A eminência parda e os jabutis da reforma administrativa da UEG
Este é o sexto artigo do professor doutor Severo sobre a reforma admnistrativa em implementação
Recordo-me do meu velho e sábio professor Mário Testud, de História no ensino fundamental, na minha época o Ginásio, quando estudei no Colégio Champagnat, da rede Marista, lá pelo idos da década de sessenta, que gostava de citar o filósofo e orador romano Cicero: a História é a mestra da vida!
E complementava com a expressão: quem viver, verá!! Dizia ele que os fatos históricos se repetiam ao longo dos tempos para humanidade, sob perspectivas diferentes porém com um conjunto de elementos pretéritos representativos do passado. Então, no intervalo do ócio produtivo da vida acadêmica passei a fazer uma reflexão sobre esse ensinamento do passado e a realidade presente da gestão da Universidade Estadual de Goiás, no que concerne as mudanças estruturais implementadas pela reforma administrativa do Estado.
Neste interim, veio-me a lembrança, também, quando era estudante universitário e vivíamos sob a égide da ditadura militar e lutávamos pelas Diretas Já!! Mas revivi, também, a grande vitória do MDB, nas eleições de 1974, quando elegeu a maioria dos Governadores dos Estados e constituiu a maioria parlamentar no Congresso Nacional.
Nas eleições de 1978, o Presidente Ernesto Geisel, receando uma nova derrota eleitoral, havia editado no ano anterior o pacote de Abril, com o fechamento do Congresso e um novo regramento eleitoral. Como destaque desse conjunto de medidas estava a eleição indireta de 1/3 dos Senadores, via colégio eleitoral, com a indicação do Presidente da República, os chamados “Senadores biônicos”, forma jocosa de protesto popular. Faz alusão a série de televisão à época: O homem de seis milhões de dólares, cujo ator tinha conjunto de componentes robóticos que o tornava, por assim dizer, um “superhomem”. Mas, o artífice desta reforma foi o poderoso Chefe do Gabinete Civil, General Golbery do Couto e Silva, considerado uma eminência parda do Governo Geisel.
Entenda-se “eminência parda” como um assessor ou um conselheiro que atua nos bastidores para influenciar decisões de Governo.
Aí, após essa reflexão temporal, veio-me a mente a seguinte questão: Quem, na Universidade, atuou como eminência parda para influir na malfadada Reforma Administrativa da UEG? Neste sentido, refresco a minha memória com os ensinamentos do professor Mário Testud e vejo os elementos pretéritos da história da criação dos “Senadores Biônicos “, do pacote de abril de 1974, se repetirem em uma escala menor em relação as medidas de reestruturação da Universidade.
No primeiro ato está a ação do Governo na nomeação de um Interventor Interino, advindo da carreira de procurador do Estado, desconhecedor da realidade acadêmica e administrativa da UEG, para promover uma série de mudanças na estrutura e no funcionamento da Universidade.
No segundo ato, está o pacote de reformas dezembro 2019, sem consulta prévia ao Conselho Universitário vigente à época. O pacote de reformas foi formatado sob o argumento falacioso do gigantismo estrutural da Universidade e da leniência da Comunidade Acadêmica, creio, também, sob a ação invisível de “eminências pardas” da Universidade, em busca de espaço político.
Assim, esta reforma produziu dois jabutis: a criação dos Campus Regionais e os Institutos Acadêmicos por área de conhecimento, cujos resultados não estão sendo bem avaliados.
Trouxe mais conflitos de gestão do que soluções, conforme atesta 67,3% dos respondentes sobre pesquisa referente a reestruturação administrativa. Neste sentido, hoje a governança institucional da Universidade, ainda exercida em caráter de interinidade, tem na sua atual composição o Conselho Universitário com 42 Conselheiros.
Deste total, 28 Conselheiros foram eleitos pela comunidade acadêmica e os outros 14 são representantes da Administração Central: Reitor, 3 pró-reitores e 5 Diretores de Institutos, o Diretor de Gestão Integrada, o Coordenador do CEAR, 1 Representante da Secretaria de Desenvolvimento e Inovação, 1 Representante da FAPEG e 1 Representante da Comunidade convidado pela Reitoria. Contudo, o pacote de dezembro de 2019, trouxe no seu bojo a indicação de 1/3 dos membros do Conselho Universitário, de forma administrativa e por nomeação do Governador: os atuais representantes da Administração Central.
Portanto, podemos assim, então, declarar que 1/3 dos membros do Conselho Universitário são Conselheiros Biônicos.
Não foram eleitos, mas nomeados em um processo de intervenção administrativa. Razão pela qual a comunidade acadêmica clama pelas eleições diretas na Universidade para a Reitoria e demais cargos eletivos de Diretores de Institutos, do CEAR e dos Coordenadores Centrais de Cursos para que possamos estabelecer os novos rumos para UEG.
Por outro lado, cabe, ainda, destacar no pacote de dezembro 2019, da reforma administrativa, a inserção dos seguintes jabutis: a criação dos Institutos Acadêmicos por área de conhecimento e dos Campus Regionais, aos quais subordinam as demais 31 Unidades Universitárias (atual denominação dos antigos Campus).
No jargão legislativo, jabutis são emendas alocadas em projetos com tramitação no Congresso Nacional, de interesse difusos, com vista a atender demandas de determinados segmentos corporativos ou sociais. A expressão popular de que jabuti não sobe em árvore, exprime a desconfiança das pessoas sobre determinado fato observado. Se ele está no galho é porque alguém o colocou lá ou foi levado pela enchente.
Neste contexto, quando se faz a análise do pacote de dezembro 2019, em relação ao Campus Regionais já havia alguns estudos técnicos feitos no âmbito da UEG como sugestão de reestruturação. Mas, entretanto, não havia consenso sobre sua implementação face a perspectiva de elevar a centralização das decisões administrativas e acadêmicas. Todavia, os Institutos Acadêmicos nunca foram objetos de estudos internos. Neste sentido, aqui temos a inserção plena de um jabuti na reforma administrativa da UEG.
Então, as perguntas que não nos deixa calar são: quem colocou o jabuti dos Institutos Acadêmicos na reforma administrativa da UEG? Será obra de alguma ‘eminência parda’ oriunda do seio da Universidade? Estas são perguntas as quais não obtive ainda respostas. Talvez o leitor possa respondê-la.! Agora, peço permissão para findar meu intervalo de ócio produtivo e voltar a lide acadêmica. A vida continua!!! Mas deixo a indagação para a comunidade da UEG: quem é ou quais são a(s) eminência(s) parda(s) oriunda(s) da Universidade que atuou(aram) nos bastidores do poder como conselheiro ad hoc para inserir os jabutis dos Institutos Acadêmicos e dos Campus Regionais na reforma administrativa do pacote de dezembro 2019?
Francisco Alberto Severo de Almeida é professor da UEG, doutor em Administração pela FEA/USP e pós-doutor em Gestão da Informação pela Universidade do Porto- Portugal. Membro eleito do Conselho Universitário da UEG