Mortes impõem medo e mudam rotina de estudantes de medicina brasileiros no Paraguai

Alta violência nas cidades próxima as fronteiras está ligada à facções criminosas que escoam drogas

Folhapress Folhapress -
(Foto: Reprodução)Mortes impõem medo e mudam rotina de estudantes de medicina brasileiros no Paraguai
(Foto: Reprodução)

Os brasileiros que vivem na fronteira do Paraguai costumam dizer que as balas dos inúmeros atentados ocorridos naquela região têm CPF.

A expressão se baseia na crença de que as pessoas que morrem nesse tipo de ocorrência, em geral, estão envolvidas com a criminalidade.

Nas últimas semanas, essa percepção foi bastante abalada, com a morte de três jovens estudantes de medicina que acompanhavam um homem que seria o verdadeiro alvo de um desses crimes.

A cidade paraguaia de Pedro Juan Caballero tem mais de 10 mil estudantes brasileiros, boa parte deles de medicina. Esse contingente é atraído pelas mensalidades mais acessíveis e menor dificuldade para entrar nos cursos, na comparação com universidades brasileiras.

Na porta de uma dessas faculdades de medicina, amigos de uma das vítimas da chacina, Rhannya Jamilly Borges de Oliveira, colocaram faixas que expressam luto e pedem por paz na fronteira.

Além da tristeza pela perda de uma colega, estudantes passaram a temer ainda mais pela própria segurança e afirmam que pretendem adotar um modo de vida mais recluso.

“Está todo mundo muito abalado, uma delas era minha colega de sala”, diz o estudante Rodolfo Borges, 21, há apenas três meses em Pedro Juan Caballero. “Acredito que agora todo mundo vai ficar mais em casa, cuidar com quem a gente sai, porque tem muita influência também”, completa.

A tendência, segundo os estudantes, é que eles se fechem mais em torno dos próprios colegas pelo medo de estar com a pessoa errada na hora errada.

No sábado (10), criminosos dispararam mais de 100 vezes em um atentado cujo alvo era Osmar Vicente Álvarez Grance, 32, conhecido como Bebeto, suspeito de envolvimento com o criminosos, que saía de uma casa noturna.
Com ele, morreram também Hayllee Carolina Acevedo Yunis, filha do governador do estado paraguaio de Amambay, e a brasileira Kalline Reinoso de Oliveira, além de Rhannya –todas estudantes de medicina.

“É tudo com quem você anda aqui. É estar no lugar errado na hora errada. Você não sabe com quem a pessoa mexeu, o que a pessoa faz. Eu espero que as pessoas tomem mais cuidados, porque foi muito violento, tomar cuidado com quem anda, não ficar saindo”, diz a estudante Renata da Rocha, 22.

Mas os riscos, dizem, existem em qualquer lado da fronteira. “Estamos nos sentindo como quem mora no Brasil, a criminalidade está em todos os países”, diz Ana Paula Lima, 37.

Em Pedro Juan Caballero, a nova leva de mortes foi motivo de um protesto no dia seguinte ao crime, com faixas como a que pedia “Basta de muertes inocentes”.

A violência fez com que até grupos criminosos enviassem cartas cobrando das autoridades a resolução dos homicídios e ameaçando que 3.000 homens agiriam caso isso não acontecesse.

A investigação da chacina continua e, até agora, há seis brasileiros presos, suspeitos de atuarem a mando do PCC em um acerto de contas. Além deles, foi detido um outro homem suspeito de atuar apontando quem eram os alvos para os matadores.

As mortes se somam a vários outros casos recentes na região, entre elas a morte de um vereador que andava de bicicleta em Ponta Porã (que fica do lado brasileiro da fronteira, no Mato Grosso do Sul). Farid Afif (DEM) andava de bicicleta quando foi atingido por disparos feitos por um motociclista.

Responsável pela delegacia regional de Ponta Porã, o delegado Clemir Vieira Jr. diz que as forças policiais dobraram na cidade nos últimos dias.

Apesar de a chacina de sábado ter ocorrido no lado paraguaio, ele admite que a morte das três jovens mexe com a sensação de segurança na cidade.

O policial afirma, porém, que do lado brasileiro os homicídios neste ano ainda não apresentam uma explosão numérica.

Segundo ele, foram 36 casos até setembro na cidade. Em 2020 e 2019, foram 49 e 59, respectivamente –números que seguem, porém, bem acima de 2018, quando foram registradas 33 mortes.

Na visão dos policiais, o ponto central dos crimes é a atuação do PCC. A facção tomou o controle daquela região com o assassinato do antigo “rei da fronteira”, Jorge Rafaat. Com isso, o grupo tem acesso a um corredor de exportação para escoar a droga vinda de países vizinhos.

Além do PCC, o Comando Vermelho também age por ali, embora tenha maior presença na cidade Paraguaia de Capitan Bado, que faz fronteira com a cidade brasileira de Coronel Sapucaia (MS).

Segundo policiais, a atuação na região traz uma série de desafios para resolver crimes que, muitas vezes, começam num país e terminam em outro –corpos são jogados do outro lado da fronteira, assim como carros e armas.

Em meio a essa situação, ainda há a ação de supostos grupos justiceiros que deixam bilhetes, citando crimes de roubos praticados pelas vítimas.

No lado paraguaio, há constantes ataques a policiais. O último deles foi ao agente Hugo Ronaldo Acosta, de 32 anos, que foi morto com mais de 30 tiros dentro de um carro em Pedro Juan Caballero.

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