‘Prazer, eu sou o Wilsinho’, o marqueteiro que derrotou o PT em Anápolis
O início de novembro de 2015 era angustiante para todos os frequentadores da Praça dos Três Poderes, em Brasília. Duas personagens, Dilma Rousseff e Eduardo Cunha, eram diariamente metralhados pela imprensa. A ex-presidente via o segundo mandato paralisado e não conseguia aprovar nada no Congresso. O ex-deputado do PMDB já havia deixado no cofre da Câmara a autorização para a abertura do processo de impeachment. Era o prenúncio do fim da era petista na Presidência da República.
“Mas não aqui em Anápolis. Aqui o PT está em sua melhor fase”, gabava-se um cardeal do partido em Goiás e auxiliar importante da administração de João Gomes, o vice que virou prefeito assim que o popular Antônio Gomide deixou a Prefeitura de Anápolis para se arriscar e perder a disputa ao Governo de Goiás em 2014. “O Gomide saiu, mas a administração continua funcionando como se fosse ele aqui”, emendava de maneira taxativa.
Passado um ano, muita coisa aconteceu. Dilma e Eduardo Cunha caíram, o Brasil e a Câmara dos Deputados tem novos presidentes. E Anápolis um novo prefeito, eleito no último dia 30 de outubro após um disputa ferrenha em que o PT, de mãos dadas com o PMDB, de tudo fez para se manter poder local.
“Não fossem os problemas com o PT eu ganharia com folga”, lamentou João Gomes ao Estadão horas depois do resultado ser divulgado.
“Ganhamos não apenas do prefeito João Gomes, mas também de Antônio Gomide e toda a máquina do PT”, lembrou Roberto Naves, o ‘Roberto do Órion’, a novidade da eleição.
EU SOU ROBERTO, EU SOU O NOVO
25 de agosto. Uma frase arrematava o primeiro programa eleitoral de TV do empresário e professor Roberto Naves, candidato do PTB e de mais nove legendas à Prefeitura de Anápolis: “Muito prazer, eu sou Roberto, eu sou o novo”.
No QG de todos os outros concorrentes, que viam Roberto de cima das pesquisas, a troça era geral. Menos de 1% o petebista tinha naquele mesmo dia nas intenções de voto do Serpes/O Popular. As equipes de marketing dos concorrentes achavam ridículo dizer aquilo, mas a população gostou. Na pesquisa seguinte do mesmo instituto, Roberto saltava para 6%. A reação dos adversários era de pragmatismo. “O conceito pegou”, reconheciam.
Daí em diante, as intenções de voto de Roberto ‘do Órion’ aumentavam proeminentemente. Passaram a crescer também os ataques, que viam de todos os lados. O resultado do primeiro turno, porém, foi uma surpresa para todos. João Gomes, que nutria a expectativa de vencer ainda naquela volta, teve menos de 30% e ficou apenas oito pontos na frente do “novo”. Era menos que a avaliação de seu próprio governo, estimada dois dias antes em mais de 40%.
No segundo turno, todos os adversários correram para o lado de Roberto – e o PT para o ataque. As pesquisas mostravam o candidato do PTB com vantagem de até 15 pontos. Começava um movimento petista de desconstrução da imagem de Roberto, que rememorava o bombardeio sofrido por Marina Silva em 2014. No abrir das urnas a ampla vantagem foi reduzida para menos de três pontos.
Embora a artilharia petista de todo não tenha sido inócua, o resultado do processo eleitoral na cidade foi sintomático. Anápolis também não queria mais o PT. 30 de outubro.
PRAZER, EU SOU O WILSINHO
“Por trás de um candidato sempre há alguém que desenha uma estratégia, prepara os discursos, orienta a propaganda. Ninguém ganha eleição sem isso”, diz Jaime Durán Barba, um senhor de mais de 60 anos e arquiteto da vitória de Maurício Macri para presidente da Argentina, em 2015. No caso de Roberto Naves, esteve um homem de 40 anos, pai de três filhos e com um currículo nada modesto. Wilson Rodrigues, o ‘Wilsinho’, já comandou campanhas de senador, governador de estado e prefeito de capital Brasil afora. Venceu a maioria delas. O dono do Colégio Órion ele conheceu antes da pré-campanha e acertou com ele uma parceria de sucesso, que só terminou com a entrevista coletiva no dia da vitória.
Wilsinho é avesso à entrevistas, mas topou falar com o Portal 6. “Eu prefiro o bastidor”, confessa.
Dos 20 anos em que participa de campanhas políticas (dez deles como consultor e estrategista), Wilsinho acha arriscado fazer prognósticos sobre o cenário nacional, mas acredita que Geraldo Alckmin e Ciro Gomes protagonizarão a disputa pela Presidência em 2018. “Quem se prepara leva vantagem. Agora, ainda existe muita água para passar debaixo dessa ponte”, sentencia.
Por que o PT perdeu a eleição?
Porque o eleitor decidiu que era hora de mudança. Porque o Roberto apresentou uma proposta mais realista e moderna para a população. Porque o anapolino considerou que a alternância de poder é uma coisa benéfica para a população. É possível encontrar uma série de justificativas que se complementam.
Surpresa no primeiro turno
Avançar ao segundo turno foi uma coisa que, de certa forma, surpreendeu a todos nós. Porque sabíamos da qualidade do candidato, conhecíamos as propostas, tínhamos um grande número de candidatos a vereador engajados na eleição, mas quando alguém que nunca disputou uma eleição consegue vencer políticos respeitados e tradicionais é sempre uma boa surpresa.
Pé no chão
Concretamente ninguém sabe no início o que pode acontecer numa eleição. Porque os fatores que influem no resultado dependem de múltiplas possibilidades que nem sempre estão sob o seu controle. Então, você faz o planejamento para que isso aconteça, procura aproveitar as melhores oportunidades, se prepara para a vitória. Mas ninguém pode garantir a vitória numa eleição. O marqueteiro que faz isso ou é muito confiante ou é desinformado.
João Gomes
Foi um bom candidato. Tanto que brigou pela vitória até o final.
Roberto Naves
Ele tem todas as características de um ótimo gestor: moderno, ficha limpa, competente, bom de planejamento e execução além de sensível com as questões sociais. Tem tudo para ser o melhor prefeito da história da cidade. Agora é com ele. Vou torcer para o meu amigo. Meu trabalho termina após a apuração dos votos e a coletiva de imprensa.
Nova liderança em Goiás?
Anápolis é uma cidade importantíssima para a política no estado e de relevância para a economia nacional. A vitória do Roberto mostrou que a população da cidade quer mudanças.
Criatividade e estratégia
Todas as pesquisas diziam que o Roberto era um ótimo candidato, tinha as melhores propostas, mas não era conhecido pela população. Aí entra aquela questão da criatividade a serviço da estratégia. E ser criativo não é inventar planos mirabolantes, é fazer o que precisa ser feito de modo claro e direto. As pessoas precisavam conhecer o Roberto e ninguém melhor que ele para se apresentar, quebrar o gelo com o eleitor.
Pegou fácil porque é verdade. Porque as pessoas sentiram a confiança e a vontade nele de fazer a mudança. Então as pessoas também passaram a ser o Roberto.
Voz de “robô”
O Roberto nunca foi candidato. Mas construiu a sua vida como professor de cursinho. Um professor que dá aulas para 100, 200 alunos por turma, se não emposta a voz não consegue ser ouvido. Então aquele é o Roberto. Não poderíamos mudar isso. Mas também foi uma coisa positiva porque reforçou que ele não é um político tradicional, não tinha os mesmos cacoetes dos outros.
Vitória apertada
A vitória da oposição contra uma candidatura de reeleição é um ponto fora da curva. Então, sinceramente nunca trabalhamos com a possibilidade de uma vitória folgada. Agora, se a proposta da campanha era de mostrar que Anápolis tinha um candidato diferente, não fazia sentido trabalhar com uma campanha igual, com ataques pesados e mentirosos, como fizeram contra nós. A diferença era mostrar propostas, porque no final era isso que as pessoas queriam ver. Isso é o que muda a vida das pessoas. Mas, justiça seja feita, esse direcionamento partiu do candidato. No momento de maior tensão foi ele quem determinou que não faríamos qualquer tipo de ataque.