Dólar vira para queda e Bolsa oscila com dados dos EUA e conflitos no Oriente Médio
Em dia de agenda esvaziada no Brasil, mercado se voltava à cena externa
O dólar apresenta queda nesta sexta-feira (4), com investidores digerindo os dados de emprego dos Estados Unidos medidos pelo “payroll” (folha de pagamento, em inglês).
Às 15h23, a moeda perdia 0,17%, a R$ 5,465, revertendo os ganhos de mais cedo. Já a Bolsa estava em estabilidade, com leve alta de 0,02%, aos 131.707 pontos.
Em dia de agenda esvaziada no Brasil, o mercado se voltava à cena externa -sobretudo ao relatório de emprego dos EUA e aos temores de uma guerra generalizada no Oriente Médio.
Principal divulgação da semana, o payroll mostrou a abertura de 254 mil vagas em setembro, uma aceleração em relação às 159 mil abertas em agosto. A previsão era de 140 mil postos de trabalho.
Também houve surpresa positiva na taxa de desemprego, que recuou para 4,1%, de 4,2% em agosto.
Assim como os outros relatórios publicados ao longo da semana, o payroll indicou que o mercado de trabalho está, no máximo, passando por um esfriamento gradual e moderado, sem grandes deteriorações.
“O relatório de emprego dos EUA divulgado hoje surpreendeu a todos. Embora os dados divulgados até o momento nesta semana tenham mostrado um mercado de trabalho apertado, não havia garantia de que observaríamos um número tão forte hoje”, disse Eduardo Moutinho, analista de mercados do Ebury Bank.
A atenção dos operadores ao mercado de trabalho americano acompanha a mudança de foco do Fed (Federal Reserve, o banco central dos EUA), que baliza as decisões de política monetária a partir dos dados de emprego e de inflação -dinâmica chamada de “mandato duplo” no jargão econômico.
Nos últimos meses, os indicadores inflacionários têm mostrado uma convergência gradual à meta de 2%, ao passo que os números de emprego estavam desacelerado a cada nova leitura. À luz desse movimento, o Fed fez o primeiro corte nos juros em mais de quatro anos no dia 18 de setembro. A taxa foi reduzida em 0,50 ponto percentual e agora está na faixa de 4,75% e 5%.
A dúvida do mercado, agora, é sobre o ritmo dos próximos cortes. Em discurso na segunda-feira, Jerome Powell, presidente do Fed, disse prever mais duas reduções na taxa de juros, de 0,25 ponto cada, “se a economia tiver o desempenho esperado”.
Os dados benignos desta semana -sobretudo o payroll- selaram apostas de que os próximos afrouxamentos serão, de fato, graduais.
“Para a economia, isso significa que está ocorrendo um pouso suave. Continuamos criando emprego em um ritmo acelerado e a taxa de desemprego está caindo”, disse Ross Mayfield, estrategista de investimentos da Baird.
“Isso significa que é improvável que o Fed corte em 0,50 ponto percentual em novembro ou dezembro, certamente, e talvez até faça uma pausa em novembro.” Com isso, na ferramenta CME FedWatch, a probabilidade de um corte de 0,25 ponto chegou a 99,2%, um raro consenso entre os operadores.
Quanto menores os juros nos EUA, pior para o dólar, que se torna menos atraente conforme os rendimentos dos títulos ligados ao Tesouro norte-americano, os Treasuries, caem.
O movimento, em tese, favorece a moeda americana, por indicar cortes mais graduais. “Mas o grande problema está sendo o Oriente Médio”, diz Paloma Lopes, economista da Valor Investimentos.
“As falas de [Joe] Biden estão repercutindo de forma extremamente negativa, o que faz com o que o mercado fique alvoroçado e o dólar entre em uma situação de extrema vulnerabilidade em relação à cena externa.”
Desde terça-feira, o mundo -e o mercado financeiro- está em alerta para uma possível guerra generalizada na região. O Irã, em retaliação às ofensivas de Tel Aviv contra a Faixa de Gaza e o Líbano, disparou cerca de 200 mísseis contra Israel, em sinal de escalada do conflito.
O presidente dos Estados Unidos ainda afirmou que está em discussões com Israel sobre possíveis ataques contra instalações petrolíferas iranianas. As cotações do petróleo Brent, referência do mercado externo, dispararam mais de 5% na véspera e estendiam os ganhos a 1% nesta sexta.
Há ainda a possibilidade de aumento do diferencial de juros entre o Brasil e os Estados Unidos. Na análise de André Galhardo, consultor econômico da plataforma de transferências internacionais Remessa Online, a perspectiva de cortes menores na taxa americana, somada ao cenário interno, pode levar o BC (Banco Central) brasileiro a “promover uma alta mais contundente na Selic na próxima reunião”;
“Um corte menor nos EUA pode abrir caminho para que o Copom (Comitê de Política Monetária) adote um aumento de 0,50 ponto na Selic, ainda muito amparado por questões técnicas.”
A perspectiva de uma Selic mais alta costuma favorecer o real, ainda que penalize o mercado acionário. Isso porque o aumento do diferencial de juros entre Brasil e Estado Unidos atrai investidores da modalidade “carry trade”, isto é, quando tomam empréstimos a taxas baixas e aplicam esses recursos em moedas de países de taxas baixas.
Ainda na cena doméstica, o otimismo com a decisão da Moody’s de elevar a nota de crédito do Brasil, de Ba2 para Ba1, se dissipou, e temores com as contas públicas voltaram ao foco dos investidores.
Para as outras duas agências de classificação de risco mais relevantes do mundo, a S&P Global e a Fitch, não há fundamentos neste momento para uma nova melhora na nota do Brasil.
Em entrevista à Folha, as agências disseram que uma mudança da nota vai depender da capacidade do governo de estabilizar a dívida pública, algo que elas não enxergam acontecendo agora.