Do céu ao inferno: Abadiânia vê turismo e mercado imobiliário em queda quatro anos após prisão de João de Deus

Médium João de Deus foi condenado por estuprar centenas de mulheres e afugentou movimento no município, que era procurado por viajantes de vários países

Emilly Viana Emilly Viana -
Casa de Dom Inácio de Loyola, onde o médium João de Deus realizava atendimentos e cirurgias espirituais. (Foto: Marcelo Camargo / Agência Brasil)

A fama do médium João Teixeira de Faria, conhecido como João de Deus, correu o mundo e atraiu atenção, público e investimento para Abadiânia nos anos de ouro da Casa de Dom Inácio de Loyola. Hoje, a cidade sente o efeito contrário: após o religioso ser condenado a pelo menos 200 anos de prisão por crimes sexuais contra mais de 300 mulheres, parte do comércio fechou as portas e até a população diminuiu.

Dados da Junta Comercial do Estado de Goiás (Juceg) apontam que o número de pousadas e hotéis na cidade caiu pela metade na comparação entre 2018, quando o religioso ainda liderava o templo, e o ano passado, quatro anos após a prisão dele. No primeiro cenário, 41 estabelecimentos hospedavam os fiéis no município, que viu este número reduzir para 21 em 2022.

O efeito ‘João de Deus’ recaiu tão intensamente sobre a cidade que pode ser visto a olho nu na Avenida Frontal, uma das principais da cidade e que leva ao centro religioso do médium. Antes permeada por lojas que exibiam uma gama de roupas brancas – cor de vestimenta usadas nas sessões da Casa de Dom Inácio -, agora a rua vê um dos principais segmentos que sustentavam a economia local reduzir pouco a pouco: 20 de 108 lojas e confecções encerraram as atividades, segundo a Juceg.

Uma diminuição mais tímida também é registrada no setor de restaurantes e lanchonetes de Abadiânia. O número de empresas saiu de 54 para 46 no período em que João de Deus deixou a cidade e passou a se revezar entre a residência que possui em Anápolis, onde chegou a cumpriu parte da pena em prisão domiciliar devido a problemas de saúde, e o Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia.

Diante do baque na economia, alguns moradores não tiveram outra alternativa se não mudar-se para outros municípios. O movimento foi sentido no número de habitantes, que apenas no último ano reduziu de 20.873 para 15.498.

É o caso do recepcionista Gabriel Rocha, natural da cidade. Ele deixou Abadiânia por alguns anos após a pousada que administra na região ficam “parada” por quatro meses. “O lugar estava lotado quando a primeira reportagem sobre o caso passou na televisão. Aqueles foram meus últimos clientes durante um longo período, e me vi obrigado a mudar para Goianésia”, conta.

Dois anos depois, Gabriel retornou à Abadiânia. Porém, atualmente a maior parte da renda vem do emprego na cidade de Anápolis, onde também passa alguns dias da semana. A pousada dele está de pé ainda hoje, mas recebe hóspedes ocasionais. “Uns são motoqueiros ou caminhoneiros viajantes, outros pessoas que foram curadas ou atendidas na ‘Casa Dom’ que retornam agradecidas”, revela.

Desvalorização

O mercado imobiliário é outro a sofrer com a polêmica envolvendo o líder religioso. Um corretor ouvido pela reportagem detalha que imóveis do “lado de lá”, como ficou conhecida a parte do município que é cortada pela rodovia BR-060 e onde está localizada o famoso espaço espiritual, tiveram queda de até 60% no preço.

Alguns deles, inclusive, são mansões que chegaram a custar mais de R$ 5 milhões antes da prisão de João de Deus. “Hoje melhorou um pouco do que no primeiro ano, mas ainda existe uma dificuldade que a gente ouve falar que ocorre até no aluguel”, afirma.

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