DANI AVELAR
A promulgação de leis contra pessoas transexuais nos Estados Unidos tem aumentado o risco de suicídio entre jovens. É o que diz um estudo feito a partir de entrevistas com mais de 60 mil pessoas trans de 13 a 24 anos de idade em todos os 50 estados americanos.
Nos últimos anos, tem crescido –tanto nos EUA como no Brasil– o número de legislações que buscam cercear direitos da população trans. Algumas leis vetam discussões sobre identidade de gênero na sala de aula, enquanto outras proíbem o acesso de pessoas trans a banheiros, competições esportivas e serviços de saúde.
Agora, a pesquisa publicada na revista acadêmica Nature Human Behaviour joga luz sobre os efeitos dessa ofensiva legislativa na saúde mental dos membros de uma das parcelas mais marginalizadas da comunidade LGBTQIA+.
O estudo, lançado no final de setembro, identificou que a aprovação de leis estaduais antitrans nos EUA aumentou em até 72% as tentativas de suicídio entre jovens transgêneros e não binários. Os efeitos foram mais agudos entre adolescentes de 13 a 17 anos.
“Nossa análise demonstra uma clara associação entre a promulgação de leis antitrans e o aumento das taxas de tentativas de suicídio entre jovens transgêneros e não binários nos estados analisados”, diz Ronita Nath, vice-presidente de Pesquisa da The Trevor Project, ONG que trabalha pela prevenção do suicídio entre pessoas LGBTQIA+ nos EUA. Os autores da pesquisa são membros da entidade.
“Esse achado indica que a exposição às leis antitrans tem um impacto negativo na saúde mental dos jovens transgêneros e não binários, levando a um aumento nas tentativas de suicídio, independentemente das taxas de base em qualquer estado específico”, afirma.
Em estados onde leis antitrans têm avançado de forma mais intensa, como Texas e Flórida, há relatos de famílias que se mudaram para outras partes do país a fim de proteger seus filhos da discriminação.
Os ataques à população trans viraram também tema das eleições nos EUA. De acordo com o jornal The New York Times, a campanha do Partido Republicano gastou mais de US$ 65 milhões (aproximadamente R$ 370 milhões) em anúncios televisivos de teor antitrans.
No Brasil, há pelo menos 77 leis municipais e estaduais antitrans em 18 unidades da federação, de acordo com levantamento da Folha de S. Paulo publicado em janeiro. Mais de um terço entrou em vigor no ano passado.
Proponentes dessas leis negam que elas tenham caráter antitrans, afirmando que ajudam a proteger os direitos de crianças e mulheres e a resguardar a liberdade religiosa. Por outro lado, especialistas dizem que essas normas promovem a institucionalização da transfobia.
“Políticas antitrans impedem o acesso à cidadania, à própria humanidade e dignidade”, afirma Vincent Pereira Goulart, doutorando em Psicologia Social e Institucional pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. “Ao serem entendidas como inimigas, pessoas trans acabam isoladas e marginalizadas.”
De acordo com Goulart, as tentativas de suicídio entre pessoas trans têm relação com o abandono familiar e com a falta de acesso a direitos básicos. “Prevenção de suicídio é minar a pobreza, é dar condições dignas de vida, é saúde e educação de qualidade, moradia, trabalho digno e acesso à cidadania”, diz.