Forças de Israel cercam campo de refugiados na Cisjordânia
Segundo autoridades locais, pelo menos 10 pessoas morreram e 40 ficaram feridas até então
IGOR GIELOW
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Em seu segundo dia de operação militar na cidade palestina de Jenin, as forças de Israel cercaram o mais simbólico campo de refugiados da Cisjordânia e um hospital. Até aqui, ao menos 10 pessoas morreram e 40 ficaram feridas, segundo as autoridades locais.
Segundo um líder comunitário do campo de Jenin, que é um bairro degradado que fica no centro da cidade, concentrando quase um terço dos seus 50 mil moradores, o cerco foi finalizado na manhã desta quarta (22).
Ele falou de forma anônima com a reportagem por meio de mensagens de celular. Pela segunda noite, drones e helicópteros israelense sobrevoaram Jenin, e diversas explosões foram ouvidas. Os soldados e policiais do Estado judeu estão espalhados por toda a cidade.
“Ninguém pode entrar ou sai”, disse à agência Reuters Nebal Farsakh, porta-voz do Crescente Vermelho palestino. Ele diz que há mortos e feridos que não foram alcançados ainda por ambulâncias do grupo.
Já o diretor do hospital Khalil Suleiman, que fica perto do campo, disse que o acesso ao prédio foi fechado. “As forças de israel destruíam as ruas em frente ao hospital, colocando o entulho na entrada das ambulâncias”, disse Wissan Bakr.
Esta é uma tática comum, presenciada pela reportagem quando visitou Jenin em setembro passado. As Forças de Defesa de Israel dizem que estão atrás de explosivos improvisados à beira das estradas e ruas, e eles existem, mas na prática destroem todas as vias.
A ação faz parte do novo objetivo militar do gabinete de segurança do governo de Binyamin Netanyahu, algo visto amplamente como uma concessão do premiê aos setores de ultradireita religiosa que o apoiam, mas estão insatisfeitos com o cessar-fogo na guerra contra o Hamas na Faixa de Gaza.
Iniciada no domingo (19) com a troca de três reféns feitas pelo grupo terrorista palestino no mega-ataque de 7 de outubro de 2023 por 90 prisioneiros árabes em Israel, a trégua é escalonada em etapas.
Um prócer da ultradireita, Itamar Ben-Gvir, deixou o governo, mas não o apoio ao premiê. O principal nome da facção no gabinete agoa é Bezalel Smotrich, o ministro das Finanças cuja permanência no cargo agora parece claramente associada à operação na Cisjordânia.
A ultradireita apoia e financia os assentamentos ilegais de colonos judeus em regiões que, segundo os acordos de paz de 1994, deveriam ser palestinas. Impotente, o governo de Ramallah agora vê a expansão da tática com apoio do Exército. Já seus críticos lembram que as autoridades nada fizeram para coibir a operação de terroristas na região.
A ação é focada em Jenin, que concentra células de grupos terroristas como a Jihad Islâmica, mas ocorre em todo o território nominalmente palestino. Segundo a agência árabe Wafa, 29 pessoas foram presas nesta quarta em diversos pontos da região.
O prefeito de Jenin, Mohammad Jarar, disse à Wafa que o Exército de Israel está pedindo para que moradores deixem bairros da cidade. Um porta-voz militar israelense, Nadav Shoshani, negou isso.
Ele repete a justificativa formal para a operação, que parece maior em escopo do que outras que se repetem periodicamente na região. “Nós aprendemos com o 7 de Outubro. Não vamos deixar grupos terroristas se reagrupar ou rearmar”, disse.
Smotrich celebra a vitória de sua posição. “Depois de Gaza e do Líbano [onde Israel trucidou a chefia do Hezbollah], nós começamos a mudar o conceito de segurança na Judeia e na Samaria. Vamos erradicar o terrorismo na região”, afirmou, usando os nomes bíblicos empregados por Israel para denominar a Cisjordânia.
Segundo relatos na imprensa de Israel, o acerto entre ele e Netanyahu inclui o desrespeito ao cessar-fogo assim que os reféns israelenses forem todos soltos. A fase seguinte supõe algum tipo de governança palestina em Gaza, e também é incerto que o Hamas topará trabalhar com a Autoridade Nacional que rege a Cisjordânia.
Com isso, o caldo para ambos os lados se acusarem está colocado. Esquentou a mistura a avaliação do novo presidente americano, Donald Trump, de que o cessar-fogo não parece sustentável. O republicano foi o fiador do acordo, pressionando Netanyahu a fechá-lo em tempo de sua posse, na segunda (20).