Rússia usa 236 mísseis e drones no maior ataque da Guerra da Ucrânia
Segundo a Força Aérea de Kiev, foram abatidos 102 de 127 mísseis, além de 99 de 109 drones
IGOR GIELOW
A Rússia de Vladimir Putin lançou na madrugada e na manhã desta segunda-feira (26) o maior ataque aéreo contra a Ucrânia desde que lançou a invasão do país vizinho, em 24 de fevereiro de 2022. Foram empregados, segundo Kiev, 236 mísseis e drones contra alvos em 15 regiões.
A conta é do presidente Volodimir Zelenski, que gravou uma mensagem de vídeo. Segundo a Força Aérea de Kiev, foram abatidos 102 de 127 mísseis, além de 99 de 109 drones. Não há como confirmar isso de forma independente.
Antes, o recorde de emprego dessas armas pelos russos de uma só vez havia sido em dezembro passado, com 158 mísseis e drones. A ação envolveu 11 bombardeiros estratégicos Tu-95MS, ao menos um caça MiG-31K, além de lançamentos de terra e do mar Negro.
Foi usada quase toda a gama que Moscou tem despejado sobre a Ucrânia, uma média de 26 ataques diários desde o começo da guerra segundo Kiev divulgou na semana passada.
O ataque foi concentrado em mísseis de cruzeiro Kalibr, Kh-59, Kh-101 e Kh-22, além de um balístico Iskander-M e um hipersônico Kinjal. Também foram empregados drones suicidas derivados do iraniano Shahed-136.
Do ponto de vista tático, houve um misto de ações segundo analistas militares russos: drones desarmados voaram em enxames inicialmente, atraindo a defesa aérea. Esgotada a primeira onda, vieram drones armados e, depois, mísseis.
O ataque vinha sendo esperado desde o sábado (24), quando a Ucrânia comemorou sua independência da União Soviética, em 1991. Putin costuma ordenar ataques com impacto político. A data virou uma espécie de símbolo da resistência contra a invasão russa.
Moradores que iam para o trabalho na hora do rush correram para as profundas estações de metrô da era soviética da capital. Houve falta de energia e de água em vários bairros da cidade, situação que se multiplicou por todo o país.
Em Sumi, de onde foi lançada a surpreendente invasão ucraniana da região meridional russa de Kursk há três semanas, quase toda a província ficou sem luz. Até aqui, as baixas humanas parecem ter sido relativamente reduzidas: foram ao menos sete mortos em quatro regiões.
Como ocorreu em outras ocasiões, o ataque acendeu o alerta nos países vizinhos. Na Polônia, um dos mais belicosos membros da aliança militar ocidental Otan, caças foram ao ar durante a ação e as Forças Armadas locais disseram que ao menos um drone caiu por acidente em seu território. Não há relato de danos.
O Ministério da Defesa russo confirmou alguns detalhes da ação, afirmando ter empregado armas de precisão contra ao menos três centrais de compressão de gás e subestações elétricas.
Também foram atacados depósitos de armas e campos de aviação no oeste do país, próximo da fronteira polonesa, onde Kiev esconde seus ativos mais importantes, como mísseis de cruzeiro Storm Shadow e os novos caças F-16.
Os aviões foram citados por Zelenski, em uma fala noturna, como uma das opções para o revide contra Moscou. Até aqui, chegaram talvez dez modelos vindos da Bélgica e da Holanda, que autorizaram seu uso contra solo russo, mas os americanos que fornecem seus mísseis e bombas não o permitem.
O Kremlin não relacionou o bombardeio à crise em Kursk. Sobre ela, o porta-voz Dmitri Peskov apenas disse que a resposta de Moscou ainda virá.
A ofensiva de Kiev em Kursk desacelerou após conquistar cerca de 80 vilarejos, humilhando as forças de Putin. Zelenski já deu diversas explicações sobre seus objetivos: forçar os russos a negociar, criar um “banco de troca” de prisioneiros, estabelecer uma zona-tampão e proteger a região de Sumi.
A ideia de iniciar conversas que já vinham sendo planejadas nas últimas semanas com uma peça de barganha a mais na mão, se estava na cabeça de Zelenski, não parece ter funcionado: o Kremlin já disse que negociações são impossíveis com a operação em Kursk.
Para complicar, Kiev apostou alto e empregou tropas experientes no ataque, expondo ainda mais o flanco de suas defesa no leste do país.
Resultado, Moscou avançou e ameaça tomar uma cidade que, caindo, poderá abrir a porta para o colapso ucraniano no que sobrou da região de Donetsk sob seu comando.
Nada disso ocorre do dia para a noite, mas o ataque desta segunda também serviu de lembrete a Zelenski acerca das capacidades do rival, mesmo pressionado pontualmente no sul.
O presidente aproveitou seu pronunciamento para pedir novamente mais defesa aérea aos parceiros ocidentais e a permissão para atacar com suas armas de longa distância dentro do território russo.
Na véspera, ele também havia alertado para o risco de mais um foco de crise na região, na Belarus. A ditadura vizinha, que não participa da guerra diretamente mas permite o uso de seu território e espaço aéreo pela aliada Rússia, posicionou forças na fronteira perto da região de Sumi.
O ditador Aleksandr Lukachenko diz ser apenas uma manobra defensiva, temendo um ataque de Kiev, mas a tensão do dois lados aumenta o risco de um espraiamento do conflito. Os belarussos já vivem à turras com Polônia e Lituânia, membros da Otan, e tiveram armas nucleares táticas instaladas em seu território no ano passado por Putin.
Nos Estados Unidos, o porta-voz do Conselho de Segurança Nacional, John Kirby, comentou o taque russo. “Condenamos nos termos mais enérgicos possíveis a contínua guerra da Rússia contra a Ucrânia e seus esforços para mergulhar o povo ucraniano na escuridão à medida que a queda se aproxima”, disse.