Chapa Boulos-Marta expõe diferenças e paralelos com Lula-Alckmin

Boulos tem buscado incorporar o espírito de frente ampla da campanha presidencial do PT

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O deputado federal Guilherme Boulos e a ex-prefeita Marta Suplicy – Fotos Mathilde Missioneiro/FolhapressChapa Boulos-Marta expõe diferenças e paralelos com Lula-Alckmin
O deputado federal Guilherme Boulos e a ex-prefeita Marta Suplicy – Fotos Mathilde Missioneiro/Folhapress

CAROLINA LINHARES

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Uma chapa surpreendente, inusitada e simbólica, unindo candidato e vice que até pouco tempo antes eram adversários nas urnas e trocavam críticas entre si, mas resolveram jogar no mesmo time com um discurso padronizado: deixar as divergências no passado para se unir em defesa de valores democráticos durante uma eleição polarizada.

Boulos-Marta é, de certa forma, a repetição da fórmula Lula-Alckmin no nível local, segundo a opinião de políticos, marqueteiros e analistas, que, embora considerem a comparação inevitável, pontuam uma série de diferenças.

Interlocutores do presidente Lula afirmam que, ao convidar Marta Suplicy de volta para o PT e oferecer a ela o posto de candidata a vice-prefeita na chapa de Guilherme Boulos (PSOL) em São Paulo, o petista teve a intenção de replicar o modelo que venceu Jair Bolsonaro (PL) em 2022.

Boulos tem buscado incorporar o espírito de frente ampla da campanha presidencial do PT e guia-se pelo pragmatismo em movimentos que miram apoiadores além da esquerda –a aliança com Marta é o principal deles até agora.

Por isso, entre entusiastas de Boulos no PT, a chapa do PSOL com Marta é vista sob a mesma lógica daquela formada por Lula com o ex-tucano Geraldo Alckmin (PSB). O objetivo é agregar todos os que se opõem a Bolsonaro, hoje tido como aliado pelo prefeito Ricardo Nunes (MDB), postulante à reeleição.

Segundo um marqueteiro que observa a eleição paulistana de fora, Boulos e Nunes ancoram suas estratégias na reprodução da polarização nacional, algo que a presença de Marta reforça. Ela empurraria o prefeito para a direita e reposicionaria o psolista mais ao centro. O que está em disputa não é só São Paulo, mas a sucessão presidencial de 2026.

Para além de semelhanças táticas, há coincidências que marcam as duas chapas.

Quando o marqueteiro Felipe Soutello sugeriu a Fernando Haddad (PT), em maio de 2021, que Alckmin fosse o vice de Lula, a conversa se deu justamente durante um jantar no apartamento de Marta Suplicy, nos Jardins, onde ela e Boulos se encontraram neste sábado (13).

A chapa Lula-Alckmin desbloqueou o surgimento de chapas improváveis e passou a ser mencionada como resposta ao ceticismo em relação à união de Boulos e Marta desde que esse plano veio à tona, antecipado pela Folha de S.Paulo em novembro.

O advogado Marco Aurélio Carvalho, que participou de reuniões que conceberam ambas as chapas, afirma que Boulos-Marta repete o enredo de 2022, mas vê um adendo afetivo no caso da ex-prefeita.

“É uma reconciliação, é a recomposição do nosso time. Marta retornar ao PT é coerente com a biografia dela. É a volta dos que não foram, ela saiu do PT, mas o PT não saiu dela”, diz.

Nas pré-campanhas adversárias, no entanto, interlocutores de Nunes, Tabata Amaral (PSB) e Ricardo Salles (PL) rejeitam a ideia de que Boulos-Marta represente uma frente ampla por enxergarem ambos como integrantes da esquerda, o que não era verdade no caso de Lula-Alckmin.

A avaliação de que Boulos e Marta estão no mesmo campo ideológico e se sobrepõem também aparece entre petistas e integrantes da pré-campanha do PSOL –seria uma chapa pão com pão, dizem. Para imitar Lula-Alckmin e furar a bolha de fato, o vice teria que acenar mais para a centro-direita e para setores conservadores.

Principalmente entre políticos bolsonaristas, Marta é tida como alguém que sempre foi de esquerda, apesar de ter rompido com o PT e votado a favor do impeachment de Dilma Rousseff (PT), por exemplo.

Alckmin não era um petista que voltou às origens. O estranhamento inicial da militância do PT a ele era motivado pelas suas posições de direita. Já Marta deve enfrentar resistência por ser vista como traidora em parte da esquerda.

Marqueteiros lembram que Marta migrou diretamente do campo rival –era secretária de Relações Internacionais da gestão Nunes até terça-feira (9). Alckmin, por sua vez, não era aliado de Bolsonaro e estava afastado da política desde a derrota na eleição presidencial de 2018.

Mesmo compartilhando o pensamento progressista, Marta e aliados de Boulos têm um histórico de farpas trocadas, assim como a ex-prefeita acumula uma série de críticas ao PT, episódios que passaram a ser lembrados. O mesmo aconteceu com Lula e Alckmin, que tiveram que explicar suas alfinetadas no passado.

Mas um aspecto que aproxima as duas chapas, de acordo com estrategistas de todos os lados, é o ganho que Marta traz para Boulos ao melhorar a aceitação a ele e ao amenizar a imagem de radical, num efeito semelhante ao de Alckmin para Lula. Ou seja, a chapa ganha outro tamanho e relevância.

Além disso, a ex-prefeita funciona como uma vacina contra a falta de experiência administrativa de Boulos e dá a ele a oportunidade de apresentar vitrines, como os CEUs e o Bilhete Único. Nesse ponto, contudo, não cabe o paralelo com Lula-Alckmin, já que o petista tinha as próprias entregas em dois mandatos presidenciais para explorar.

Nas palavras de um petista, ambas as chapas são simbólicas, mas Alckmin agregou amplitude, enquanto Marta, experiência. Os dois vices serviriam como fiadores dos postulantes perante o eleitor desconfiado.

O potencial de contribuir na votação dos candidatos foi questionado em relação a Alckmin e é também dúvida em relação a Marta, já que os dois sofreram derrotas nas urnas nos últimos pleitos. No PT, parlamentares opinam que os eleitores de Marta são os que o partido já teria, mas outros avaliam que ela tem voto próprio.

Políticos ouvidos pela reportagem afirmam que, da mesma maneira que Alckmin, Marta tem diálogo e conexões com setores que Boulos não alcança sozinho, desde a população pobre da periferia até as elites, passando pelo setor privado.

A construção das chapas Lula-Alckmin e Boulos-Marta evidenciaria ainda a habilidade de articulação do presidente petista, considerado o artífice das duas costuras. Aqui, entretanto, há distinções, porque a aproximação entre Lula e o então tucano foi pensada ao longo de meses, mantida em segredo e teve etapas planejadas de exposição pública, começando com um jantar.

O modo com que Marta deixou a gestão de Nunes para se unir a Boulos, sem informar o prefeito sobre seu encontro com Lula e em poucas semanas, foi duramente criticado entre aliados do emedebista.

Por fim, quem conhece Marta diz que ela tem um perfil diferente de Alckmin, que é discreto e se contenta com os bastidores, além de ter se mostrado um vice leal e submisso ao presidente até agora. A ex-prefeita é descrita como protagonista e proativa, alguém que vai buscar influenciar nos rumos da campanha e de um eventual governo.

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