EUA farão boicote diplomático aos Jogos de Inverno de Pequim

Biden já havia anunciado a intenção em novembro, durante conversa com repórteres

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EUA farão boicote diplomático aos Jogos de Inverno de Pequim
(Foto: Pedro Ladeira/Folhapress)

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O governo de Joe Biden vai boicotar os Jogos Olímpicos de Inverno de Pequim, marcados para fevereiro de 2022, e não deve mandar nenhuma autoridade à China, confirmou a Casa Branca nesta segunda-feira (6).

Biden já havia anunciado a intenção em novembro, durante conversa com repórteres. À época, o presidente americano justificou o possível boicote como resposta às violações de direitos humanos cometidas pelo regime de Xi Jinping na China. Nesta segunda, a porta-voz da Casa Branca, Jen Psaki, afirmou que o boicote se dá “pelo genocídio em curso na República Popular da China, pelos crimes contra a humanidade em Xinjiang [região da minoria étnica dos uigures] e outras violações de direitos humanos.”

O boicote, porém, não atinge os atletas, que vão disputar normalmente as competições e terão apoio do governo, disse Psaki. “Vamos apoiá-los em 100% do tempo e ao mesmo tempo vamos torcer de casa”, afirmou. Parlamentares republicanos e democratas, bem como a presidente da Câmara dos Deputados dos Estados Unidos, Nancy Pelosi, advogaram a favor do boicote.

A última medida diplomática do tipo foi tomada por Washington em 1980 contra as Olimpíadas de Moscou, em retaliação à então União Soviética, que havia invadido o Afeganistão. Naquela ocasião, o boicote também foi esportivo, com a proibição de que os atletas competissem.

A URSS retaliou quatro anos depois, boicotando os Jogos de Los Angeles, em 1984.

Antes do anúncio oficial, enquanto o boicote ainda era especulado, Pequim afirmou que haveria reação.

Zhao Lijian, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, classificou a medida como “uma mancha no espírito da Carta Olímpica” e uma “ação sensacionalista e manipuladora” dos EUA.​ “Os EUA deveriam parar de politizar os esportes e organizar o ‘boicote diplomático’ para não afetar o diálogo e a cooperação China-EUA em áreas importantes”, disse Lijian nesta segunda.

Já confirmada a medida, o Comitê Olímpico Internacional (COI) disse respeitar o boicote diplomático e estar satisfeito que não tenha impactado a participação dos atletas americanos. “A presença de representantes governamentais e diplomáticos é uma decisão puramente política de cada governo, que o COI, em sua neutralidade política, respeita plenamente”, afirmou a entidade por meio de porta-voz.

Hu Xijin, editor do Global Times, jornal alinhado ao Partido Comunista, também reagiu. “Apenas pessoas supernarcisistas vão observar sua ausência como um boicote poderoso”, escreveu em seu perfil no Twitter.

“A maioria dos oficiais do governo dos EUA está em contato próximo com pacientes de Covid-19 segundo os padrões da China, além de [o boicote ser] exigente e pretensioso. Vocês são as pessoas que os moradores de Pequim menos desejam ver.”

O governo chinês disse que recebeu mais de 1.500 inscrições pelo Comitê Olímpico dos Estados Unidos para participação nos Jogos. Até agora, o presidente russo Vladimir Putin é o único líder de um país populoso e importante economicamente a aceitar o convite da China para comparecer aos Jogos.

A China vem sofrendo pressão mundial no meio esportivo após o caso da tenista Peng Shuai, ex-número 1 no ranking mundial de duplas, que acusou no mês passado Zhang Gaoli, ex-vice-premiê do país, de assédio sexual. A denúncia foi feita em uma rede social chinesa, mas a publicação foi excluída na sequência.

A tenista saiu dos holofotes durante quase três semanas, o que gerou especulações sobre seu paradeiro, com a Associação do Tênis Feminino (WTA, na sigla em inglês), a ONU e diversos atletas cobrando respostas de Pequim.

No último dia 21, uma conversa de 30 minutos entre Peng e o presidente do COI, Thomas Bach, colocou fim às dúvidas, mas o caso continuou repercutindo.

A WTA suspendeu torneios de tênis na China. Em comunicado, o presidente da associação afirmou não ver como poderia pedir às “atletas para competir lá, quando Peng Shuai não tem permissão para se comunicar livremente e aparentemente foi pressionada a contradizer sua alegação de agressão sexual”.

Já a Federação Internacional de Tênis (ITF, na sigla em inglês) e a entidade reguladora do tênis masculino (ATP) disseram que não irão aderir ao boicote. Neste domingo, o presidente da ITF defendeu o posicionamento da organização, dizendo não querer “castigar bilhões de pessoas”.

Especificamente no caso do boicote americano, um dos principais pontos sensíveis usados pela administração do democrata como argumento para criticar o governo chinês é a situação dos uigures, minoria muçulmana, na região de Xinjiang, oeste do país. Organizações de direitos humanos denunciam que a população local é mantida sob forte vigilância e forçada a se alinhar ao Partido Comunista Chinês.

O ex-presidente americano Donald Trump chegou a acusar o regime de Xi de cometer genocídio e crimes contra a humanidade na região, e o governo americano impôs sanções a uma poderosa empresa e a duas autoridades de Xinjiang como forma de pressionar pelo fim das violações de direitos humanos. O assunto também tem sido priorizado pelo governo Biden nas conversas bilaterais com Pequim.

Ao lado dos países-membros da União Europeia (UE), do Canadá e do Reino Unido, os EUA anunciaram, em março, novas sanções a duas das principais autoridades do regime chinês na região. A diretora do Departamento do Tesouro americano, Andrea Gacki, afirmou que autoridades chinesas seguirão “sofrendo consequências enquanto atrocidades ocorrerem”.

A ONG Human Rigths Watch também se pronunciou sobre o assunto, dizendo que esta não deve ser a única ação a ser adotada com relação aos uigures. “Os EUA deveriam agora redobrar esforços com governos aliados para investigar e mapear caminhos para responsabilizar os autores desses crimes e levar Justiça aos sobreviventes.”
Os líderes americano e chinês tiveram sua primeira reunião virtual bilateral em novembro. A conversa entre os dois durou cerca de três horas e meia, ao menos 30 minutos mais do que o esperado, e teve a agenda econômica e os direitos humanos como principais temas.

Entre outros pontos, Biden, de acordo com comunicado oficial divulgado pela Casa Branca após o encontro, citou “preocupações com as práticas da República Popular da China em Xinjiang, Tibete e Hong Kong, bem como direitos humanos de forma mais justa”.

Soma-se à lista de atritos entre Washington e Pequim o fato de Biden deixar a China fora dos países convidados para a Cúpula da Democracia, que será realizada nos EUA nos dias 9 e 10 de dezembro, da qual o Brasil faz parte.

O governo americano levou em conta contextos estratégicos ao selecionar os convidados -o Paquistão, por exemplo, é um país-chave para o combate ao terrorismo. A Índia, considerada parcialmente livre, é um parceiro na disputa geopolítica com Pequim, assim como as Filipinas.

Além da China, ficaram de fora também a Rússia e a Turquia, esta aliada dos americanos na Otan (aliança militar ocidental).

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