Faxineira cai de prédio, e polícia apura suspeita de cárcere privado na BA

Mulher sofreu fraturas nas pernas e foi levada para o Hospital Geral do Estado

Folhapress Folhapress -
Faxineira cai de prédio, e polícia apura suspeita de cárcere privado na BA
Imagem mostra a babá Raiana Ribeiro da Silva, que pulou de prédio em Salvador, sendo socorrida por equipe de resgate A babá Raiana Ribeiro da Silva, que pulou de prédio em Salvador, é socorrida por equipe de resgate (Foto: Reprodução)

Franco Adailton, da BA – Uma empregada doméstica de 25 anos caiu do terceiro andar de um prédio, em Salvador, nesta quarta-feira (25), para, segundo a polícia, fugir do cárcere privado sob o qual estava sendo mantida pela patroa, que não aceitou o pedido de demissão da funcionária.

A babá Raiana Ribeiro da Silva saiu de Itanagra, a 150 km da capital baiana, para trabalhar no apartamento da empregadora desde o último dia 19, em um edifício no Imbuí, bairro de classe média, onde tomava conta sozinha de trigêmeos, além de ficar encarregada dos demais afazeres domésticos.

Dizendo-se sobrecarregada, Raiana encontrou uma outra vaga para substituir a atual, anunciada num site. No sábado (21), após comunicar o desligamento à patroa, teve seu celular confiscado, passou a ser agredida e, por esse motivo, trancou-se em um banheiro, conforme o relato policial.

Para escapar do apartamento, Raiana, sem se alimentar desde então, pulou do cômodo no início da manhã desta quarta-feira (25), caiu no primeiro andar do edifício e foi socorrida por vizinhos, que acionaram a polícia.

A mulher sofreu fraturas nas pernas e foi levada para o Hospital Geral do Estado, mas já recebeu alta no início da noite. A reportagem não conseguiu contato com ela na noite desta quarta.

Situações de cárcere privado, confinamento, violações de direitos, jornadas de trabalho acima de oito horas diárias e redução de salário se tornaram comuns ao longo da pandemia, afirma a secretária-geral da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas, Creuza Oliveira.

“Infelizmente, em pleno século 21, esses absurdos continuam a acontecer com muitas trabalhadoras”, disse. “Estamos passando pela segunda onda do navio negreiro, pois não há segurança nenhuma para as trabalhadoras”, afirmou.

Segundo Creuza, somente no primeiro semestre deste ano, mais de cem denúncias relacionadas a privação de liberdade na Grande Salvador havia sido registradas no Sindicato dos Trabalhadores Domésticos do Estado da Bahia.

“O que acontece é que os empregadores não querem deixar as trabalhadoras voltarem para casa, para evitar exposição ao coronavírus, por que elas andam de transporte público”, relata. “Há casos de quem ficou seis meses sem ver a família.”

S.C*, 60 anos, fugiu da violência doméstica em uma cidade na região metropolitana de Salvador para trabalhar em Lauro de Freitas, vizinha à capital baiana, numa mansão de dois pavimentos, sete quartos com suíte, piscina, com pagamento mensal de R$ 500, sem reajuste no período.

“Quem me trouxe disse que seria um salário mínimo, carteira assinada, mas a condição era eu morar no trabalho. Trabalhava de domingo a domingo, para uma estrangeira, que me dava restos de comida. Não deixava eu botar a cara na rua”, disse.

Ainda assim, sem família na capital, ela continuou no trabalho, até ser demitida depois de exigir direitos trabalhistas, como folga e alimentação. “Ela me botou pra fora só porque eu pedi almoço. Eu passava fome.”

“As trabalhadoras temem denunciar por que, muitas vezes, prestam serviço a gente poderosa, influente. Muitas são chefes de família, acabam se submetendo por medo de perderem a única renda da casa”, disse Creuza.

De acordo com o artigo 149 do Código Penal Brasileiro, entre os elementos que caracterizam o trabalho análogo ao escravo está o trabalho forçado (manter a pessoa no serviço por meio de fraudes, isolamento geográfico, ameaças, violências físicas e psicológicas).

“O confinamento obrigatório nas casas dos patrões, aliado a jornadas exaustivas, condições degradantes de alojamento, pode configurar, sim, trabalho análogo ao de escravo”, disse a procuradora Manuella Gedeon, que coordena as ações de combate ao trabalho escravo no MPT (Ministério Público do Trabalho) na Bahia.

Além de multa, informa a procuradora, manter empregado sob condição de trabalho análogo ao de escravo pode resultar em prisão de dois a oito anos.

A Polícia Civil baiana informou que o caso está sendo investigado pela 9ª Delegacia Territorial, cujo titular já começou a ouvir depoimentos, solicitou as imagens das câmeras do edifício e deverá intimar a empregadora nesta quinta-feira (26).

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