Orbán mantém falas racistas e diz que discurso contra migração é ‘questão cultural’
Ele criticou no fim de semana políticos e países abertos a acolher imigrantes e "misturar populações"
A despeito da onda de críticas, o premiê autocrata da Hungria, Viktor Orbán, disse nesta quinta (28) que sua defesa sobre o país não se tornar um “povo mestiço” seria uma questão cultural, e não racial. “Queremos manter nossa civilização como é agora”, afirmou.
Defensor de uma agenda antimigração e antidemocrática, Orbán criticou no fim de semana políticos e países abertos a acolher imigrantes e “misturar populações”. A postura historicamente rendeu ao Fidesz, o partido governista, apoio entre camadas da população contrárias ao acolhimento de migrantes.
A nova formulação do discurso, no entanto, agora com o teor contra a miscigenação, rendeu críticas do Comitê Internacional de Auschwitz pela conotação racista e também levou a ministra da Inclusão Social Zsuzsa Hegedus a renunciar pouco depois.
Em sua carta de demissão, ela comparou o discurso do ultradireitista com a propaganda de Adolf Hitler na Alemanha nazista. “Não sei como você [Orbán] não percebeu que a declaração é pura retórica nazista digna de Joseph Goebbels”, escreveu Hegedus.
Falando em Viena, segundo relatos do jornal húngaro Index, Orbán disse: “Acontece que, às vezes, sou ambíguo. Esta é uma posição civilizada, estamos orgulhosos do que a Hungria conseguiu na luta contra o racismo. Não é sobre racismo, mas sobre diferenças culturais”.
O primeiro-ministro já havia tentado distanciar seu discurso do teor racista em carta que divulgou após a renúncia de Zsuzsa Hegedus, uma aliada de longa data. No texto compartilhado pelo diretor político de seu gabinete no Twitter, ele dizia: “Meu governo tem uma política de tolerância zero em relação ao anti-semitismo e ao racismo”.
A agora ex-ministra Zsuzsa Hegedus respondeu aos argumentos dizendo que não caracterizava seu governo como racista, mas que o recente discurso do premiê a preocupava. “A menor menção pública à discriminação racial incita um movimento que a história já mostrou; uma vez que deixamos o gênio sair da garrafa, nem mesmo o ‘senhor’ pode calá-lo novamente”, disse ela, segundo o site de notícias hvg.hu.
Orbán foi reeleito em abril para seu quinto mandato na Hungria, e o Fidesz, legenda que fundou, manteve maioria no Parlamento. Seu governo -ele está no quarto mandato consecutivo- foi marcado pela corrosão da democracia húngara e por rusgas com a União Europeia (UE), bloco que o país compõe.
O premiê integra, ao lado de figuras como Jair Bolsonaro (PL), o grupo de líderes mundiais que promovem uma guinada autoritária, com discursos e políticas anti-democráticas. Seu governo chegou a oferecer ajuda para a reeleição do presidente brasileiro, mostrou relatório interino obtido pela Folha.
“Sou o único político da UE que defende uma política abertamente anti-imigração”, disse Orban em entrevista coletiva conjunta com o primeiro-ministro da Áustria, Karl Nehammer.
Na noite de quarta (27), a embaixada dos EUA em Budapeste divulgou um comunicado no qual não menciona Orbán, mas diz que condena “todas as ideologias, políticas e retóricas que oxigenam doutrinas de ódio e divisão”. No início da semana, Frans Timmermans, vice-presidente da Comissão Europeia, escreveu no Twitter que o racismo não tinha lugar na Europa, cuja força viria da diversidade.
De acordo com relatos e vídeos da imprensa local, Orbán foi vaido em Viena, quando chegou para o encontro com o premiê austríaco, pelo grupo Omas gegen Rechts (vovós contra a direita), formado por mulheres, a maioria em idade de aponsentadoria, com atuação na Áustria e na Alemanha contra o neonazismo e o extremismo de direita na Europa.