Entenda o porquê de tanta clandestinidade em centros de reabilitação em Goiás

Casos chocantes são revelados frequentemente no estado, com vítimas relatando crimes tenebrosos

Maria Luiza Valeriano Maria Luiza Valeriano -
Entenda o porquê de tanta clandestinidade em centros de reabilitação em Goiás
Clínica de reabilitação clandestina, em Anápolis. (Foto: Divulgação/ PC)

No último mês, Goiás presenciou cenas de horror diante da revelação do que ocorreu dentro de uma clínica de reabilitação clandestina no Parque Residencial das Flores, em Anápolis. Cárcere privado e maus-tratos são apenas algumas das violências físicas e psicológicas sofridas pelas 15 vítimas encontradas. Nesta quinta-feira (1º), um líder religioso foi preso em Aparecida de Goiânia, após manter várias instituições no estado de Goiás

Diante de tantos casos repetidos, o Portal 6 buscou especialistas que explicaram o que causa a ocorrência desse tipo de instalação e as consequências da internação para os pacientes.

À reportagem, Caroline Santos – presidente da Comissão de Bioética e Biodireito do Conselho Federal da OAB e membro da Comissão de Direito Médico da OAB, seccional Goiás – apontou que uma série de fatores contribuem para o surgimento constante das clínicas ilegais. Entre elas, a própria demanda.

“Às vezes, essas clínicas são mais baratas. Também, podem oferecer ‘benefícios’ que as legais não oferecem, porque não passam por fiscalização”, disse. Saídas para o aniversário e visitas de familiares, contraindicadas a depender da fase da recuperação, são alguns dos “benefícios”.

Uma vez internados, muitas vezes contra a própria vontade, inicia-se o terror. “Estelionato, negligência médica, homicídio culposo, lesão corporal culposa, maus tratos ou abuso do paciente, violação da privacidade, invasão do dispositivo informático, tratamento inadequado de dados sensíveis dos pacientes, manipulação de medicamentos e prescrição ilegal”, exemplificou a advogada.

Agravos à recuperação

Devido ao “tratamento” oferecido, de forma inadequada e regada de violência, em muitos casos, o paciente pode vir a desenvolver uma aversão à reabilitação, pontuou a psiquiatra Amanda Castanheira.

À reportagem, a especialista destacou que devido à falta de fiscalização, as clínicas funcionam como casas de repouso, com profissionais que não possuem capacitação, majoritariamente. A prática adiciona mais um crime à lista: exercício ilegal da medicina.

“Alguns pacientes são colocados nessas clínicas clandestinas sem uma orientação profissional, seja do psiquiatra ou de algum outro médico, e às vezes até de forma involuntária, pela família, naquela ânsia do desespero de proteger. Isso se torna algo também muito traumático, onde além de o paciente não ser tratado da forma como deveria, ele acaba tomando uma aversão muito grande a essa possibilidade de tratamento”, explicou Amanda.

Com isso, é comum que a vítima saia, ainda com a necessidade de ajuda profissional, no entanto, muito mais resistente a qualquer intervenção. O atraso causado, segundo a psiquiatra, pode significar anos de perdas no ambiente familiar e no contexto financeiro e social.

O caminho correto

Amanda destaca que o tratamento deve ser feito com um psiquiatra, assim como uma equipe multidisciplinar, uma vez que a dependência química pode levar a uma série de comorbidades. “Existem diversos acompanhamentos ambulatoriais para esses pacientes, até mesmo os Centros de Atenção Psicossocial (Caps), que são especializados em acompanhamento de álcool e drogas, onde ele vai fazer acompanhamento com o profissional e com uma equipe multidisciplinar, onde tem consultas clínicas, psicólogos, terapias ocupacionais e grupos terapêuticos”.

De acordo com Caroline, para diminuir a ocorrência de clínicas clandestinas, é preciso não só uma maior fiscalização por parte das autoridades, como também compreensão da população de que é necessário buscar as formas legais de tratamento. Caso note atividades ilegais, como documentos falsificados ou ausentes, a advogada reforça que o indivíduo busque denunciar junto ao Ministério Público (MP), à Polícia Civil (PC) e à OAB.

Vale destacar que o Portal 6 buscou dados sobre denúncias de clínicas clandestinas em Goiás junto à PC, que afirmou não possuir levantamento.

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