Pesquisa feita no Brasil ajuda goleiros a defender pênaltis

Segundo paleontólogo, defender cobranças pode ser uma ciência

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Pesquisa feita no Brasil ajuda goleiros a defender pênaltis
O goleiro Jailson, do Palmeiras (Foto: Rubens Cavallari/Folhapress)

Alex Sabino, de SP – Um dos maiores chavões do futebol é que pênalti é loteria. Que ninguém diga isso para uruguaio Richard Fariña. Segundo o paleontólogo, defender cobranças pode ser uma ciência.

“Trata-se de física, de controlar o corpo para conservar o movimento angular. Se o batedor estiver em uma certa posição, há movimentos que não vai conseguir fazer e o goleiro precisa saber disso. São princípios da paleontologia”, afirma.

Ele é um dos autores do estudo “Leitura pelo goleiro da postura do cobrador de pênaltis no futebol masculino e outros fatores na defesa”, publicado em novembro do ano passado pela Revista Brasileira de Ciências do Esporte.

Ele escreveu o texto ao lado do professor de Educação Física Manuel Sequeira e do estatístico Sebastián Vallejo.

Uma das teorias aplicadas é a da lateralidade. A ideia é que, pela postura do corpo, principalmente do tronco do cobrador e do pé de apoio, o goleiro pode saber por antecipação o lado da cobrança do pênalti. A paleontologia, especialidade de Fariña, estuda os seres vivos que habitaram a Terra em um passado remoto.

A lateralidade aparece quando há o predomínio de um lado sobre o outro. Quando a função motora do corpo tem o domínio do lado direito ou esquerdo. A criança, no início da vida, é considerada ambidestra por usar as duas mãos. Com o passar do tempo, um dos lados se torna o preponderante.

“Conhecido em antigos fósseis no passado da evolução humana, a lateralidade é de importância geral na prática de esportes em diferentes formas. (…) Mamíferos mostram preferências laterais de movimentos com performances diferenciais que aparecem cedo na vida dos humanos”, diz a pesquisa publicada.

O estudo prático foi realizado em Santarém, no Pará, com a ajuda de jogadores sub-20 do São Francisco Esporte Clube. O gol foi dividido em 15 regiões. As cobranças foram analisadas por programas que dissecaram cena a cena os movimentos dos batedores, a distância, expressão corporal, tempo e ângulo do chute. Foram medidas as direções da bola, gravados o instante do chute e o início do movimento do goleiro.

Os participantes deram suas impressões sobre o experimento. Na última fase, foram feitas novas finalizações após a análise dos dados ao lado dos goleiros.

Na primeira sessão de cobranças, eles acertaram 28% dos lados escolhidos pelos batedores. Após leitura dos dados obtidos pelos softwares, o índice cresceu para 63%.

“Eu estudo animais antigos que viveram na região [no Uruguai] até 10 mil anos atrás. Estudo muito a biomecânica deles. A mesma biomecânica que se usa para avaliar o comportamento desses animais, se usa no esporte”, explica Faríña, que define a si mesmo como “muito futbolero”, expressão bem uruguaia (ou argentina) para afirmar ser fanático por futebol.

“O fato a de a bola estar sempre muito livre e que o jogo seja coletivo faz com que a técnica seja secundária diante de outros fatores. No pênalti, podemos aplicar a biomecânica. Se o goleiro conseguir se segurar até o momento que batedor apoiar o outro pé [antes de acertar a bola], a posição relativa do corpo trai a intenção do jogador pela inclinação do tronco”, completa.

Em síntese, a posição corporal, por mais que o batedor tente disfarçar, indica o lado que vai bater, por mais que tente esconder isso.

O cientista reconhece que o futebol é resistente a conceitos científicos, mas há tendência de mudanças. Outros estudos sobre o esporte têm aparecido, assegura.

Ao mesmo tempo, o artigo deixa claro que a pesquisa é útil para ajudar goleiros, mas não afeta outros fatores inerentes ao jogo. O chute mais forte, bem no canto ou pelo alto dificulta a defesa, como sempre aconteceu. Da mesma forma, a altura e envergadura do goleiro interferem. Quanto mais alto e ágil, maior a probabilidade de defesa. São condições imutáveis.

“Sempre há o Messi, sempre há o Neymar, sempre há o Pelé, gente capaz de fazer coisas que a física não explica muito bem. Eles dominam a técnica a um ponto que sabem usar a física a favor do que querem fazer”, diz Fariña.

Também existem goleiros com talentos naturais para defender pênaltis, que usam as recomendações do estudo apenas por terem o dom para fazê-lo, sem terem consciência disso. Jogadores que ficaram famosos por serem especialistas nesta jogada. Mas eles não são a maioria.

“A ciência leva seus achados para pessoas normais, que podem descobrir coisas novas. Os goleiros que usaram nosso sistema melhoraram bastante o desempenho porque conceitos de postura vêm de muito tempo. É coisa de milhares de anos”, defende o paleontólogo uruguaio.

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