Reforma Tributária propõe duas cestas básicas, uma isenta e outra com alíquota reduzida
Ideia do relator é evitar que a lei complementar a ser aprovada sobre tema
IDIANA TOMAZELLI
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O relator da Reforma Tributária no Senado, Eduardo Braga (MDB-AM), decidiu criar duas categorias de tributação da cesta básica, uma delas totalmente isenta do novo tributo e a outra com uma alíquota reduzida em relação à cobrança integral.
Segundo Braga, a alíquota zero valerá para a chamada cesta básica nacional. Já a cobrança reduzida será aplicada sobre a cesta básica estendida, que poderá incluir uma lista maior de produtos.
A ideia do relator é evitar que a lei complementar a ser aprovada sobre o tema acabe ficando muito abrangente. Ao mesmo tempo, o senador pretende assegurar a cobertura de itens considerados básicos, mas que no formato atual não são alcançados pela desoneração vigente.
O parlamentar apresentou nesta quarta-feira (25) seu parecer à PEC (proposta de emenda à Constituição) da Reforma. O texto foi aprovado no início de julho pela Câmara dos Deputados.
No Senado, a previsão é que o texto seja votado dia 7 de novembro na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) em até 9 de novembro no plenário. Como sofreu mudanças, a PEC precisará ser apreciada novamente pela Câmara.
Braga ainda incluiu uma trava para a carga tributária sobre o consumo como proporção do PIB (Produto Interno Bruto). Ela deverá ser equivalente à média da receita com tributos sobre consumo observada no período de 2012 a 2021. Caso a alíquota ultrapasse esse limite, a alíquota de referência dos tributos será reduzida.
O relator ainda acatou uma sugestão do TCU (Tribunal de Contas da União) e incluiu na PEC um dispositivo que determina a revisão periódica da trava à carga tributária e também das atividades contempladas por benefícios, isenções e alíquotas reduzidas. Segundo ele, o prazo ficou em cinco anos. “Buscamos sempre criar coerência”, disse.
Outra alteração no texto é a ampliação para R$ 60 bilhões no valor do aporte da União no FDR, Fundo de Desenvolvimento Regional a ser usado pelos estados para conceder incentivos locais dentro do novo sistema tributário.
Como mostrou a Folha, Braga já havia sinalizado essa ampliação a senadores nesta terça (24).
O montante é R$ 20 bilhões maior do que os R$ 40 bilhões iniciais propostos pelo Ministério da Fazenda. Na prática, representa um aumento de 50%.
O texto aprovado pela Câmara previa valores progressivos para o FDR, começando em R$ 8 bilhões em 2029 e subindo mais R$ 8 bilhões ao ano, até alcançar R$ 40 bilhões anuais a partir de 2033.
Pela proposta do relator no Senado, o aumento extra de R$ 20 bilhões será distribuído ao longo de 10 anos a partir de 2034.
O valor do fundo é um dos pontos mais sensíveis das negociações entre relator, governo federal e estados. Nos últimos dias, a Fazenda precisou ceder e negociar um aumento no repasse para destravar o avanço da PEC (proposta de emenda à Constituição).
Em entrevista na terça, o ministro Fernando Haddad (Fazenda) demonstrou otimismo com as chances de aceitação da proposta. “Acredito que eles [governadores] terão uma boa surpresa”, disse.
Governadores reivindicam um repasse ainda maior, de R$ 75 bilhões ao ano, mas a avaliação na Fazenda é de que um montante nessa faixa não é condizente com o compromisso de responsabilidade fiscal.
O valor do fundo é especialmente sensível para os senadores. Por representar a Casa da Federação, o Senado quer garantir um ganho aos estados nessa frente.
O FDR vai assegurar aos estados e municípios instrumentos para concessão de novos incentivos daqui para frente, dado que a unificação das alíquotas de tributos sobre consumo em um IVA (Imposto sobre Valor Agregado) dual inviabiliza o modelo atual de isenções e créditos presumidos.
Na prática, o aumento também ajuda a diminuir resistências de parlamentares do Norte e Nordeste, regiões que têm, juntas, 48 dos 81 senadores ou seja, mais da metade dos parlamentares da Casa e um número muito próximo do quórum de 49 senadores necessário para aprovar uma PEC.
A Reforma Tributária está em discussão no Congresso há mais de 30 anos. A primeira vez que se tentou unir os tributos sobre consumo em um IVA (Imposto sobre Valor Agregado) foi na elaboração da Constituição de 1988. Foi também o primeiro de uma sucessão de tentativas fracassadas de mudança no sistema.
A aprovação da PEC pode colocar o Brasil no mapa dos 174 países que já cobram um IVA. O texto prevê a fusão de PIS, Cofins e IPI (tributos federais), ICMS (estadual) e ISS (municipal) em um novo sistema será dual: uma parcela da alíquota será administrada pelo governo federal por meio da CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), e a outra, por estados e municípios pelo IBS (Imposto sobre Bens e Serviços).
Braga também cedeu à pressão encabeçada por advogados e decidiu criar uma nova faixa de alíquota reduzida. Até então, a reforma previa três alíquotas: padrão, zero e uma reduzida equivalente a 40% da cobrança cheia (ou seja, desconto de 60%).
A ideia é criar uma faixa intermediária, com um abatimento de 30% sobre a cobrança integral. A avaliação é que exigir dessas categorias o pagamento cheio poderia resultar em aumento de carga para essas categorias.
A mudança vai beneficiar profissionais como médicos, arquitetos e engenheiros, além dos próprios advogados. Essas categorias são hoje contempladas por regras mais benevolentes de cobrança e pagamento de tributos e reclamavam do risco de um forte aumento de carga após a Reforma, como mostrou a Folha.
Prestadores de serviços dessas áreas contam com um benefício tributário no recolhimento do ISS (Imposto sobre Serviços). Em vez de pagar uma alíquota de 2% a 5% sobre o serviço, os profissionais pagam um valor fixo, mesmo que atuem em sociedade (desde que pertençam à mesma classe).
O benefício vale para sociedades que estão fora do Simples Nacional, que abriga empresas com faturamento de até R$ 4,8 milhões ao ano. Ou seja, quem usufrui do incentivo tem ganhos acima disso. Muitas estão no regime de lucro presumido, que tem outras vantagens, como a alíquota de 3,65% de PIS/Cofins.
O parecer do relator também pretende colocar um ponto final na polêmica em torno do Conselho Federativo, instância que ficaria responsável pela arrecadação e distribuição do IBS.
Havia uma disputa entre estados em torno do quórum para a tomada de decisão dentro do colegiado. A depender do formato escolhido, regiões Norte e Nordeste ou Sul e Sudeste concentrariam maior poder de influência sobre as decisões.
O parecer de Braga esvazia o Conselho e o converte em um comitê gestor. A ideia é replicar o funcionamento do Comitê Gestor do Simples Nacional, que também faz a arrecadação centralizada de tributos federais, estaduais e municipais pagos por micro e pequenas empresas.