Bolsonaro ensaia discurso de vítima e deve recorrer ao STF contra inelegibilidade
Reverter a decisão é algo considerado, por uma ala de aliados do ex-presidente, ainda mais difícil do que conseguir placar favorável no TSE
MARIANNA HOLANDA E JULIA CHAIB
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) está inconformado com o processo no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) que pode levar à sua inelegibilidade, segundo aliados.
A avaliação dele e de seu entorno é que a ação é política e, por esse motivo, a estratégia é adotar um discurso de “vítima do sistema” e recorrer ao STF (Supremo Tribunal Federal) se a pena for confirmada na corte eleitoral.
Reverter a decisão no Supremo é algo considerado, por uma ala de aliados de Bolsonaro, ainda mais difícil do que conseguir placar favorável no TSE. Eles avaliam, no entanto, que a palavra final não será pelo tribunal eleitoral.
Outro grupo acredita que o STF pode ficar sensível a críticas de que tirar Bolsonaro da eleição seria agir politicamente e, por isso, devolvê-lo ao pleito.
Não descartam também, futuramente, quando a composição do TSE for alterada e o ministro Alexandre de Moraes tiver deixado a presidência, entrar com recursos contra uma decisão desfavorável.
Segundo a coluna da Mônica Bergamo, do jornal Folha de S.Paulo, Bolsonaro continuará buscando reverter o cenário e não pretende se render nem indicar sucessor.
À Folha de S.Paulo o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) afirmou que o pai será o “maior cabo eleitoral da história”, dando o tom da estratégia que será usada para mostrar o ex-presidente como vítima e fortalecer o bolsonarismo.
Na semana passada, a Procuradoria Eleitoral deu parecer favorável para que o ex-chefe do Executivo perca o direito de se candidatar pelos próximos oito anos. O julgamento pode ocorrer ainda em abril, segundo integrantes do tribunal e do entorno de Bolsonaro.
Valdemar Costa Neto, presidente do PL, disse à reportagem que o parecer do Ministério Público Eleitoral pedindo inelegibilidade é “absurdo”.
Aliados apontam como elemento para uma suposta perseguição o fato de, dentre 21 processos a ação na Justiça Eleitoral que pode torná-lo inelegível, ser o único que está correndo de forma célere.
Além disso, citam a rapidez com que o processo andou em comparação com o julgamento da ex-presidente Dilma Rousseff no passado, que demorou mais de dois anos até a decisão final, em 2017.
Outra evidência, acrescentam esses aliados, é o fato de terem sido acrescentadas informações novas sobre os ataques golpistas de 8 de janeiro, quando apoiadores de Bolsonaro insatisfeitos com o resultado eleitoral depredaram a sede dos três Poderes.
Nas alegações finais, a defesa de Bolsonaro defende a nulidade do processo, diz que não teria como uma reunião realizada com embaixadores no meio do ano passado ter levado aos atos golpistas de janeiro.
O documento de mais de 70 páginas é assinado pelo advogado e ex-ministro do TSE Tarcísio Vieira de Carvalho Neto e sua equipe.
Os advogados afirmam ainda que o ex-presidente nem sequer estava no Brasil quando se desenrolou o episódio Bolsonaro viajou para os Estados Unidos em dezembro passado, antes do final do mandato, ignorando o rito democrático de passar a faixa para o sucessor.
Para interlocutores do Bolsonaro, o ideal era que o processo fosse julgado mais adiante, no segundo semestre, quando esperam que o clima político esteja menos tenso e mais distante dos atos golpistas de janeiro.
Porém a expectativa tanto no TSE como entre aliados de Bolsonaro é que o julgamento ocorra nas próximas duas semanas.
Se Moraes pautar já o processo, avaliam, é sinal de que o ex-presidente será mesmo condenado. Ainda que haja pedido de vista de algum ministro, seria por apenas 60 dias, e dificilmente haveria alguma mudança substancial no caso.
No entorno de Bolsonaro, trabalha-se por um placar de quatro votos favoráveis a Bolsonaro e três contrários. A maior dúvida gira em torno do voto do ministro Carlos Horbach, cujo mandato termina em maio. Ele pode ser reconduzido a depender do aval de Moraes.
Em 2021, Horbach votou contra a cassação do mandato do então deputado estadual paranaense Fernando Francischini (à época no PSL) por propagação de notícias falsas sobre as urnas eletrônicas. Foi o único voto nesse sentido no TSE, o que levanta dúvidas se ele votaria por condenar Bolsonaro.
O problema, apontam aliados do ex-presidente, é ele dar um voto divergente em relação a Moraes, o que dificultaria o processo de recondução.
Aliados de Bolsonaro defendem que não há motivo jurídico para impedir que ele se candidate no futuro.
A ação que mira a inelegibilidade do ex-presidente foi movida pelo PDT no ano passado e argumenta que Bolsonaro usou a estrutura do Alvorada para atacar a integridade do sistema eleitoral na reunião com embaixadores.
Depois, em janeiro, o partido pediu a inclusão no processo da minuta golpista encontrada pela Polícia Federal durante busca e apreensão na casa do ex-ministro da Justiça de Bolsonaro Anderson Torres.
A legenda argumentou que a minuta encontrada seria um “embrião gestado com pretensão a golpe de Estado”, sendo apto a “densificar os argumentos que evidenciam a ocorrência de abuso de poder político tendente promover descrédito a esta Justiça Eleitoral e ao processo eleitoral, com vistas a alterar o resultado do pleito”.
O documento propunha um decreto para instaurar estado de defesa na sede do TSE para rever o resultado do pleito.
A minuta deu robustez à ação, consideram integrantes do tribunal.
Isso significa, no entender de membros do TSE, que o relator pode finalizar o parecer sobre o tema e liberar o caso para julgamento ainda na próxima semana. Se isso se confirmar, caberá a Moraes definir se inclui ou não o processo na pauta de abril.
Advogados de Bolsonaro afirmaram, nas alegações finais do processo, que o encontro com embaixadores foi “de interesse das relações exteriores do Brasil, diante do debate público instaurado à época”.