Igreja Matriz de Anápolis quase foi demolida e reconstruída por Oscar Niemeyer
À época, arquiteto mais famoso do Brasil era mencionado apenas como um “simples comunista”
Com mais de 108 anos de história, imaginar Anápolis sem a Paróquia Catedral Bom Jesus parece algo praticamente impossível. No entanto, esta edificação, que é tão antiga quanto a cidade, já passou por maus bocados, quase sendo demolida em 1985, há quase 40 anos.
Segundo Claudiomir Gonçalves, administrador do perfil @anapolisnarede, o responsável pela iniciativa foi o bispo Dom Manuel Pestana, que, à época, liderava a chamada Igreja do Bom Jesus, que ainda não havia sido elevada ao status de catedral, tampouco ao de paróquia.
Não bastasse isso, o projeto da nova construção seria assinado por ninguém mais, ninguém menos que Oscar Niemeyer, hoje considerado um dos maiores arquitetos do Brasil, mas que, na década de 80, era mencionado como um simples “arquiteto comunista”.
Pronto, a confusão estava formada, e notícias criticando a demolição tomavam conta dos jornais e, claro, o desgosto da população anapolina.
Deu o que falar
Conforme é possível ver em uma reportagem datada de 19 de julho de 1985, do jornal Gazeta Popular, em meio a diversas entrevistas, as obras eram citadas como “luxo” e uma “mania de grandeza”.
Em entrevista para o noticiário, a historiadora e escritora Haydée Jayne Ferreira definiu o projeto como um “verdadeiro crime”, clamando para que o povo fosse às ruas para protestar contra a demolição.
“Cada tijolo daquele templo tem sua história. Os recursos financeiros eram pequenos. Por isso, o monsenhor Pitaluga, na Festa do Bom Jesus, comemorada no primeiro domingo de agosto, realizava leilões e outras promoções”, disse a profissional.
Contudo, segundo o próprio Bispo de Anápolis, a principal motivação da iniciativa era que a igreja possuía (e ainda possui) alicerces de barro, podendo desabar a qualquer momento.
Devido a isso, as negociações já estavam avançadas para o início da derrubada, sendo que engenheiros da prefeitura já haviam realizado o serviço de topografia do terreno.
Com isso, Haydée faz um questionamento: se em Ouro Preto e Olinda tivessem ocorrido essas demolições, essas cidades seriam proclamadas Patrimônio Cultural da Humanidade?
Argumento bíblico
Não satisfeita, a historiadora ainda finalizou a participação na matéria jogando o questionamento ao Divino, enquanto citava uma passagem bíblica.
“As aves têm seus ninhos, as feras seus covis, mas o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça”, disse.
“Quanto mais suntuosa é a igreja, menos fé desperta em seus frequentadores”, completou.
Estas e outras manifestações contrárias auxiliaram na desistência do projeto, que já tinha tudo para acontecer, mesmo contando com pouco apoio financeiro para a construção da nova edificação.
Projeto abandonado
Ao Portal 6, o historiador Daniel Alves explicou que, além do projeto assinado por Oscar Niemeyer, a nova igreja seria transferida para outra região da cidade, o que desagradou ainda mais os fiéis.
“Não teve apoio, os fiéis achavam que não havia necessidade de tirar a catedral do Centro, porque a cidade era muito pequena e seria um gasto à toa”, afirmou.
Outro fator pelo qual o público anapolino não gostou foia forte resistência à proposta arquitetônica, que não seguia os padrões originais.
“Muita gente também era contrária à arquitetura moderna [de Oscar Niemeyer], acharam melhor que mantivesse a tradição, o tempo nos moldes originais, por isso não foi para frente”, finalizou.