FABIO VICTOR
Braço direito do general Walter Braga Netto e alvo de mandados de busca e apreensão na operação que prendeu o ex-ministro, o coronel da reserva Flávio Botelho Peregrino é apontado por integrantes da atual cúpula do Exército como responsável por espalhar desinformação entre a militância bolsonarista para difamar generais que rejeitaram aderir a intentos golpistas para impedir a posse do presidente Lula.
Reservadamente, oficiais do Quartel-General do Exército afirmam que Peregrino era um dos informantes do comentarista e influenciador bolsonarista Paulo Figueiredo Filho nas investidas contra membros do Alto Comando da força terrestre.
Neto do último ditador do regime militar, João Batista Figueiredo (1918-1999), Paulo Figueiredo Filho foi comentarista da rádio Jovem Pan. Durante o intervalo entre a vitória e a posse de Lula, ajudou a espalhar entre bolsonaristas a versão de que “generais melancia” – verdes por fora, pela cor da farda do Exército, e vermelhos por dentro, ou seja, progressistas – ignoraram os apelos por uma intervenção militar para manter Bolsonaro no poder, apesar da derrota eleitoral.
Figueiredo Filho foi um dos indiciados pela Polícia Federal na investigação sobre a trama golpista para barrar a posse de Lula. Ele leu na Jovem Pan um manifesto golpista de oficiais da ativa e usou a rádio para atacar os “generais melancia”.
Os alvos mais constantes do comentarista eram os generais Tomás Paiva (atual comandante do Exército), Richard Nunes (chefe do Estado-Maior do Exército), Valério Stumpf, Fernando Soares e Marco Antonio Freire Gomes. Os três últimos já passaram à reserva, mas, na época, integravam o Alto Comando do Exército – Freire Gomes era o comandante da corporação.
Embora a tese de que resistiram a um golpe lhes seja positiva, todos rejeitam a versão difundida por Figueiredo de que havia uma cisão no Alto Comando, bem como a ideia de que tenham simpatias esquerdistas: alegam que todo o colegiado estava unido em respeito à Constituição.
Segundo a delação do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, pelo menos um integrante do Alto Comando teria se mostrado disposto a aderir a uma ruptura institucional, o general Estevam Teophilo – que nega a acusação.
Um aspecto não vocalizado pelos generais de quatro estrelas, mas apontado como obstáculo natural a uma aventura golpista, é a falta de apoio externo (sobretudo dos EUA). O descontentamento de integrantes do Alto Comando do Exército com a condução do processo eleitoral (muitos no colegiado consideravam a Justiça Eleitoral enviesada contra Bolsonaro) e com o resultado das urnas não era suficiente para uma virada de mesa.
Procurado, o coronel Flávio Peregrino disse, num primeiro momento, que não se manifestaria. Depois que a reportagem foi publicada, mudou de ideia e afirmou que a acusação é “leviana e se aproveita do anonimato da fonte”. Disse que nunca falou com Paulo Figueiredo Filho e que nem tem o contato dele.
“Tenho mais de 34 anos de serviço no Exército e reconhecidamente fiz uma trajetória exemplar e sem máculas, o que é comprovado por subordinados, pares e superiores ao longo de toda minha carreira”, declarou.
Em mais um lance do “jogo de empurra” entre os militares investigados pela trama golpista, a versão que Peregrino tem difundido sobre isso com interlocutores é de que o elo de Figueiredo no governo passado era o tenente-coronel Mauro Cid.
Apesar de ter sido alvo de busca e apreensão, Peregrino não foi indiciado nem citado oficialmente entre os investigados no inquérito das tramas golpistas.