1 de 8 cidades deve perder recursos federais com recontagem da população
Em reação, prefeitos das cidades que vão perder recursos estão se mobilizando contra o uso dos novos dados do IBGE
Neste ano, uma a cada oito cidades deve perder recursos -no total, R$ 3 bilhões. Por outro lado, um grupo menor de prefeituras vai receber mais. Calculado pelo TCU (Tribunal de Contas da União) com base em dados do IBGE, o FPM é uma das principais fontes de receita dos municípios pequenos.
O QUE MUDA NA DISTRIBUIÇÃO DO FPM EM 2023:
702 cidades caíram de porte e vão receber menos recursos;
331 cidades subiram de porte e vão receber mais;
as demais 4.537 cidades devem continuar recebendo como nos anos anteriores – a maioria delas também é menor do se estimava, mas se manteve na mesma faixa populacional, não impactando os repasses, que são feitos por porte da cidade e não pelo número de habitantes.
CIDADES CONTESTAM O USO DA PRÉVIA DO CENSO 2022
Em reação, prefeitos das cidades que vão perder recursos estão se mobilizando contra o uso dos novos dados do IBGE. A orientação da Confederação Nacional dos Municípios é que ingressem com ações na Justiça Federal.
O objetivo é que o governo federal desconsidere a prévia do Censo 2022, uma vez que o recenseamento não foi concluído -a previsão é que isso ocorra até janeiro, com divulgação em março.
Os dados estão defasados porque a União não cumpre a lei. Deveria ter feito o Censo em 2020 e, ainda antes, uma recontagem da população em 2015. Mas não fez nenhum dos dois”Paulo Ziulkoski, presidente da Confederação Nacional dos Municípios
Em 2023, o FPM vai dividir R$ 188 bilhões entre as cidades brasileiras. A primeira parcela está programada para ser paga na próxima semana, em 10 de janeiro.
O TCU, que estabelece quanto cada cidade vai receber do FPM, afirmou que vai avaliar eventuais questionamentos dos prefeitos sobre o cálculo da distribuição, mas não em relação aos dados do IBGE. Não ficou claro se pode ser revisto o uso da prévia do Censo 2022. O Tesouro, que paga o recurso, não se manifestou até a publicação desta reportagem.
Municípios estão falando em entrar na Justiça para questionar os dados do IBGE, mas não há o que fazer. Os dados mostram a mudança estrutural pela qual o Brasil vem passando e isso é irreversível. Gestores públicos têm que colocar na cabeça que a população não vai crescer infinitamente. Não adianta contar com isso para aumentar a cota no FPM”Ricardo Ojima, professor de demografia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte
A CIDADE QUE MAIS VAI PERDER:
Ipixuna do Pará (PA) tinha uma população estimada em 62 mil habitantes, em 2018. Já a prévia do Censo 2022 atualizou o número para 29 mil habitantes. Com isso, a cidade pode receber 70% menos do FPM.
Ipixuna do Pará tem quase 11 mil alunos no ensino básico. É impossível que quase metade da população seja de estudantes. O FPM é a segunda principal fonte de receita da cidade. O corte vai impactar o pagamento de funcionários e fornecedores”Isaac Farias, procurador-geral de Ipixuna do Pará
A TERCEIRA CIDADE QUE MAIS VAI GANHAR:
Extremoz (RN) tinha uma população estimada em 28 mil habitantes, em 2018. Mas o ajuste da população elevou o número para 61 mil habitantes em 2022. Isso pode fazer o recurso do FPM aumentar cerca de 70%.
Devido a esse atraso no Censo, nós vínhamos passando por grandes dificuldades. Por conta de programas habitacionais, Extremoz teve um crescimento exorbitante nos últimos anos, mas a arrecadação não acompanhou isso. O governo federal precisa rever esses valores que ficaram para trás”Jussara Sales (Pros-RN), prefeita de Extremoz
COMO É FEITA A DISTRIBUIÇÃO DOS RECURSOS FEDERAIS
A divisão dos recursos do FPM se baseia em dados do IBGE. Como a população só é recenseada a cada dez anos, entre um censo e outro o órgão estatístico faz estimativas considerando o último dado disponível.
Essas estimativas são imperfeitas, porque desconsideram mudanças que podem ter acontecido entre um censo e outro -por exemplo, uma cidade pequena que cresce muito devido à instalação de uma grande fábrica ou mesmo a pandemia de covid-19.
No caso das estimativas mais recentes, os problemas são ainda maiores. O ideal é que haja uma recontagem da população no meio da década para calibrar os cálculos – o que não ocorreu em 2015. Além disso, o censo começou com dois anos de atraso – deveria ter ocorrido em 2020.
Até o ano passado, o FPM foi distribuído usando como parâmetro a estimativa da população feita pelo IBGE em 2018 -a partir de dados com oito anos de defasagem, do censo de 2010. Era esperado, portanto, que essas estimativas tivessem muitas divergências da realidade.
Já neste ano, o IBGE pretendia mandar para o TCU o resultado final do Censo 2022 -extremamente preciso, porque conta toda a população em vez de fazer estimativas. Mas a conclusão do recenseamento foi adiada para março de 2023.
Por isso, o IBGE optou por usar as informações coletadas pelo censo até o final do ano passado (179 milhões de pessoas, o que equivale a 86% do total estimado) e realizar operações estatísticas para estimar o restante. O resultado é a prévia do Censo 2022.
No geral, a prévia do Censo 2022 é muito mais precisa do que as estimativas anteriores. Ainda assim, não é o resultado final.
O IBGE, porém, acredita que os dados das cidades com até 170 mil habitantes (que ficam com mais de 80% do FPM) vão mudar pouco na versão final do Censo 2022, porque nesses locais o recenseamento está mais avançado. É nas grandes cidades, como São Paulo, que o censo está mais atrasado.
O IBGE diz também que as cidades podem entrar em contato diretamente com o órgão para pedir revisão dos dados.
Os recenseadores do IBGE continuam em campo. Quem não foi recenseado, pode ligar para o Disque-Censo (137), de forma gratuita, e agendar um horário para a entrevista.