Injúria racial é crime imprescritível e equiparado ao racismo, decide STF

Julgamento do tema teve início em novembro do ano passado

Folhapress Folhapress -
Ministro Luiz Fux preside sessão remota no STF. (Foto: Nelson Jr)

Matheus teixeira, do DF –  O STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu nesta quinta-feira (28) que a injúria racial é equiparada ao crime de racismo e, portanto, esse tipo de delito é imprescritível e deve ser punido a qualquer tempo, independentemente do período que se passou do episódio.

O placar foi 8 a 1. Os ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Luiz Fux votaram nesse sentido. O ministro Kassio Nunes Marques foi o único a divergir e a defender que esse tipo de decisão deveria ser tomada pelo Congresso Nacional.

O julgamento do tema teve início em novembro do ano passado, mas havia sido interrompido por pedido de vista (mais tempo para analisar o caso) de Moraes.

A maioria da corte acompanhou o voto do relator, Edson Fachin, que votou para rejeitar o habeas corpus apresentado pela defesa de uma mulher que foi condenada por injúria qualificada pelo preconceito.

O caso foi incluído na pauta do STF após ganhar ampla repercussão o assassinato de um homem negro por seguranças brancos em um supermercado em Porto Alegre (RS).

Os ministros analisaram a situação de uma idosa de Brasília que foi condenada em 2013 por ter ofendido a frentista de um posto de gasolina. “Negrinha nojenta, ignorante e atrevida”, disse na ocasião.

A mulher, por sua vez, pediu para o Judiciário para não ser punida sob o argumento de que o Judiciário demorou muito para analisar seus recursos.

O STF, porém, rejeitou o pedido dos advogados da condenada. Fachin afirmou que esse tipo de conduta “torna ainda mais difícil a já hercúlea tarefa de cicatrizar as feridas abertas pela escravidão”.

“A atribuição de valor negativo ao indivíduo, em razão de sua raça, cria as condições ideológicas e culturais para a instituição e manutenção da subordinação, tão necessária para o bloqueio de acessos que edificam o racismo estrutural”, disse.

O magistrado afirmou que “há racismo no Brasil” e classificou essa conduta como “uma chaga infame que marca a interface entre o ontem e o amanhã”.

“Homens e mulheres não são negros apenas pela cor da pele, mas pela atribuição de sentidos que apagam as riquezas de suas ancestralidades e os qualificam a partir de valores negativos, até mesmo desumanizantes (a exemplo do comum xingamento que utiliza a expressão “macaco”), que ditam a maneira de como estes sujeitos se apresentam no mundo e de como lhe são atribuídas desvantagens”, disse.

E prosseguiu: “A Constituição de 1988 rompeu o silêncio da razão e estabeleceu como um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil a promoção do bem de todos, sem preconceitos origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.

Fux seguiu a mesma e afirmou que linha “essa promessa constitucional se torna efetiva não só com a especificação em abstrato do crime de racismo”, mas impondo penas proporcionais à gravidade da conduta a quem cometer esse tipo de delito.

Rosa Weber, por sua vez, classificou as ofensas proferidas pela mulher à frentista como “terríveis e inadmissíveis”.

“Entendo que esse crime carrega componente valorativo inerente ao âmbito conceitual do racismo”, disse.

Moraes seguiu a mesma linha e fez críticas à conduta da mulher condenada: “Amanhã, o Congresso pode estabelecer outros tipos penais que permitam o enquadramento das modalidades de racismo. O que a Constituição torna imprescritível é qualquer prática de condutas racistas, e essa prática da paciente foi uma conduta racista”.

Cármen Lúcia, por sua vez, disse que o julgamento tratou de “um dos temas mais graves” e que expôs a “crueldade na sociedade brasileira”.

“Não é apenas a pessoa que sofre e que passa pelo constrangimento, mas todo e qualquer ser humano dotado de sensibilidade haverá de se achar atingido por sua dignidade”, disse.

Kassio foi o único a divergir. Ele citou que crimes como feminicídio, estupro seguido de morte e tráfico de drogas também têm prazo de prescrição e que não cabe ao Supremo definir quais delitos devem ser enquadrados nessa categoria.

“A interpretação extensiva de uma hipótese de imprescritibilidade pelo Poder Judiciário, de forma transversa, retroage em malefício do cidadão acusado de algum delito, violando esta garantia”, afirmou.

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