Universidade Estadual de Goiás: Uma nau à deriva
Portal 6 publica artigo do professor doutor Francisco Alberto Severo de Almeida neste domingo (16)
A UEG está à deriva, desde a renúncia do reitor Haroldo Reimer, eleito para quadriênio 2016-2020, acusado de improbidade administrativa por uso de recursos do Pronatec. Na ocasião, a assunção do pró-reitor de Pesquisa e Pós-graduação como Reitor interino se dá em meio a uma reforma administrativa realizada pelo Governador Ronaldo Caiado. Momento em que a Universidade é compelida a apresentar uma reestruturação organizacional, visando, principalmente, uma redução de custeio da sua máquina administrativa, em decorrência da crise fiscal do Estado que gerou um forte impacto no Orçamentária Geral do Estado. Cabe, aqui, destacar, que após várias tratativas do Reitor interino em promover uma reforma administrativa interna, sem sucesso, renuncia ao cargo. Então, acontece o processo de intervenção administrativa por parte do Governo do Estado na Universidade, com objetivo de promover as referidas mudanças desejadas pelo Governo.
O Reitor Interino Interventor, oriundo da carreira de procuradores do Estado, elabora com aval da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação, nova proposta de estrutura orgânica da Universidade que foi aprovada pela Lei nº 20.748, de 17 de janeiro de 2020, a qual traz em seu bojo uma ampla reestruturação administrativa da Universidade Estadual de Goiás. Cujas premissas básicas podem ser resumidas em três pontos:
a) reforma acadêmica e pedagógica;
b) novo modelo de governança e gestão; e
c) redução do custeio da máquina administrativa.
Esta reforma estabelece um novo paradigma de gestão ao buscar implementar um novo modelo de governança e gerenciamento para Universidade Estadual de Goiás. Promove a reestruturação organizacional mediante o reagrupamento e transformação dos 41 Campus existente, em 8 Campus Regionais –Sede, e a subordinação hierárquica dos demais 33 Unidades Universitárias (antigo campus) a um determinado Campus Regional-sede, de acordo com a sua situação geográfica. Associado a esta mudança organizacional está a criação de 5 Institutos Acadêmicos por área de conhecimento. Cabe ressaltar que não houve a participação direta da comunidade acadêmica da Universidade, neste processo de reestruturação. Todavia, coube, aos membros da Universidade, tomar o conhecimento das mudanças quando da implementação da reestruturação.
A partir deste cenário, observou-se que a implementação desse novo modelo de governança e gestão trouxe, sem sombra de dúvidas, uma série de conflitos e indefinições quanto ao processo de tomada de decisão nos diversos níveis de gestão. Neste sentido, observa-se, ainda de forma primária, que a centralização das decisões de gestão operacional e administrativa dos cursos nos campus regionais e a gestão acadêmica e pedagógica nos Institutos por área de conhecimento, traz evidências de certo grau de conflito e insegurança na tomada de decisões por parte dos coordenadores de cursos das Unidades Universitárias.
O custeio da máquina administrativa ficou restrito a reestruturação dos cargos comissionados da estrutura básica, complementar e a FCAES- Função Comissionada de administração do Ensino Superior. Por outro lado, cabe ainda pontuar a decisão da Reitoria Interina Interventora em governar a Instituição por medidas de Resolução ad referendum, sem consulta ao Conselho Superior Universitário ou de participação da comunidade acadêmica, em decisões monocráticas e burocráticas sob argumento da moralidade, legalidade e impessoalidade. Desta forma, Reitor Interino Interventor legisla sobre o novo modelo de vestibular impondo uma redução linear de vagas; implementa um processo seletivo professores substitutos, considerando a centralização dos docentes por áreas de conhecimentos dos Institutos; impõe mudanças a atividade docente em relação ao contexto do seu desempenho acadêmico em temas há muito tempo pacificados pela comunidade acadêmica.
Neste sentido, cabe-nos, agora, fazer uma análise reflexiva sobre os caminhos a serem pautados pela Universidade. Primeiro lugar, quero retratar que no decorrer destes vinte anos de existência a UEG teve uma série de reestruturações administrativa, todas emanadas de cima para baixo, sob a perspectiva de reforma administrativa do Estado. A Universidade se ajustou às mudanças realizadas. Esta nova reestruturação orgânica não será diferente, o corpo docente e administrativo se adaptará a nova realidade organização. Todavia, cabe ressaltar, a temeridade de se implementar mudanças organizacionais, acadêmicas e administrativas de longo prazo sob a égide de uma Reitoria Interina, mesmo que transitória, a qual não dispõe de um norte de políticas e diretrizes claras e objetivas para o desenvolvimento institucional da Instituição. Não se fala aqui de ações de curto prazo, como a propalada abertura de edital para vagas remanescentes como uma ação efetiva e de repercussão para atender a demanda social por vagas em uma Instituição Pública de Ensino Superior. Isto só demonstra que o corpo diretivo da Universidade não tem políticas e diretrizes estratégicas de longo e médio prazo para cumprir sua missão Institucional. A nau está à deriva!
Uso da metáfora nau à deriva é uma referência a navegação das caravelas quando ficavam sem rumo, navegando na calmaria, e dependente dos ventos elísios para impulsionar suas naves a travessia oceânica. Assim se encontra a UEG. Está amorfa a pandemia do Covid 19, aguardando novos ventos que possam impulsioná-la para um novo horizonte. Este fenômeno exógeno também tem servido de pretexto para a inercia e inação da governança dos gestores da Universidade.
Estamos acerca de mais de 18 meses em letargia gerencial, gestada a partir das renuncias do reitor titular e do interino, por ele indicado, o que ocasionou a intervenção do governo do Estado na Universidade. Neste sentido, é preciso uma mudança de rumo e de ajuste da bussola da governança. A Universidade para cumprir sua missão Institucional precisa estabelecer um Plano Estratégico, no mínimo decenal, com vista a instituir políticas e diretrizes de longo e médio prazos voltadas para sua atividade fim de formação acadêmica de graduação e pós graduação nas diversas áreas do conhecimento; no desenvolvimento de pesquisas científicas em inovação e tecnologias e , também, ampliar seu papel comunitário mediante as ações de extensão universitária. Precisamos combater nosso paradoxo administrativo: ensinamos e formamos gestores com as melhores e modernas técnicas administrativas, porém não a aplicamos de forma profissional na Universidade. Somos gestores jurássicos, burocráticos e miméticos com visão de curto prazo!
Há, portanto, vários fatores políticos e administrativos que merecem um estudo a parte para entender o fenômeno da reforma administrativa e a sua complexidade. Evidente, que não é escopo deste artigo. Entretanto, buscou-se desenhar o atual estágio de letargia de governança que se encontra a Universidade. Neste sentido, é importante ressaltar que precisamos de um timoneiro eleito pela comunidade, não dá para esperar a mudança dos ventos, sob a égide da transitoriedade temporária e interina.
O futuro nos aguarda, para tanto precisamos de estratégias de longo e médio prazo para Universidade Estadual de Goiás cumprir à sua missão Institucional de fomentar o desenvolvimento regional e promover a interiorização do Ensino Superior no Estado, como forma a ampliar as oportunidades de emprego e renda para uma classe social desassistida dos municípios goianos.
Francisco Alberto Severo de Almeida é professor da UEG, doutor em Administração pela FEA/USP e pós-doutor em Gestão da Informação pela Universidade do Porto- Portugal. Membro eleito do Conselho Universitário da UEG