Por que o preço da gasolina cai e o diesel continua caro?

Preços finais da gasolina no país também vêm sendo fortemente impactados pelo corte das alíquotas de ICMS sobre os combustíveis

Folhapress Folhapress -
Vista de preços dos combustíveis em posto na rodovia Anchieta, em São Paulo. (Foto: Rivaldo Gomes/Folhapress)

LEONARDO VIECELI (RIO DE JANEIRO, RJ) – Em meio ao corte de impostos às vésperas das eleições, o preço da gasolina passou a cair no Brasil. O movimento, contudo, não foi acompanhado no mesmo ritmo pelo óleo diesel, que seguiu acima dos R$ 7 nas bombas dos postos.

A diferença, dizem analistas, está associada a uma combinação de fatores. A gasolina sentiu mais o recente corte de ICMS (imposto estadual), enquanto o diesel é afetado por um descompasso entre oferta e demanda no mercado internacional.

Refinarias e ICMS Na segunda metade de julho, a Petrobras anunciou duas baixas em sequência no preço da gasolina nas refinarias. A política da estatal leva em consideração os valores de referência no mercado internacional.

Os preços finais da gasolina no país também vêm sendo fortemente impactados pelo corte das alíquotas de ICMS sobre os combustíveis. A lei foi sancionada em junho, às vésperas das eleições, pelo presidente Jair Bolsonaro (PL).

O litro do combustível nos postos brasileiros caiu 2,5% somente na semana passada, para R$ 5,74, conforme pesquisa da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis).

Foi o quinto recuo consecutivo nas bombas. A queda acumulada no período chegou a 22,3% -ou R$ 1,65 por litro.
O diesel, por outro lado, não passou por redução nas refinarias da Petrobras, em um reflexo da pressão internacional mantida sobre os preços.

Além disso, o valor final do combustível no Brasil sentiu menos o recente corte de ICMS porque a maior parte dos estados já cobrava alíquotas menores do que o teto estabelecido pela nova lei.

Na semana passada, o preço médio do diesel nos postos recuou só 0,3%, para R$ 7,42, de acordo com a ANP. A queda nas últimas cinco semanas chegou a apenas 2% -ou R$ 0,15 por litro.

Descompasso entre oferta e demanda De 25% a 30% do diesel consumido no país costuma ser importado, dizem analistas. A pressão sobre os preços está associada aos efeitos da Guerra da Ucrânia.

A partir do conflito, houve entraves para exportações da Rússia. Em meio ao clima de tensão, o país de Vladimir Putin também chegou a cortar o fornecimento para a Europa de gás natural, fonte de energia para aquecimento de casas e operação de indústrias.

O substituto nesse caso é justamente o diesel. A situação estimula a procura pelo combustível e pressiona os preços antes do inverno no hemisfério norte.

“Um fator determinante daqui para frente será a intensidade do inverno europeu. Estamos vendo um estoque para o inverno”, aponta o consultor David Zylbersztajn, ex-diretor da ANP.

Outros riscos no cenário externo, segundo analistas, vêm da temporada de furacões nos Estados Unidos.
Tendência de preços altos no restante do ano O diretor de Comercialização e Logística da Petrobras, Cláudio Mastella, disse na sexta-feira (29) não esperar queda no diesel até o fim do ano, diante de problemas na oferta e proximidade do inverno no hemisfério norte.

“Vemos um cenário de manutenção dos preços dos derivados parecidos com os atuais, em especial no caso do diesel, que tem um impacto da aproximação do inverno no hemisfério norte”, disse o executivo.

“A expectativa é que o diesel fique nesse cenário ou até mais forte, a menos que se confirme expectativa de grande recessão global”, completou.

Analistas vão na mesma linha. “O preço do diesel deve continuar em patamar elevado. A tendência é de permanecer acima da gasolina”, projeta João Luiz Zuñeda, sócio-fundador da consultoria MaxiQuim.

Aurélio Amaral, ex-diretor da ANP e sócio do Schmidt Valois Advogados, avalia que um fator adicional de pressão sobre os preços no segundo semestre é o escoamento da safra agrícola no Brasil.

“A gente entra em um processo de alta demanda por diesel em razão da safra. Os caminhões vão e voltam em regiões como o Centro-Oeste”, indica.

“Ainda não temos um cenário de desabastecimento, mas a pressão é grande. A tendência é de preços ainda altos”, completa.

Dor de cabeça para Bolsonaro O diesel joga contra a estratégia do governo federal de baixar os combustíveis às vésperas das eleições. A carestia do produto causa descontentamento entre caminhoneiros, que vêm criticando Bolsonaro e a Petrobras.

Nesta terça-feira (2), o presidente afirmou que o diesel pode cair, apesar de a estatal ter apontado para a direção contrária na semana passada.

“O Brent ontem lá fora caiu na casa dos US$ 100. É sinalizador que você pode diminuir novamente o combustível na Petrobras, quem sabe o diesel. Isso não é bola de cristal. Se o dólar cai, a tendência é cair também”, disse Bolsonaro em entrevista à Rádio Guaíba.

Impacto sobre alimentos e passagens de ônibus Usado no transporte de itens diversos, incluindo os alimentos, o óleo diesel costuma gerar reflexos indiretos sobre a inflação para o consumidor final. O preço alto também impacta o transporte de passageiros de ônibus.

“Existe forte tendência de aumento do preço do diesel no mercado internacional”, diz Sergio Araújo, presidente da Abicom (Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis). “A oferta está muito restrita, e tem expectativa de aumento da demanda.”

Ele afirma que não acredita em desabastecimento de diesel no Brasil, mas vê chance de dificuldades de suprimento em locais mais afastados de refinarias e portos.

A ANP deve definir na sexta-feira (5) se aumenta ou não os estoques obrigatórios do combustível no país entre setembro e novembro. A medida em análise seria uma tentativa de afastar o risco de desabastecimento, mas parte do mercado teme alta dos custos logísticos.

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