Brasil não avança em integração de saneamento e de Defesa Civil para combater eventos extremos

Entre mudanças em orçamento e falta de atualizações, segundo especialistas ouvidos pela Folha, o país peca ao não avançar na integração entre sistemas de prevenção, saneamento e educação para eventos extremos

Folhapress Folhapress -
Brasil não avança em integração de saneamento e de Defesa Civil para combater eventos extremos
Situação da ponte entre Lajeado e Estrela, no Rio Grande do Sul. (Foto: Reprodução/Twitter)

LUCAS LACERDA – SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Após os desastres no Rio de Janeiro que deixaram 900 mortos em 2011, o Brasil criou a legislação que organiza a defesa civil e as políticas de monitoramento e alerta de desastres. Mas essas medidas, de 2012, já não são mais suficientes.

Entre mudanças em orçamento e falta de atualizações, segundo especialistas ouvidos pela Folha, o país peca ao não avançar na integração entre sistemas de prevenção, saneamento e educação para eventos extremos como os que atingem o Rio Grande do Sul e Santa Catarina.

No último ano, o governo Lula (PT) tem investido prioritariamente na elaboração do Plano Nacional de Proteção e Defesa Civil, previsto ainda na lei 12.068, de 2012, mas nunca criado. O documento deve ser lançado em junho, segundo previsão do Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional.

Contratado no ano passado pelo ministério e elaborado por especialistas técnicos e acadêmicos e com consulta pública, o documento não tem à frente alguns dos profissionais que têm experiência e tecnológica sobre desastres, segundo a diretora do Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais) Regina Alvalá.

“O conhecimento aqui do centro deveria estar na vanguarda de toda iniciativa conduzida por ministérios para estabelecer planos e políticas. O Brasil fica muito na gestão do desastre, e precisa centrar esforços na gestão dos riscos de desastres.”

A diretora ressalta que a questão não é diminuir o protagonismo da Defesa Civil, tanto a nacional quanto as estaduais e municipais. Mas para gerir riscos, diz ela, o Cemaden, que é vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, tem muito a contribuir com 13 anos de alertas, estudos e dados de monitoramento.

Em 2012, foram definidos pelo governo 821 municípios considerados críticos para desastres. A lista cresceu para 1.942 com a publicação de uma nota técnica do ano passado pela Casa Civil do governo Lula e análises de órgãos técnicos –o Cemaden entre eles.

Essas cidades são consideradas prioritárias na gestão de riscos, e reúnem 8,9 milhões de pessoas em situação de riscos geo-hidrológicos, como inundações e deslizamentos.

Para atualizar a lista, foram usados critérios como a vulnerabilidade a inundações, segundo estudo de 2014 da Agência Nacional de Águas, e a análise, em 42 anos, de quais cidades tiveram ao menos 400 dias com chuvas acima de 50 milímetros ou 100 milímetros.

Em paralelo ao plano e às atualizações de cidades e critérios em risco, o país também precisa criar uma política integrada de infraestrutura hídrica, diz o professor Eduardo Mario Mendiondo, coordenador científico do Centro de Estudos e Pesquisas em Desastres (Ceped) da USP.

Para ele, o Brasil evoluiu muito na emissão de alertas, na prevenção e na resposta das unidades de Defesa Civil e em estudos sobre o tema de riscos. Mas para ele, o país ainda esbarra em modelos isolados para gestão de águas urbanas, que reúne abastecimento público, o esgotamento sanitário, o esgotamento de águas pluviais e o manejo de águas pluviais e o manejo de resíduos sólidos.

“O que vemos hoje na tragédia que chega até Porto Alegre [RS] é esgoto se acumulando devido ao represamento das águas altas do Guaíba, que recebem influência extraordinária da região de Jacuí, Gravataí, Taquari e Caí, rios que o alimentam.”

Mendiondo aponta que a forma atual de lidar com a infraestrutura da água em cidades vai continuar a causar problemas. “Temos os melhores projetos isolados de drenagem, de abastecimento e de resíduos sólidos.”

Para o pesquisador, o Brasil avançou em prevenção e resposta a desastres nos últimos 12 anos, mas ainda tem uma dívida com o saneamento que ainda prejudica a prevenção a desastres.

No Congresso há uma proposta de 2021 enviada pelo governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), apelidado de “novo marco hídrico”, que fala sobre infraestrutura hídrica.

Para Amauri Pollachi, conselheiro do Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento (Ondas), qualquer decisão sobre infraestrutura hídrica precisa ser adaptativa à crise climática.

Um exemplo é a manutenção de áreas verdes que possam servir de pontos de alagamento. Ele cita como exemplo o rio Emscher, já considerado o mais sujo da Alemanha, transformado em uma área de alagamento que ajudou a mitigar danos em chuvas que mataram ao menos 143 pessoas no país em 2021.

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