Peso da dívida no PIB despenca e tendência do indicador divide analistas

Em outubro de 2020, a relação dívida bruta do governo geral/PIB chegou a 89%, valor recorde para a série histórica do Banco Central

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Peso da dívida no PIB despenca e tendência do indicador divide analistas
(Foto: Gabriel Cabral/Folhapress)

(FOLHAPRESS) – A alta da inflação e a retomada da economia deram uma contribuição significativa para reduzir a dívida brasileira nos últimos 18 meses, contrariando projeções feitas no primeiro ano da pandemia, quando o indicador atingiu patamar recorde.

Em outubro de 2020, a relação dívida bruta do governo geral/PIB chegou a 89%, valor recorde para a série histórica do Banco Central. Desde então, recuou para 78,3%, patamar muito próximo do verificado antes da pandemia.
Naquela época, os analistas consultados pelo BC chegaram a projetar que a dívida bruta ficaria ao redor de 95% do PIB em 2020 e 2021 e seguiria para quase 100% a partir de 2026, ano em que acaba o teto de gastos. Ou seja, uma trajetória de crescimento constante.

DÍVIDA DO BRASIL SE MANTÉM ACIMA DO PATAMAR PRÉ-PANDEMIA

O aumento da dívida em 2020 se deu, sobretudo, pela emissão de títulos para financiar ações relacionadas à pandemia, como o pagamento do auxílio emergencial. Também foi um período de queda do PIB (Produto Interno Bruto) e de inflação baixa, outros fatores que afetam o cálculo.

Em 2021, a economia voltou a crescer, a inflação disparou e houve redução de despesas e aumento de receitas com a ajuda do novo boom de commodities -as contas do setor público estão no azul desde o ano passado.
Atualmente, as projeções apontam uma dívida/PIB de 81% ao fim de 2022, chegando a 86% entre 2025 e 2029, recuando para 84% em 2030.

Rafaela Vitória, economista-chefe do banco Inter, atribui a queda da dívida a alguns fatos inesperados. Entre eles, uma melhora estrutural da arrecadação, que ainda deve garantir superávits crescentes nas contas públicas nos próximos anos, dada a expectativa de manutenção de preços de commodities em níveis superiores aos do pré-pandemia.

Ela cita também a inflação, que tem efeito positivo nas receitas e negativo nas principais despesas, que são reajustadas uma vez por ano. Esse foi ainda um período de contenção de gastos, por causa da regra do teto e do aditamento de reajustes a servidores, e com retorno de recursos do BNDES e de fundos setoriais que ajudaram a reduzir o endividamento.

Para Vitória, mais importante que o nível atual da dívida é a trajetória de queda, que não deve mudar, mesmo em caso de revisão do teto de gastos, independentemente de quem for o próximo presidente.

“Não só a [relação] dívida/PIB caiu, como a trajetória é hoje muito mais benigna”, afirma a economista, que prevê um pico de 81% em 2027 e queda nos anos seguintes.

Pelo critério do FMI (Fundo Monetário Internacional), que permite a comparação internacional, a dívida brasileira vai terminar este ano em 90% do PIB, abaixo do patamar das economias avançadas (119%) e acima da média dos emergentes (65%).

Juliana Damasceno, analista da Tendências Consultoria, avalia que a queda da dívida se deu por questões artificiais que estão mascarando um cenário de incerteza em relação à política fiscal e de piora no perfil da dívida.

Ela diz que o país tem um nível elevado de endividamento e que as projeções de redução da dívida nos próximos anos não contemplam um fim abrupto do teto de gastos e algumas bombas fiscais, como o adiamento do pagamento de precatórios.

Damasceno afirma que as receitas do governo estão artificialmente infladas, por causa da inflação e dos ganhos das empresas com a alta das commodities, dois fatores que começam a perder força a partir de 2023. Cita ainda a pressão por reajuste no funcionalismo.

“A gente teve fatores influenciando de forma bastante intensa essa dívida para baixo em 2021 e 2022, mas é por motivos que a gente não deve comemorar e que não são sustentáveis no médio e longo prazo”, afirma Damasceno. “É insustentável fazer ajuste fiscal com congelamento de salários e imposto inflacionário.”

De acordo com os dados do BC, a redução de cerca de 10 pontos percentuais na dívida desde outubro de 2020 decorreu sobretudo do crescimento do PIB nominal, que é o valor do PIB corrigido pela inflação -é utilizado um deflator que atualmente supera o IPCA.

Esse fator, isolado, reduziu a relação dívida/PIB em 15,6 pontos percentuais até abril deste ano. Os resgates superiores às emissões de dívida ajudaram com mais 2,1 pontos, e a variação do câmbio contribuiu com 0,8 ponto. A incorporação de juros anulou quase metade desse ganho.

A IFI (Instituição Fiscal Independente) projeta que a dívida bruta fique em 78,7% do PIB neste ano, 79,3% em 2023 e 81,7% na média de 2024 a 2031.

Daniel Couri, diretor-executivo interino da IFI, afirma que a dívida caiu não apenas por causa da inflação, que aumenta o PIB nominal, mas também da recuperação da atividade econômica. A perspectiva para os próximos anos é de crescimento do indicador, tendo em vista que, de 2023 em diante, não se espera o mesmo crescimento vigoroso do PIB nominal. A instituição calcula que seria necessário um superávit primário de 1,4% do PIB para estabilizar a dívida.

“Vale mencionar o risco existente nas pressões por aumento nas despesas primárias e nas renúncias de receitas (que podem se tornar permanentes), que podem deteriorar a trajetória do resultado primário do setor público”, afirma.
Em relatório divulgado no início do ano, a agência de classificação de risco Fitch Ratings afirmou que a recuperação econômica após o primeiro impacto da pandemia foi o principal fator que ajudou a reduzir o endividamento global em 2021 -após os gastos elevados do ano anterior. Em 2022, a contribuição virá da inflação, que pode reduzir o indicador global em 2 pontos percentuais do PIB.

O Tesouro Nacional estima que a dívida bruta do governo geral deve fechar este ano em 78,3% do PIB (Produto Interno Bruto), subir a 78,5% em 2023 e cair paulatinamente até 69,9% do PIB em 2031 -patamar próximo ao que era observado em 2016, segundo relatório divulgado na última quarta-feira (29).Os cálculos indicam a possibilidade de o Brasil registrar superávits crescentes nos próximos anos e consideram a manutenção do teto de gastos até 2026.

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