Conservadora ganha eleição partidária e deve se tornar a primeira mulher premiê do Japão
Veterana do Partido Liberal Democrata (PDL) chega à liderança após ficar em segundo lugar na última eleição

VICTORIA DAMASCENO – A conservadora Sanae Takaichi, 64, foi eleita neste sábado (4) como a nova liderança do Partido Liberal Democrata (PDL) do Japão, o que indica que também se tornará a primeira mulher a assumir o cargo de primeiro-ministro do país.
Se confirmada pelo Parlamento, sua eleição manterá o legado de sete décadas da sigla dominando a política de uma das maiores economias do mundo.
Conhecida por ser linha-dura da política japonesa, a eleição de Takaichi é lida como fortalecimento da ala mais à direita do partido, significativa em sua base. Durante a campanha, ela prometeu investimentos em áreas-chave para promover a segurança econômica.
Sua possível ascensão ao cargo de premiê como a primeira mulher na função, porém, não indica defesa de políticas de equidade de gênero, segundo especialista ouvida pela reportagem.
Ela derrota em segundo turno o ex-ministro do Meio Ambiente, Shinjiro Koizumi, 44, herdeiro de uma dinastia política com mais de um século de influência no governo japonês. Os outros três concorrentes, o ex-secretário-chefe de gabinete Yoshimasa Hayashi, 64, o ex-ministro de Relações Exteriores Toshimitsu Motegi, 69, e o ex-ministro de Segurança Econômica Takayuki Kobayashi, 50, perderam na primeira rodada da votação.
A veterana do partido chega à liderança após ficar em segundo lugar na última eleição, e acumular cargos de importância, como o de ministra da Segurança Econômica e Assuntos Internos.
A expectativa é que Câmara Alta e Baixa (equivalente à Senado e Câmara no Brasil) a confirmem como a nova primeira-ministra do Japão em 15 de outubro, data em que o PDL deve organizar uma sessão extraordinária na Casa para o pleito, segundo a imprensa local.
Até a última eleição, quando o partido tinha a maioria do parlamento, o resultado sobre quem seria a liderança da sigla automaticamente indicava o premiê. Agora há espaço para disputa, mas como o partido ainda é representativo, é esperado que a votação seja simbólica.
Os pleitos ocorrem após o ex-primeiro-ministro, Shigeru Ishiba, renunciar ao cargo no início de setembro devido a pressões decorrentes das últimas derrotas eleitorais. Perder em julho deste ano a maioria da Câmara Alta, o equivalente ao Senado no Brasil, foi decisivo.
O resultado do fracasso representou para o partido, que dominou a política japonesa dos últimos 70 anos, uma de suas piores derrotas. Na época, porém, Ishiba afastou a possibilidade de renúncia.
Antes disso, em outubro do ano passado, o PDL também se tornou minoritário na Câmara Baixa, o que aumentou a pressão na derrota mais recente. Nesse caso, foi o pior desempenho dos 15 anos anteriores.
Agora, Takaichi herda um país com uma das maiores dívidas do mundo, além do desafio de unir o próprio partido.
Ao contrário dos competidores, que iriam seguir, ao menos em parte, as políticas orçamentárias de Ishiba, a nova liderança aposta em gastos governamentais em áreas como ciência e tecnologia e outros setores-chave do governo, como produção de alimentos e infraestrutura.
Takaichi também prometeu fazer uma revisão nas políticas de migração ao afirmar que o número de estrangeiros no país deixa japoneses “à flor da pele”. Ponderando o turismo e a necessidade de trabalhadores do exterior, Takaichi afirmou que uma imigração precipitada poderia criar clima hostil na sociedade japonesa, e que a revisão seria necessária para “viver em paz” com os estrangeiros.
Entre suas promessas está também a paridade de gênero no alto escalão da política. A política disse que o governo e o comitê executivo do partido terão “mulheres em uma proporção comparável à dos países nórdicos”.
Apesar da promessa, a professora de ciências políticas Gill Steel, docente da Doshisha University em Kyoto, afirma que Takaichi não pode ser vista como uma feminista.
“Para progressistas e feministas, que esperam ver mais mulheres na política, a sua escolha, caso ocorra, seria como um desejo atendido de forma distorcida. Ela é uma conservadora linha-dura, e seu conservadorismo inclui a oposição a reformas que permitiriam às mulheres casadas manter seus próprios sobrenomes de família. Ela não apenas se opôs a isso, como liderou um grupo que combatia a proposta”, afirma a docente.
Steel se refere à lei que exige que cônjuges tenham o mesmo sobrenome. A legislação não determina se o nome do homem ou da mulher deve ser o adotado, mas, na prática, são elas que acabam se adequando.
Em 2015, uma decisão da Suprema Corte do país confirmou a legalidade da lei, o que representou uma derrota para cinco pleiteantes que afirmavam que a legislação era inconstitucional e feria direitos humanos. Nos últimos anos, casais têm entrado na Justiça para manter sobrenomes distintos, mas casos notórios mostram que as decisões são desfavoráveis.
Segundo a docente, é importante ter em mente que o partido é visto como conservador de forma geral quando o assunto são os direitos das mulheres. “O fato de ela não ser uma feminista declarada a torna mais aceitável para o PDL, especialmente para seus setores mais conservadores”, diz.