo aquele momento traumático, o que atrapalha o sono, atenção, relaxamento. Ela fica em vigilância como se o perigo ainda estivesse acontecendo”, detalhou.

Sendo assim, procurar psicoterapias que ajudem a liberar essas sensações acumuladas seria o ideal. Atividades físicas ou que estimulam a criatividade – como pintar ou escrever – podem servir como fontes de auxílio.

Por fim, Mauro Elias apontou que o uso de medicamentos seria apenas em última instância, com um uso adequado para o paciente, de modo que não “arraste” o processo de superação do trauma vivenciado.

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