STF reforça postura de autodefesa em reação a críticas sobre condutas de ministros
Tribunal se uniu nos últimos anos para se defender dos ataques feitos pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e por seus aliados

JOSÉ MARQUES
Sob o comando do ministro Luís Roberto Barroso, que assumiu a presidência há um ano, e com Gilmar Mendes como decano (integrante mais antigo), o STF (Supremo Tribunal Federal) reforçou a postura de defesa da corte em polêmicas que envolvem ministros e seus auxiliares.
O tribunal se uniu nos últimos anos para se defender dos ataques feitos pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e por seus aliados. Tanto no período em que ele estava no governo quanto logo após a posse de Lula (PT) em 2023, quando a sede da corte foi destruída em 8 de janeiro.
Mas o tribunal passou a reagir não só contra ataques infundados e a tentativas de desobediência de ordens, marcas desse período mais crítico, mas também a publicações jornalísticas que questionaram atitudes ou comportamentos dos ministros, ou a ameaças do Congresso de promover reformas no tribunal.
Em uma série de ocasiões, o presidente, o decano e outros integrantes da corte se manifestaram por meio de discursos no plenário, entrevistas ou desagravos públicos.
É uma tradição que o membro mais antigo do tribunal faça, em conjunto com o presidente, esse tipo de manifestação em nome dos pares.
Apesar de ter um histórico de enaltecimento da imprensa e de liberdades individuais, Barroso demonstrou em algumas situações incômodo com conteúdos e questionamentos negativos a respeito de condutas dos ministros. Em outras, minimizou episódios que causaram crise à imagem do tribunal.
No primeiro semestre desse ano, o Supremo foi questionado pela participação de ministros em eventos fechados bancados por empresas com ações na corte, pela falta de transparências em agendas, pelas despesas do tribunal e também sobre o rito dos inquéritos tocados pelo ministro Alexandre de Moraes.
Em junho, no programa Roda Viva (TV Cultura), Barroso foi questionado sobre esses temas e sobre a ida do ministro Dias Toffoli à final da Champions League com o empresário Alberto Leite. A agenda não foi divulgada, mas teve a segurança bancada pelo Supremo.
Em resposta, ele disse que via “uma certa implicância” sobre o assunto. “Foi um evento privado, ele foi assistir a um jogo de futebol. Ele escolheu para a vida privada dele assistir a um jogo de futebol. É preciso saber se ele atendeu a algum interesse desse empresário, eu acho que evidentemente não”, afirmou.
Poucas semanas depois, ao fazer um balanço dos trabalhos do primeiro semestre, o presidente do STF fez um parêntese para afirmar que o tribunal é rigoroso com gastos de passagens aéreas, em resposta a publicações que tratavam do tema.
Ao menos em duas ocasiões, Barroso e Gilmar também saíram em defesa do ministro Alexandre de Moraes, em desagravos conjuntos. Outros ministros também fizeram o mesmo.
Uma delas foi após os ataques do empresário Elon Musk, dono da rede social X (antigo Twitter), a determinações de Moraes que envolvem a plataforma.
A segunda foi um dia depois de a Folha de S.Paulo revelar que Moraes usou o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) de maneira informal para investigar bolsonaristas no Supremo.
Barroso chamou o episódio de “tempestade fictícia”, disse que não houve irregularidade na condução dos processos do ministro e afirmou que “o papel da imprensa é divulgar mesmo a notícia que parece interessante ao público”.
Mas acrescentou: “As narrativas equivocadas e as narrativas inverazes, essas nós precisamos enfrentar”.
Leia também
- Pedreiro em Goiânia receberá indenização de R$ 100 mil após tragédia com filho adolescente
- Câmera flagra momento em que presidente da Câmara de Pires do Rio parte para cima de vereador
- Lula exalta soberania e manda recado a Trump e Bolsonaro em pronunciamento do 7/9
- Forças Armadas vão respeitar veredito do STF sobre golpe, diz Múcio
Na ocasião, Gilmar disse “a censura que tem sido dirigida ao ministro Alexandre, na sua grande maioria, parte de setores que buscam enfraquecer a atuação do Judiciário e, em última análise, fragilizar o próprio Estado democrático de Direito”.
Barroso voltou a defender o ministro em entrevista posterior à Folha de S.Paulo. Disse que não viu irregularidades em sua conduta, e Gilmar fez o mesmo ao ser entrevistado pelo Canal Livre, da Band.
A presidente do TSE, Cármen Lúcia, e o ministro Flávio Dino, também saíram a público para defender Moraes.
Em pronunciamento, ela disse que Moraes havia cumprido “enorme papel” quando era presidente do TSE, e Dino pediu aplausos ao colega em evento.
O entorno de Barroso tem lembrado que o papel do presidente é o de preservar o equilíbrio e a união institucional da corte, além de proteger a integridade dos seus membros.
Barroso tomou posse na presidência do Supremo em 28 de setembro do ano passado, sucedendo a ministra Rosa Weber, que se aposentou logo após passar a chefia ao colega. Seu mandato vai até o segundo semestre do ano que vem.
À época, o STF já estava em conflito com o Congresso, acirrado sobretudo por questões que deputados e senadores entendiam como invasão de competências dos parlamentares -como o julgamento do marco temporal e o voto de Rosa, logo antes de se aposentar, sobre descriminalização do aborto.
Em entrevista durante a crise, Gilmar disse ser “estranho que se decida começar a reforma constitucional pelo tribunal”. Ainda falou que parlamentares que criticavam a corte “foram quase que compassivos com as investidas [eleitoreiras] do Bolsonaro em respeito à aprovação de todas as medidas -a PEC Kamikaze, redução do preço de combustíveis, e nós na defensiva o tempo todo”.
Já Barroso questionou a possibilidade de aprovação de uma emenda à Constituição que permita ao Legislativo a derrubada de decisões da corte.
Na semana passada, com o avanço na Câmara de propostas que limitam poderes de ministros do Supremo, Barroso teve que fazer um novo apelo durante a sessão do plenário.
Em manifestação, disse que “não se mexe em instituições que estão funcionando e cumprindo bem a sua missão por injunções dos interesses políticos circunstanciais e dos ciclos eleitorais”.
Como nas outras ocasiões, Gilmar Mendes respondeu. Agradeceu pelo discurso de Barroso, disse que, “se a política voltou a respirar ares de normalidade, isto também se deve à atuação firme do STF”.