População de Xangai se revolta contra lockdown e fura bloqueio para criticar regime na internet

Regime adotou uma série de medidas polêmicas para combater o surto, sendo a mais ruidosa delas a separação de pais e bebês infectados

Folhapress Folhapress -
População de Xangai se revolta contra lockdown e fura bloqueio para criticar regime na internet
Secretaria Estadual da Saúde já registrou 25 mortes por Covid-19 em 2024 (Foto: Divulgação/Governo de Goiás).

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – As políticas rígidas de quarentena para combater a Covid-19 na cidade de Xangai, coração financeiro e maior cidade da China, despertaram um movimento incomum na internet chinesa: grupos organizados para criticar as políticas adotadas pelo governo local.

Nesta semana, o Weibo, espécie de Twitter chinês, exibiu por horas em seus assuntos mais comentados (nos trending topics, na analogia com a rede social americana), a hashtag “Por que pessoas infectadas com Covid-19 não podem quarentenar em casa?”.

Depois de a campanha ser derrubada pelo regime, os internautas chineses adotaram outra estratégia: passaram a substituir a palavra “China” por “Estados Unidos” para escapar da censura. Assim, levaram de novo aos assuntos mais comentados campanhas criticando as políticas anti-Covid no país.

O movimento chama especial atenção por escapar da censura na hipercontrolada internet chinesa, em meio à frustração da população de Xangai com o rígido lockdown que vem desde 28 de março para controlar a pandemia na cidade –só nesta quinta, foram 27 mil novos casos, quase todos assintomáticos.

O regime adotou uma série de medidas polêmicas para combater o surto, sendo a mais ruidosa delas a separação de pais e bebês infectados, depois flexibilizada. A revolta mais recente é com a conversão de condomínios residenciais em centros de quarentena.

Vídeos divulgados também no Weibo viralizaram ao mostrar moradores de um condomínio em Pudong, a parte leste da cidade, reagindo ao aviso de que os prédios seriam usados como centros de isolamento. As imagens mostram policiais vestindo roupas brancas de proteção, máscaras e escudos faciais detendo de forma violenta moradores que se recusavam a sair do local.

A chegada da variante ômicron do coronavírus cruzou as rígidas barreiras que Pequim construiu ao longo de mais de dois anos de pandemia, que permitiram que o país pudesse levar uma vida relativamente normal enquanto o Ocidente fechava escolas e proibia a abertura de comércios.

O fato de manter a política restrita, no entanto, enquanto quase todo o planeta já reabriu as fronteiras, é o que tem provocado a revolta de moradores. O receio do regime é que a China passe por um movimento parecido com o da Coreia do Sul, que controlou a pandemia com sucesso até dezembro do ano passado, mas chegou a registrar dias com mais de 600 mil contaminações em março em meio ao avanço da ômicron.

Outro tópico que furou a bolha da censura foi o artigo de uma blogueira, identificada apenas como Lady Moye, intitulado “A paciência do povo de Xangai chegou ao limite”, que viralizou no WeChat, uma espécie de WhatsApp local. O texto foi excluído horas depois, por violar as regras da plataforma.

Também foi apagado o relato de uma escritora, Liu Liu, que afirmava que um colega morreu após não conseguir ir a um hospital. “Essa é uma tragédia que não teria acontecido se a cidade estivesse funcionando normalmente. Nós não deveríamos reavaliar a situação e fazer alguns ajustes?”

A mesma rede bloqueou um vídeo com uma ligação entre um homem e um trabalhador da área da saúde que dizia que não suportaria a situação por muito tempo e que poderia se demitir logo. “Não tenho ideia de por que as autoridades não conseguem tomar conta adequadamente de pessoas mais velhas e mulheres grávidas”, dizia o profissional de saúde. “Não tenho ideia de por que Xangai está assim.”

Os moradores reclamam também das condições dos próprios centros de quarentena e relatam uma série de casos de desorganização, em que pessoas foram isoladas nesses locais dias após terem sido contaminadas, em alguns casos mesmo após a recuperação e um teste negativo.

A revolta, que já vem de semanas, rendeu frutos nos últimos dias, com a permissão para moradores circularem em determinadas áreas de condomínios após dias de gritaria pelas janelas.

Na quarta-feira (13), o Centro de Controle e Prevenção de Doenças da China chegou a publicar no Wechat um guia com orientações para isolamento em casa, recomendando salas bem ventiladas, estoque de máscaras e álcool em gel, o que elevou as esperanças de mais relaxamento em vista.

Mas as expectativas caíram por terra quando, no mesmo dia, o líder do regime comunista, Xi Jinping, afirmou que “o trabalho de prevenção e controle não pode relaxar”. Em visita à ilha de Hainan, no sul do país, ele disse que a situação da pandemia pelo mundo “continua muito séria” e que a persistência da população vai fazer com que os chineses cheguem ao fim dessa crise.

Para diminuir o impacto das regras rígidas na economia do país, a China adotou em meados do ano passado o que chama de “política dinâmica de Covid zero”, que propõe fechar bairros ou regiões antes de impor lockdown sobre uma cidade inteira –o que aconteceu com Xangai ao longo de fevereiro e março.

Mas já há repercussões nas cadeias de produção. A Quanta, que fabrica computadores Macbook, notificou a bolsa de valores de Taiwan na quarta-feira que “as operações na área de Xangai foram suspensas temporariamente em resposta às medidas de prevenção da Covid”. Um dia antes, a taiwanesa Pegatron, que produz iPhones, também anunciou a suspensão temporária de atividades na cidade.

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