Federações enfrentam dissidências e criam ‘casamentos de fachada’ nos estados

Novo mecanismo deve ajudar os partidos a superar a cláusula de barreira, que estabelece percentual mínimo de votos e de deputados eleitos para manter o acesso à propaganda partidária e ao fundo eleitoral

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Urnas passaram por teste (Foto: Reprodução)

(FOLHAPRESS) – A criação de federações partidárias, que passarão a valer a partir das eleições deste ano, uniu adversários locais no mesmo campo político, começa a enfrentar dissidências e pode resultar em uma espécie de “casamento de fachada” em parte dos estados.

O prazo para o registro de federações partidárias se encerrou na última segunda-feira (30) com a criação de três federações. No campo da esquerda PT, PC do B e PV estarão amarrados pelos próximos quatro anos, assim como o PSOL e a Rede. Na centro-direita, se uniram o PSDB e Cidadania.

Nas federações partidárias, as legendas que se associam são obrigadas a atuar de forma unitária ao menos nos quatro anos seguintes às eleições, nos níveis federal, estadual e municipal, sob pena de sofrerem punições. É um modelo diferente das coligações, que foram vetadas em eleições proporcionais.

O novo mecanismo deve ajudar os partidos a superar a cláusula de barreira, que estabelece percentual mínimo de votos e de deputados eleitos para manter o acesso à propaganda partidária e ao fundo eleitoral.

Batizada com o nome “Brasil da Esperança”, a federação entre PT, PC do B e PV enfrenta imbróglios na montagem de palanques estaduais em Pernambuco, Tocantins, Mato Grosso, Maranhão e Distrito Federal.

Os principais focos de atrito se dão entre PT e PV, partido que na última legislatura se alinhou a partidos de centro-direita em estados como a Bahia, Rio de Janeiro e São Paulo.

A adesão à federação e o apoio à pré-candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2022 fez com que parte dos filiados deixasse o partido. Mas ainda há uma parcela que permaneceu no PV e ainda assim flerta com candidatos de outros partidos nos estados.

“Há um esforço muito grande para que não haja ruído na nossa caminhada até a eleição. A gente torce para que os presidentes dos partidos nos estados tentem negociar, a gente só vai intervir onde tiver problema”, afirma o presidente nacional do PV, José Luiz Penna.

Em São Paulo, por exemplo, ao menos 12 prefeitos do PV anunciaram apoio à reeleição do governador Rodrigo Garcia (PSDB) em detrimento da pré-candidatura do ex-prefeito Fernando Haddad (PT).

O comando do partido alega que são prefeitos ligados a deputados que deixaram a legenda na janela partidária e que tendem a não permanecer nas próximas eleições municipais.

O Tocantins é outro estado com potencial de conflito. O PV local, liderado pela família Lélis, é próximo ao governador Wanderlei Barbosa (Republicanos) e deve apoiar, mesmo que informalmente, a sua reeleição. O PT, por sua vez, lançou ao governo o ex-deputado Paulo Mourão.

O cenário é parecido em Mato Grosso, onde o vice-prefeito de Cuiabá José Roberto Stopa (PV) desistiu de concorrer ao governo após o PT decidir ter candidato próprio ao cargo. Stopa saiu de cena atirando.

“Eu já estava de saco cheio. Nós fizemos um acordo com a federação, que poderia aparecer dez nomes, vinte nomes e o melhor nome seria escolhido candidato. O que não pode é companheiro criticar companheiro, ficar com essa mesquinharia”, disse em entrevista à imprensa.

O imbróglio agora se voltou para a vaga para o Senado: o prefeito de Cuiabá, Emanuel Pinheiro (MDB), trabalha para emplacar sua mulher Márcia Pinheiro (PV), mas esbarra no PT, que lançou a professora Enelinda Scalla.

No Distrito Federal, PT, PV e PC do B têm candidatos próprios ao governo e terão que chegar a um denominador comum. O Palácio do Buriti é uma das prioridades do PV, que lançou o deputado distrital Leandro Grass para o cargo.

Já no Maranhão, a federação uniu sob o mesmo guarda-chuva adversários históricos no estado: o PC do B, que já abrigou o ex-governador Flávio Dino (PSB), estará unido ao PV, partido ligado à família Sarney que fez oposição ferrenha ao então governador.

“Não tenho restrição a Flávio Dino, mas é preciso diálogo. Estamos vivendo um novo momento no Maranhão sem aquela dicotomia entre Sarneys e anti-Sarneys. É um projeto uma nova geração”, diz o deputado estadual Adriano Sarney (PV).

A união, contudo, enfrenta conflitos. O PV critica a influência do PSB nos rumos da federação com a pressão pela escolha do nome do ex-secretário Felipe Camarão (PT) como candidato a vice do governador Carlos Brandão (PSB).

Em Pernambuco, a disputa é entre PT e PC do B e se dá em torno do Senado. A vice-governadora Luciana Santos (PC do B) pleiteia concorrer na chapa de Danilo Cabral (PSB), mas o PT indicou a deputada estadual Teresa Leitão. Procurada, Luciana Santos disse que a situação está em debate interno.

A federação entre PSDB e Cidadania também enfrenta divergências no campo nacional. Enquanto os tucanos ainda não definiram se terão candidatura própria ao Planalto, o Cidadania já definiu o seu apoio à pré-candidatura de Simone Tebet (MDB).

Nos estados, a decisão de unir os partidos também gerou baixas. A principal delas foi a desfiliação do governador da Paraíba João Azevêdo, que trocou o Cidadania pelo PSB e vai disputar contra o PSDB, que concorre com o deputado Pedro Cunha Lima.

Com a aprovação da federação pelo Tribunal Superior Eleitoral, os estados do Amazonas e do Distrito Federal passaram a ser centro da discórdia entre os partidos. O Cidadania apoiará candidatos tucanos em dez estados, mas esperam reciprocidade.

No Amazonas, o Cidadania passou a abrigar o ex-governador Amazonino Mendes, que lidera as pesquisas de intenção de voto para o governo. Entre os tucanos, contudo, o senador Plínio Valério também se movimenta para concorrer ao governo.

O caso do Distrito Federal é semelhante: o senador Izalci Lucas (PSDB) é pré-candidato a governador. Mas a deputada federal Paula Belmonte (Cidadania) negocia disputar o Senado em outra chapa, que seria liderada pelo senador Reguffe (União Brasil).

Nos dois casos, a disputa entre os pré-candidatos tem sido marcada por rusgas e com poucas chances de um denominador comum sem intervenção dos diretórios nacionais dos partidos.

O PSDB indicou que deve ceder no Amazonas: o presidente nacional do partido, Bruno Araújo, enviou uma carta a Plínio Valério afirmando que o partido não terá candidato próprio no estado. O senador disse que não acompanhará o partido nas eleições local e nacional.

“Vejo o Amazonino como retrocesso. E, nacionalmente, o PSDB ser coadjuvante do MDB, é coisa de quem não compreende o verdadeiro tamanho do PSDB”, afirmou o senador.

Os tucanos, contudo, não abrem mão da candidatura no Distrito Federal. Mas a deputada Paula Belmonte indica outro caminho e afirma que pode concorrer ao governo caso Reguffe decida disputar o Senado.

Também há rusgas na federação firmada entre o PSOL e a Rede Sustentabilidade, começando pela eleição nacional. Enquanto o PSOL vai unificado no apoio a Lula, a Rede liberou seus filiados a apoiar o petista ou Ciro Gomes (PDT).

Em Minas Gerais e Espírito Santo, a parceria entre os dois partidos ficará apenas no papel, em uma espécie de “casamento de fechada”.
O PSOL de Minas lançou ao governo a professora Lorene Figueiredo, mas a Rede deve dar apoio informal à candidatura de Alexandre Kalil (PSD), ex-prefeito de Belo Horizonte.
No Espírito Santo, o cenário é o contrário: a Rede vai lançar para o governo o ex-prefeito de Serra, Audifax Barcelos. O PSOL, contudo, não vê a parceria com bons olhos, já que o pré-candidato da Rede negocia o apoio de legendas da centro-direita.

Porta-voz da Rede, a ex-senadora Heloísa Helena diz que os dois casos estão devidamente respaldados pelo Estatuto da Federação e pela Resolução Política pactuada na estruturação da parceria.

ENTENDA DIFERENÇAS ENTRE FEDERAÇÕES E COLIGAÇÕES

O que são federações: o mecanismo permite que os partidos se aliem na disputa eleitoral, de forma similar como ocorria com as coligações partidárias, somando tempo de TV e se unindo na hora do cálculo do quociente eleitoral.

Os partidos federados ficarão juntos pelos próximos quatro anos, não apenas durante as eleições. E terão que replicar a parceria nacional nas eleições em todos os estados e municípios.

A federação funciona como um partido político: tem comando e estatutos próprios. Nos parlamentos, as bancadas de eleitos em uma federação precisarão atuar em conjunto.

Esta será a primeira vez que o pleito contará com a possibilidade das federações partidárias. Seu maior objetivo é incentivar as fusões entre as siglas, pois há um número excessivo de partidos políticos no Brasil.

O que são coligações: ao contrário das federações, as coligações entre partidos se limitam ao período das eleições. Abertas as urnas, as legendas não tinham mais nenhum compromisso entre si.

Neste mecanismo, os partidos podem ter diferentes parceiros nas disputas nacionais e regionais.

A atual lei eleitoral proíbe coligações entre partidos políticos nas eleições proporcionais – disputas para a Câmara dos Deputados, Assembleias Legislativas, Câmara Distrital e Câmaras Municipais.

As coligações seguem valendo para as disputas majoritárias, para a Presidência, Senado, governos estaduais e prefeituras.

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