Miga, você não é louca! Entenda e liberte-se do gaslighting

Carlos Henrique Carlos Henrique -
Miga, você não é louca! Entenda e liberte-se do gaslighting

“Você está errada, você nunca lembra das coisas direito, você é muito confusa.”

“Ah, você é louca, quem é que vai acreditar em você?”

“Você não vai conseguir, você é toda atrapalhada.”

“Você está maluca – isso nunca aconteceu”.

Qual mulher dentro de um relacionamento não se sentiu compelida a pedir desculpas para seu companheiro afim de “fazer as pazes” mesmo quando ela não fez nada de errado? Qual mulher em algum ponto de sua vida não ouviu que é “louca”, “descontrolada”, “emocionalmente instável”? Qual mulher quando tentou argumentar no trabalho, no relacionamento ou na vida acadêmica e simplesmente por se expressar de forma incisiva e assertiva não ouviu que deveria “ser mais controlada”?

Se você como mulher em algum momento da sua história já passou por algo semelhante e/ou se vê presa nos adjetivos que ouve sobre si mesma ou se você como homem tem por hábito achar que toda mulher é “louca” e usa este adjetivo exaustivamente então este texto foi escrito especialmente para vocês (mas muito mais para as mulheres, sorry).

O termo Gaslighting  (em alguns lugares gaslight) vem de 1938, da peça Gas Light (luz a gás), em que um marido tenta deixar sua mulher louca diminuindo todas as luzes (que funcionavam a gás) da sua casa e então negando que a luz tenha mudado quando a sua esposa diz que notou algo diferente. Quanto mais ela diz que as luzes estão mudadas  mais ele diz que tudo é imaginação até o ponto em que ela começa a duvidar da própria sanidade. Mais tarde, em 1944, esta peça se tornou um filme pelo qual Ingrid Bergman ganhou o Oscar de melhor atriz ao interpretar a esposa atormentada. (Tem no youtube com o título “A Meia Luz”).

Hoje em dia, para a psicologia, gaslighting é uma forma de abuso psicológico no qual informações são distorcidas, seletivamente omitidas para favorecer o abusador ou simplesmente inventadas com a intenção de fazer a vítima duvidar de sua própria memória, percepção e sanidade. É o típico caso onde a mulher vê a mensagem de traição no celular do marido mas ele insiste tanto que aquilo não é nada, que ela é louca, que ela é uma ciumenta patológica que no final das contas a pobre acaba por pedir desculpas e implorar para que o honesto companheiro perdoe seu “descontrole”

A prática  contínua do gaslight faz com que a mulher passe a achar que ela é um problema, que ela é a culpada das agressões verbais (e muitas vezes físicas) que recebe, que ela é a culpada das traições e o pior: que não há saída para tal situação, que mesmo tendo estudo, profissão, emprego ao sair deste relacionamento ela estaria completamente incapaz de seguir sua vida adiante. Esta forma de relacionamento abusivo explica porque mulheres completamente independentes financeiramente continuam em relacionamentos absolutamente destrutivos e tóxicos.

Duas das formas mais comuns de gaslighting são o bloqueio quando o parceiro abusivo muda questiona os pensamentos da vítima com frases como  “Quem te deu essa ideia?” ou “Isso é coisa da sua cabeça, você está louca” e a banalização quando por pior que seja o fato ocorrido o parceiro abusivo faz as necessidades ou ou sentimentos da vítima parecerem sem importância. Tipo: “Nossa, você reclama a toa demais!” (ainda que seja após ter descoberto uma traição)

Relacionamentos com gaslighting são graduais porque nenhuma forma de abuso começa com 100% de força. Para se livrar disso é importante reconhecer que existe tal prática e reaprender a confiar em si mesma. O psicanalista Robin Stern listou alguns sinais de que a mulher está sendo vítima de gaslighting, se você marcar mais de 3, pode começar a ficar muito preocupada.

Você duvida de si mesma constantemente;

Você constantemente se sente confusa ou até mesmo maluca;

Você está sempre pedindo desculpas ao seu parceiro;

Você frequentemente cria desculpas para justificar o comportamento do seu parceiro para seus amigos e sua família (ou até para si mesma);

Você começa a esconder informações dos seus amigos e da sua família para que não tenha que explicá-las ou inventar desculpas;

Você sabe que algo está muito errado, mas nunca consegue expressar exatamente o que, nem para si mesma.

Você tem dificuldade para tomar decisões fáceis;

Você sente que não consegue fazer nada certo;

Você se pergunta se uma parceira “boa o suficiente”.

Para você homem que lê este texto e que usa o argumento “louca” em qualquer ocasião para atingir uma mulher, pare já de propagar esta forma horrenda de desrespeito e abuso.

Para você mulher que se viu neste texto eu quero deixar bem claro que a culpa não é sua, mulheres não tem culpa do descontrole, da agressão, da traição e do desrespeito de seus namorados, maridos, companheiros. Basta você pensar: Ele faria o mesmo com um Juiz Federal? Não, né?. Faz com você porque já aprendeu que é uma forma de exercer o controle ao colocá-la como culpada de tudo dentro do relacionamento.

Você não é culpada e não merece ser desnorteada pelo gaslighting mas o caminho de volta não é fácil. Fale com quem possa te apoiar, procure apoio profissional, leia sobre empoderamento feminino, se  redescubra, se encontre, se aceite, resgate sua auto-estima e se empodere.

Você não é louca, miga, você é linda!

Eva Cordeiro é economista e professora universitária. Escreve todas as terças-feiras

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