Doze anos após crime, filho localiza o suspeito de matar o pai

"Era uma luta contra um fantasma. Você sabia que ele existia, mas não fazia ideia aonde estava, como estava, e quem escondia ele", afirmou o jovem

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Elder Alves e o filho Leandro Rodrigues -Imagem/ReproduçãoDoze anos após crime, filho localiza o suspeito de matar o pai
Elder Alves e o filho Leandro Rodrigues -Imagem/Reprodução

(FOLHAPRESS) – “Não foi uma busca para desmerecer os policiais nem o Judiciário. Foi uma luta pessoal mesmo.” É assim, em tom de alívio, que o metalúrgico Leandro Rodrigues, 28, celebra a investigação que fez por conta própria, utilizando a internet, que levou à prisão do suspeito de matar seu pai. O assassinato ocorreu na cidade de Registro, no Vale do Ribeira, em São Paulo.

Era 2 de abril de 2010 quando Rodrigues, então com 16 anos, recebeu a notícia de que seu pai, o garçom Elder Alves, 38, havia sido baleado durante aquela madrugada. Ele estava em uma moto, com a ex-companheira, com quem tinha um filho de quatro anos, quando dois tiros o atingiram, relatou o metalúrgico.

No momento dos disparos, o casal seguia para a delegacia de Registro. A intenção era denunciar uma agressão física sofrida por Alves momentos antes, quando estava em uma lanchonete. O autor da violência já era conhecido do garçom: Cícero Manoel Júlio da Silva. O motivo também já era sabido: um amor não correspondido pela mulher que acompanhava Alves naquele instante.

Denunciado pelo Ministério Público pela morte, Cícero teve um mandado de prisão expedido ainda em 2010, de acordo com o Tribunal de Justiça de São Paulo. No entanto, ele só foi preso só em 16 de março deste ano, no Paraná, depois ter seus dados e localização obtidos pelo filho da vítima.

O advogado de Cícero, Valdinei da Silva Lima, ingressou com um pedido de liberdade provisória pouco tempo após a prisão, mas a solicitação foi negada. O advogado chegou a atender a reportagem por telefone, mas disse que responderia por email com seu posicionamento, o que não ocorreu.

Segundo Rodrigues, seu pai foi casado com a mulher com quem estava na hora do crime, que também foi baleada, mas sobreviveu. Após a separação, ela teve um breve romance com Cícero, mas a relação não vingou. Como o garçom a visitava todos dos dias para ver o filho, Cícero culpava Alves pelo término do namoro, o que teria sido o motivo do ataque a tiros.

Com a morte, o então adolescente disse que faria de tudo para que o assassino do pai fosse preso. “A busca começou no dia seguinte após a morte do meu pai. Eu descobri o endereço dele, onde ele morava. Todo dia quando chegava de noite, eu passava nesse bairro, passava na rua”, disse.

Rodrigues conseguiu um estágio no Fórum de Registro, onde trabalhou de 2012 a 2013, e teve acesso ao processo sobre a morte do pai. “Eu fiquei só esse período [poderia ter ficado mais tempo no estágio], porque via que não estava dando andamento o processo e isso acabava comigo, saber que trabalhava no fórum, porém não conseguia ter êxito no processo”, pontuou.

O jovem resolveu ir morar em outra cidade de São Paulo. “[Com a mudança] eu não conseguia fazer nada no sentido de ir lá nos endereços e procurar ele. Só que eu fiz uma promessa quando saí de lá: eu sairia da cidade e só voltaria depois de dez anos.” A seu ver, esse era o prazo para que Cícero se esquecesse de que estariam atrás dele e passaria e levar uma vida normal, deixando rastros.

O metalúrgico conta que, diariamente, inseria o nome completo do acusado em sites de buscas com a esperança de localizar seu paradeiro. Entretanto, a procura resultava apenas no processo relacionado à morte de seu pai. Em 20 de janeiro, por um acaso, ao digitar Cícero Manoel Júlio da Silva, ele trocou a letra “a” por “z” e escreveu Cícero Manoel Júlio “dz” Silva.

A digitação errada trouxe dados de uma empresa: uma clínica de estética, aberta em janeiro de 2021, na qual constava o nome completo de Cícero no campo razão social.

“Achei o MEI [Microempreendedor Individual] dele. Pesquisei o MEI e vi que era dele. Coloquei para fazer um Pix e saiu o nome dele certinho. No dia seguinte, eu liguei para a polícia em Aracaju [município onde a empresa estava registrada]. O policial lá confirmou que os dados eram dele. Continuei investigando.”

Com diversos dados em mãos, ele resolveu confrontar cada um deles. “Fiz um Pix pelo CNPJ e apareceu o nome dele. Aí eu fiz um Pix para o celular que ele cadastrou no MEI e deu que era o celular da mulher dele, estava o nome dela lá.”

O telefone da mulher havia sido registrado no Paraná. A partir daí, as buscas passaram a se concentrar na mulher. Foi quando ele descobriu que o casal vivia em Fazenda Rio Grande, na região metropolitana de Curitiba.

Com o endereço do casal em mãos, Rodrigues aproveitou que estava em férias e foi a Registro, com a intenção de cobrar que investigadores paulistas fossem até o Paraná. Sem resposta imediata, Rodrigues acionou as Polícias Civil e Militar do Paraná, além da GM (Guarda Municipal) de Fazenda Rio Grande. Também entrou em contato com a Polícia Federal, para caso o homem tentasse fugir de avião.

À Folha de S.Paulo, a Guarda Municipal de Fazenda Rio Grande confirmou ter recebido as informações de Rodrigues. Cícero foi localizado e abordado pelas equipes da GM no bairro Gralha Azul. No momento da prisão, ele apresentou um documento de habilitação de origem de São Paulo, com outro nome. Além disso, confundiu sua data de nascimento.

Aos policiais, ainda de acordo com o relato da GM, o homem informou não ser Silva, mas seu irmão. Os guardas notaram que a CNH apresentada constava a sigla PS em vez de SP, no campo destinado para o estado em que o documento de identidade foi emitido.

A confirmação de que o documento era falso foi realizada na delegacia, onde foi necessária a verificação das digitais do acusado. “Cícero, então, não teve mais formas de contornar a situação, confessando ser ele”, acrescentou a nota da guarda.

“Era uma luta contra um fantasma. Você sabia que ele existia, mas não fazia ideia aonde estava, como estava, e quem escondia ele”, afirmou Rodrigues.

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