Ressa e Muratov recebem Nobel da Paz e destacam defesa do jornalismo
Levantamento mostrou que 293 profissionais da área estão presos ao redor do mundo, enquanto 24 foram assassinados neste ano
GUARULHOS, SP (FOLHAPRESS) – Os jornalistas Maria Ressa e Dmitri Muratov, ganhadores do Nobel da Paz de 2021, receberam o prêmio em Oslo, capital norueguesa, nesta sexta (10). Além de defenderem a liberdade de imprensa, tema que deu o tom da premiação, os dois aproveitaram para levantar bandeiras que defendem em seus países de origem.
Ressa, repórter filipino-americana, reiterou o apelo à reforma das plataformas de mídias sociais. A editora do site Rappler, de jornalismo investigativo, é uma das principais vozes críticas ao ambiente de desinformação e violência contra profissionais nas redes.
“Nossa maior necessidade é combater esse ódio e essa violência, essa lama tóxica que percorre nosso ecossistema de informações”, disse. “O que acontece nas redes sociais não fica nas redes sociais; violência online é também violência no mundo real”, seguiu.
Ela, que chegou a ser presa pelo governo de Rodrigo Duterte com base em uma controversa legislação, lembrou os colegas mortos ou encarcerados como tentativa de silenciar a liberdade de imprensa.
Levantamento publicado nesta quinta (9) mostrou que 293 jornalistas estão presos ao redor do mundo, um número recorde, enquanto 24 foram assassinados neste ano.
Como é perseguida com outros processos judiciais nas Filipinas, Ressa precisou de uma autorização da Justiça para que pudesse viajar a Oslo.
Já o russo Dmitri Muratov disse que autoridades russas estão promovendo ativamente uma ideia de guerra no país e que a invasão da Ucrânia se tornou uma possibilidade real.
Ele criticou o tom de violência que domina o Kremlin e disse que os políticos que evitam o derramamento de sangue têm sido vistos como fracos, enquanto aqueles que ameaçam o mundo com uma guerra são, equivocadamente, vistos como patriotas.
“Na cabeça de alguns políticos malucos, uma guerra entre a Rússia e a Ucrânia deixou de ser algo impossível”, disse, referindo-se à possibilidade da invasão russa do país vizinho, que vem sendo anunciada pela inteligência americana e ucraniana.
Muratov também afirmou que o jornalismo na Rússia passar por um “vale escuro”, com mais de uma centena de jornalistas, meios de comunicação, defensores dos direitos humanos e ONGs rotuladas como “agentes estrangeiros”, designação usada na Guerra Fria para classificar dissidentes e hoje dada a críticos do governo Putin.
“Na Rússia, isso significa ‘inimigos do povo'”, afirmou o jornalista, cofundador e editor-chefe do Novaia Gazeta (novo jornal, em russo), um dos principais jornais de oposição ao governo Putin. Ele dedicou o prêmio a todos os jornalistas investigativos e a seus colegas de trabalho que foram assassinados –entre eles está Anna Politkovskaia, morta a tiros no dia do aniversário de Putin em 2006.
O prêmio de Ressa e Muratov é o primeiro para jornalistas desde que o alemão Carl von Ossietzky o recebeu, em 1935, por revelar o programa secreto de rearmamento de seu país no pós-guerra. Como lembrou Maria Ressa, porém, o alemão não chegou a colocar as mãos no prêmio, uma vez que morreu em um campo de concentração nazista.
“Ao dar esse prêmio aos jornalistas hoje, o comitê do Nobel sinaliza um momento histórico, um ponto existencial para a democracia”, disse.