DOUGLAS GAVRAS
MONTEVIDÉU, URUGUAI (FOLHAPRESS) – Antes de se tornar presidente (2010-2015) e uma referência da esquerda internacional, José Pepe Mujica fez parte de uma peça fundamental para entender a história recente do Uruguai: o Movimento de Libertação Nacional-Tupamaros.
O grupo do qual participou o ex-mandatário, morto na última terça-feira (13), começou como um coletivo que buscava aglutinar diferentes correntes de esquerda no país. Assim como em outras iniciativas semelhantes pela América Latina, tinham como referência os líderes da Revolução Cubana.
Ao contrário do exemplo do revolucionário Che Guevara, porém, os Tupamaros não seguiam o formato da guerrilha rural. Operavam em espaços urbanos, conforme conta o estudo “Los Tupamaros, la Guerrilla Robin Hood”, do historiador uruguaio Carlos Demasi . “Mas o que sem dúvida mais impressionou foi seu estilo de ação, que na época era chamado de ‘Robin Hood’: algumas de suas ações envolviam uma redistribuição de riqueza por meio de ações, tirando bens dos ricos para dá-los aos pobres.”
O historiador dá dois exemplos de assaltos praticados pelo grupo que se tornaram famosos na época. “O assalto ao Cassino San Rafael ou o assalto a uma instituição financeira semiclandestina ligada a algumas figuras do governo, operações marcadas por toques de ‘fair play’ que reforçaram a imagem da organização como justiceira”, afirma o autor.
O nome escolhido por eles vem de um apelido que os espanhóis deram para a população próxima ao rio da Prata que era a favor da independência. E a palavra, por sua vez, teve origem no levante anticolonial liderado pelo indígena peruano Túpac Amaru 2º, ocorrido em 1780 e que foi duramente reprimido.
Segundo o livro “Historia de los Tupamaros”, escrito pelo dirigente Eleuterio Fernández Huidobro, a primeira vez em que o nome Tupamaros aparece registrado em um documento foi em novembro de 1964, em um panfleto distribuído a estudantes universitários. O grupo não formava um partido político.
Os Tupamaros visavam um governo revolucionário com dois objetivos fundamentais: fazer a reforma agrária e realizar uma “nova libertação nacional”. Mesmo depois que as forças policiais praticamente desmantelaram o grupo em 1966, eles se mantiveram na luta armada até 1972, quando nove militantes, incluindo Mujica, foram presos. Em 1985, com o fim da ditadura uruguaia, os prisioneiros foram libertados. A facção, assim como outros movimentos revolucionários da região, iniciou uma nova fase democrática.
A partir desse momento, o grupo passa a fazer parte tanto da coalizão Frente Ampla quanto das diferentes composições que se formaram dentro dela, como o MPP (Movimento de Participação Popular – Espaço 609), fundado em 1989 por ex-guerrilheiros, entre eles o próprio Mujica e sua viúva, a ex-vice-presidente e ex-senadora Lucía Topolansky.
Em 2004, a Frente Ampla chega ao poder no Uruguai, marcando o fim do revezamento entre o Partido Colorado e o Partido Nacional, com a eleição de Tabaré Vázquez. Em 2009, com a vitória de Mujica, os Tupamaros completam o processo de transição para a política institucional.
Ainda em 1989, o atual presidente Yamandú Orsi, 57, começou a militar no MPP, que atualmente tem 35 deputados nacionais e nove senadores.