Em vitória para Trump, Suprema Corte decide que presidentes têm imunidade parcial
No entendimento da Suprema Corte, presidentes têm imunidade absoluta em relação a atos oficiais do cargo
FERNANDA PERRIN
Em uma vitória para Donald Trump, a Suprema Corte dos EUA reconheceu, em decisão divulgada nesta segunda-feira (1º), que presidentes americanos possuem algum grau de imunidade contra persecução penal por crimes cometidos no cargo. A decisão foi apoiada por 6 juízes e rejeitada por 3.
Chamada de tese de imunidade presidencial, o argumento foi apresentado pela defesa do republicano para desmontar os processos criminais que o acusam de tentar reverter a derrota na eleição de 2020, quando ainda estava na Casa Branca. No entendimento da Suprema Corte, presidentes têm imunidade absoluta em relação a atos oficiais do cargo, entendidos como aqueles atribuídos pela Constituição, mas não em relação a atos não oficiais.
A decisão afeta sobretudo o processo do 6 de Janeiro. Agora, as acusações feitas pelo conselheiro especial Jack Smith, do Departamento de Justiça, podem ser questionadas pela defesa do republicano sob o argumento de que diriam respeito a atos oficiais.
Cabe à juíza Tanya Chutkan, que supervisiona o processo na primeira instância do circuito federal em Washington, definir quais atos de Trump são de caráter privado e quais são oficiais. Das quatro acusações feitas por Smith, três tratam de conspiração e uma de obstrução de um procedimento oficial.
Está nessa zona cinzenta, por exemplo, conversas mantidas entre Trump e o então vice-presidente, Mike Pence, em torno da confirmação da vitória de Joe Biden pelo Congresso -o empresário pressionou Pence para rejeitar o procedimento. Discussões semelhantes entre o republicano e autoridades estaduais, para que revissem a vitória democrata em suas regiões, também estão nessa categoria.
Com isso, as chances de o julgamento começar antes da eleição, em novembro, são praticamente nulas. O resultado era o esperado pela defesa do ex-presidente, que apostou na estratégia de protelar o máximo o possível o andamento dos processos contra ele na expectativa de que uma vitória do republicano na eleição torne inviável sua continuidade.
“O presidente não goza de imunidade para seus atos não oficiais, e nem tudo o que o presidente faz é oficial. O presidente não está acima da lei. No entanto, o Congresso não pode criminalizar a conduta do Presidente no exercício das responsabilidades do Poder Executivo sob a Constituição”, escreveu o juiz John Roberts, presidente da Suprema Corte.
Ao mesmo tempo, ele completou que um presidente “não pode ser processado por exercer seus poderes constitucionais centrais, e ele tem direito, no mínimo, a uma imunidade presumida contra processos por todos os seus atos oficiais. Essa imunidade se aplica igualmente a todos os ocupantes do Salão Oval, independentemente de política, política pública ou partido”.
Trump, como esperado, comemorou a decisão. “Grande vitória para a nossa Constituição e democracia! Orgulhoso de ser americano!”, escreveu em sua rede social, Truth.
Democratas, por sua vez, criticaram duramente a Suprema Corte em uma chamada com jornalistas nesta segunda. “Esta decisão dará a Donald Trump cobertura para fazer exatamente o que ele vem dizendo que quer fazer há meses, que é executar vingança e retaliação contra seus inimigos políticos”, disse Quentin Fulks, gerente-adjunto da campanha de Biden.
“Se for um ato oficial ordenar ao Departamento de Segurança Interna para reunir latinos em campos de detenção e deportá-los sem motivo, ele estaria imune a isso. Se for um ato oficial fazer com que seu vice-presidente anule os resultados justos e livres de uma eleição, ele está imune a isso”, elencou.
A opinião da Suprema Corte, no entanto, não foi tão longe quanto o entendimento da defesa de Trump de que o presidente gozaria de uma imunidade absoluta em relação a todos as ações tomadas no cargo, chegando à situação extrema de blindar um presidente mesmo que ele matasse alguém. Mas ela deixou, de fato, em aberto a definição do que se enquadra em cada categoria.
A decisão da Suprema Corte ensejou uma nova enxurrada de críticas do partido de Biden aos juízes, acusando a instância máxima da Justiça americana de ser partidarizada. A maioria dos juízes que compõe o colegiado atualmente é conservadora. Dos 9 integrantes, apenas 3 são considerados liberais. Trump foi responsável pela indicação de três nomes durante sua Presidência: Neil Gorsuch, Brett Kavanaugh e Amy Barrett.
O argumento majoritário dos juízes é que, na ausência de qualquer imunidade, um presidente poderia deixar de cumprir seu trabalho como deve por temer ser processado após deixar o cargo ou perseguido por adversários.
“Um presidente inclinado a tomar um curso de ação baseado no interesse público pode, em vez disso, optar por outro, receoso de que penalidades criminais possam recair sobre ele após sua saída do cargo”, escreveu Roberts.
Dos quatro processos contra Trump, o do 6 de Janeiro é visto como o mais grave, por tratar, no limite, de uma tentativa de usurpação do poder nacional. A esperança de opositores do ex-presidente era a de que este julgamento começasse o quanto antes, a ponto de as evidências apresentadas pela Procuradoria afetarem a opinião do eleitorado.
Pesquisas de intenção de voto mostram há meses uma disputa acirrada de Trump e Biden nos números gerais, com o republicano aparecendo à frente, mas na maioria dentro da margem de erro.
Nas demais ações pendentes, Trump é acusado de interferência eleitoral em um estado (Geórgia) e posse ilegal de documentos confidenciais. Nenhum desses julgamentos tem data prevista para começar, pois estão travados em razão de recursos apresentados pela defesa.
No único julgamento em um processo criminal ocorrido até agora, Trump foi condenado por fraudar registros empresariais com o objetivo de encobrir pagamentos feitos à atriz pornô Stormy Daniels na campanha de 2016. A sentença deve ser divulgada pelo juiz no dia 11 de julho.