Água é ruim ou péssima em 20% das amostras de rios da mata atlântica
O relatório do Observando os Rios foi lançado nesta terça-feira (22), o dia mundial da água
FOLHAPRESS – Entre 90 rios e corpos d’água analisados na mata atlântica, o bioma mais devastado do Brasil, cerca de 20% tem qualidade de água ruim ou péssima e outros mais de 70%, qualidade regular, o que seria um sinal de alerta, segundo uma análise feita pelo projeto Observando os Rios, da ONG SOS Mata Atlântica, com patrocínio da empresa Ypê.
O relatório do Observando os Rios foi lançado nesta terça-feira (22), o dia mundial da água.
Uma qualidade ruim ou péssima de água doce significa que ela não pode ser direcionada para usos básicos, como abastecimento, hidratação de animais, produção de alimentos, e até mesmo para lazer e esportes. Já água com qualidade regular, após tratamento, permite alguns desses usos (nadar em uma água regular, porém, não é uma opção), mas isso não significa que esteja tudo bem.
“É um alerta de que, se não tomar cuidado, ela vai piorar”, diz Gustavo Veronesi, coordenador do projeto Observando os Rios, da SOS Mata Atlântica, referindo-se aos 72% de amostras com qualidade de água regular. “É um grande sinal de alerta. Uma água com qualidade regular pode ser usada, mas ela está em perigo, está no sinal amarelo.”
As amostras de água foram coletadas, no ano passado, em 146 pontos de 90 rios do bioma. É a segunda vez que o projeto é realizado em todos os estados da mata atlântica.
O projeto baseia sua análise no chamado IQA (Índice de Qualidade da Água), que foi adaptado da National Sanitation Foundation, dos EUA, e observa os parâmetros físicos, químicos e biológicos mais relevantes para avaliação das águas doces utilizadas para abastecimento público e diversos outros usos. Entre os parâmetros observados estão temperatura da água, turbidez, espumas, lixo flutuante, odor, peixes, larvas e vermes escuros e transparentes, coliformes totais, oxigênio dissolvido, fosfato e nitrato.
O resultado da análise de 2021 não é muito diferente do que foi encontrado em 2020. Segundo Veronesi, é esperado que as mudanças de um ano para o outro não sejam profundas. Afinal, poluir um rio é um processo relativamente rápido, já para despoluir a história é outra e bem mais longa.
“O rio não é sujo. Podem estar sujos, mas nenhum rio é sujo. Nós sujamos o rio, então nós temos a responsabilidade de limpeza deles”, afirma Veronesi.
O trabalho do Observando os Rios não consegue abraçar todos os corpos d’água da mata atlântica, apesar de conseguir, atualmente, acompanhar rios dos 17 estados do bioma e da vontade de expandir a zona de ação. De toda forma, o coordenador do projeto diz acreditar que os resultados em outros locais não devem ser muitos diferentes dos encontrados nos locais já observados.
Boa parte da contaminação na água encontrada pelo projeto é derivada de esgoto. Não é para menos. Segundo os dados de 2020 da Pesquisa Nacional de Saneamento Básico, do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas), quase 50% dos domicílios do Brasil, ou 34,1 milhões de lares, não tinham acesso a esgotamento sanitário por rede. Além disso, quase 40% dos municípios não tinham esse serviço em 2017.
O marco regulatório do saneamento básico prevê que até 2033 o tratamento e coleta de esgoto deve alcançar 90% dos lares brasileiros, algo que Veronesi diz torcer para acontecer, mas que mantém dúvidas sobre a real possibilidade de realização, considerando o cenário atual.
O caso do rio Tietê em São Paulo é um bom exemplo da dificuldade de mudar o rumo da poluição de um corpo d’água. Mesmo após cerca de três décadas de projeto de despoluição, somente recentemente foi possível ver melhorias pontuais, em alguns trechos.
Mas, ao mesmo tempo, esses pontos de melhoria no Tietê mostram que é possível agir sobre a poluição. Veronesi cita os pontos da saída do rio da região metropolitana de São Paula, em Santana do Parnaíba e Pirapora do Bom Jesus, que costumavam ter qualidade de água ruim e até péssima, mas atualmente estão como regular.
A última análise específica do rio Tietê, também realizada pelo projeto Observando os Rios, observou a continuidade da redução da mancha de poluição no corpo d’água e o aumento dos trechos com água boa, mantendo a tendência de melhora.
Outro bom exemplo é o lago do parque Ibirapuera, que é alimentado pelo córrego do Sapateiro, que faz parte do sistema Pinheiros-Tietê. Segundo o coordenador do Observando os Rios, o trabalho de despoluição nos dois grandes rios acabou afetando positivamente o lago do mais famoso parque de São Paulo, que agora possui água com boa qualidade (antes era regular).
“Isso é bastante significativo porque está dentro do projeto rio Pinheiros, que está com uma qualidade péssima e ainda vai demorar para ficar ruim. Não é de um mandato para outro que melhora. Precisamos parar de pensar em gestão de saneamento e água em mandatos de quatro anos”, afirma Veronesi.
O coordenador das ações de análise dos rios ainda destaca a importância dos voluntários que fazem parte do projeto. A ideia é que sempre sejam pessoas que moram muito perto dos corpos d’água para, assim, conseguirem estar sempre acompanhando o que se passa no local e fazendo jus ao nome Observando os Rios.