Governo Bolsonaro segurou divulgação de dados de desmatamento antes da COP26

Com base em números de agosto de um ano a julho do ano seguinte, o Prodes costuma estar disponível no começo de novembro

Folhapress Folhapress -
Governo Bolsonaro segurou divulgação de dados de desmatamento antes da COP26
Presidente Jair Bolsonaro (Foto: Agência Brasil)

O Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) concluiu os dados de desmatamento da Amazônia em 27 de outubro e inseriu o relatório no sistema eletrônico de informações do governo federal no mesmo dia, segundo fontes do instituto ouvidas pela reportagem.

O documento só foi divulgado nesta quinta-feira (18). O relatório com os dados do Prodes (Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite) mostra uma devastação de 13.235 km2 entre agosto de 2020 e julho de 2021, índice mais elevado desde 2006. O número representa um aumento de 22% em relação ao período anterior.

O Inpe deixou registrado no arquivo em PDF a data da conclusão do relatório: 27 de outubro de 2021. No mesmo dia, o documento foi inserido no sistema eletrônico, o que permitiria consulta aos dados consolidados.

Quatro dias depois, teve início a COP26, em Glasgow, no Reino Unido. Na Conferência das Nações Unidas para Mudanças Climáticas, o governo Jair Bolsonaro escondeu o recorde de desmatamento da Amazônia em 15 anos.

Durante a COP26, a delegação brasileira foi criticada por ativistas climáticos por não divulgar o Prodes, considerado mais preciso que outro sistema do Inpe, o Deter. Com base em números de agosto de um ano a julho do ano seguinte, o Prodes costuma estar disponível no começo de novembro.

Os atuais dados do Prodes foram divulgados no site do Inpe sem qualquer ação de divulgação.

Na noite desta quinta, os ministros Joaquim Álvaro Pereira Leite (Meio Ambiente) e Anderson Torres (Justiça) participaram de uma coletiva para comentar os dados. Leite afirmou que os números são inaceitáveis e prometeu uma atuação “contundente” no combate a crimes ambientais.

Ele foi questionado em duas ocasiões sobre a data da elaboração dos dados pelo Inpe –27 de outubro–, mas alegou só ter tido acesso à informação nesta quinta.

“Talvez tenha sido por cautela que o Inpe tenha atrasado a divulgação desses dados, para alguma revisão, mas eu não tenho essa informação do Inpe. O que eu tenho informação é que foi divulgado hoje e nós estamos aqui deixando claro que esse número é inaceitável e nós vamos combater contundentemente o crime ambiental na Amazonia”, disse.

“Eu tive contato com o dado hoje, exatamente como vocês devem ter tido acesso”.

A explosão do desmatamento da Amazônia medida pelo Prodes contradiz afirmação feita pelo vice-presidente Hamilton Mourão. Na última reunião do Conselho Nacional da Amazônia Legal, em 24 de agosto, Mourão chegou a antecipar o que seria a evolução do dado consolidado do Prodes: uma queda de 5% do desmatamento em comparação ao ciclo anterior.

Esta não é a primeira vez que Mourão falseia a realidade em relação à atuação do governo na Amazônia.
Bolsonaro desautorizou uma intervenção militar na Amazônia que Mourão anunciou e tratou como existente durante 45 dias, conforme publicou o jornal Folha de S.Paulo no último dia 4.

O vice anunciou e tratou como existente uma segunda fase da Operação Samaúma, executada pelas Forças Armadas com base num decreto de GLO (garantia da lei e da ordem). Bolsonaro não editou um decreto para prorrogá-la, como a Folha de S.Paulo constatou.

Para prorrogar a Operação Verde Brasil 2, por exemplo, que antecedeu a Samaúma e durou quase um ano, o presidente assinou novo decreto estabelecendo a extensão do prazo.

A militarização do combate a ilícitos ambientais durou 16 dos 34 meses do governo Bolsonaro, custou R$ 550 milhões aos cofres públicos e não derrubou os índices de desmatamento da Amazônia, também conforme a Folha de S.Paulo mostrou em reportagem publicada no dia 24 de outubro.

Ao todo, foram três GLOs, cujos decretos presidenciais deram amparo legal a três operações de intervenção militar: Verde Brasil, Verde Brasil 2 e Samaúma.

Perguntado sobre a militarização do combate a crimes ambientais, o ministro da Justiça disse não acreditar ter havido um “erro estratégico” no envio de militares para atuação no bioma.

“Eu não vejo erro estratégico do governo. Com a nossa chegada a gente trouxe, conversamos em nível de governo com Casa Civil, essa responsabilidade para a Justiça e para o Ministério do Meio Ambiente, para que juntos a gente atue da maneira que a gente entende que é mais eficaz”, disse.

“É uma estratégia policial de atuação de combate ao crime. Não tem segredo, a gente vai atuar com um volume de policiais fazendo uma atividade repressiva e preventiva, com inteligência fazendo operações policiais para desmantelar o crime realmente como ele tem que ser desmantelado”.

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