Novo ‘Coringa’, com Lady Gaga, aposta no musical para evitar continuação morna
"Por que fazer algo se isso não te assusta para caramba?", questionou Phillips,
TETÉ RIBEIRO
VENEZA, ITÁLIA (FOLHAPRESS) – Todd Phillips não é bom de sequência. Basta ver a calamidade que ele fez com a ótima comédia “Se Beber Não Case”, de 2009, nos dois péssimos “Se Beber Não Case 2”, de 2011, e “Se Beber Não Case 3”, de 2013.
“Por que fazer algo se isso não te assusta para caramba?”, questionou Phillips, em resposta à pergunta ‘para que fazer esse filme?’, no último Festival de Veneza, onde aconteceu a estreia mundial de “Coringa: Delírio a Dois”, que chega aos cinemas nesta quinta.
“Sou viciado em risco. É o que me mantém acordado à noite. O que faz meu cabelo cair. Mas também é o suor que me mantém em movimento”, afirmou o cineasta.
Também diretor do longa original, “Coringa”, de 2019, que levou dois Oscar, inclusive o de melhor ator para Joaquin Phoenix, Phillips talvez devesse ter dedicado mais umas noites de insônia e muitos fios de cabelo para pensar melhor neste roteiro, fraco e sem razão de existir.
Cinco anos se passaram desde que Arthur Fleck, o personagem principal, foi preso por todos aqueles assassinatos que cometeu no primeiro filme, e, enquanto espera sua sentença na ala psiquiátrica do presídio, parece cair cada vez mais fundo em um poço de amargura e tristeza.
No começo fazia piadas para os guardas, mas foi entristecendo conforme “o julgamento do século” se aproxima, e, de tão consumido pela desgraça de sua vida, parece estar ainda mais decrépito do que no original, com escápulas tão pontudas e saltadas que parecem que vão cortar o fiapo de pele que as cobre.
As coisas mudam quando ele entra no grupo de terapia musical, o coral da cadeia. É lá que ele vê e se apaixona à primeira vista por Harleen “Lee” Quinzel, a personagem de Lady Gaga, uma tiete do Coringa que jura ter visto o filme feito sobre ele umas cem vezes.
O amor era tudo que Arthur queria, e no número musical mais incrível do filme, a câmera segue Joaquin Phoenix pela sala de TV do presídio enquanto ele canta “For Once in My Life”, de Stevie Wonder. E um musical com Lady Gaga em que ela não faz parte da melhor sequência tem algum problema sério.
Além disso, é tudo fantasia. Toda a trama se passa em paralelo na vida real e no sonho, ou na torcida, de Arthur Fleck. Sua namorada é fake, nenhuma das danças é de verdade dançada, nenhuma das músicas é de verdade cantada.
Mas nem isso tem um propósito claro. “Coringa: Delírio a Dois” não é “Dançando no Escuro”, o musical de Lars von Trier com Björk, lançado em 2000, em que tudo é, de fato, sonhado pela protagonista.
Em Veneza, antes da sessão oficial, Phoenix que recuperou todo o peso que perdeu para viver seu personagem cadavérico pela segunda vez e parecia saudável e surpreendentemente loiro chegou cedo no tapete vermelho. Simpático, alegre e generoso, interagiu com os fãs que esperavam há horas do outro lado da grade que separa as estrelas das pessoas normais e dos inúmeros paparazzi. Posou para selfies, assinou autógrafos, respondeu perguntas.
Em seguida chegou o diretor, que fez graça com a onda de calor e pediu emprestado um leque de uma convidada para se abanar.
Ninguém estava lá para ver os dois, eles sabiam e pareciam em paz com isso. Era Lady Gaga a estrela daquele fim de tarde, que ainda tinha o sol alto e nem sinal de lua, noite, brisa, nada disso.
Ela chegou perto do início da sessão, e, apesar de estar hospedada a menos de 300 metros da entrada do cinema, em um carro de um patrocinador.
Quando o chapéu preto rendado criado pelo irlandês radicado em Londres Philip Treacy mostrou suas pontas, a multidão aumentou o volume dos gritos de seu nome, enquanto os paparazzi criavam uma das maiores confusões do festival deste ano, um tropeçando por cima do outro para conseguir a melhor imagem da cantora cada vez mais atriz.
Ela precisou de ajuda para se movimentar com o vestido preto longo, decotado e com saia rodada Dior, enfeitado com joias Tiffany.
Enquanto um assistente segurava sua mão, ela assinava com a outra uma longa fila de autógrafos. Os que não conseguiam chegar perto suplicavam “Gaga, por favor, Gaga, aqui”, na esperança de conseguir uma selfie.
No final da sessão, o público, em êxtase, aplaudiu de pé por 12 minutos e meio. É uma eternidade em termos de aplausos, ainda mais de pé.
Os braços cansam, o som irrita, as palmas da mão parecem queimar.
Mas nem tudo é o que parece. Os convidados das premières em festivais de cinema muitas vezes viajam de seus países originais para estar lá.
E vão para prestigiar a estreia mundial e torcer pelo sucesso de um longa-metragem que promete lucros estratosféricos para todos os envolvidos.
Sabe todos aqueles nomes que aparecem no fim de um filme de grande produção de Hollywood? Então, são eles que, em grande parte, ocupam os assentos nessas exibições. Não tem ingresso à venda para sessão de gala em festival de cinema. Ou você é convidado, ou não entra.
Por fim, bote Lady Gaga na plateia, no balcão superior, portanto atrás de quase todo mundo, já que a maior parte do público se senta no piso térreo, como em qualquer cinema. O tempo passa bem menos arrastado, não é mesmo? Ainda assim é impressionante.
Foi demais até para Phoenix, que foi embora depois do nono minuto de aplauso. E olha que ele estava batendo o maior papo com Lady Gaga o tempo todo, então não é que ele estava agradecendo emocionado nem nada.
Mais cedo, naquele mesmo dia, o trio havia participado da entrevista coletiva do festival, que tradicionalmente acontece logo depois da primeira exibição para a imprensa, pela manhã. As perguntas na coletiva eram mais dirigidas a Phoenix e a Phillips que a Gaga, a dupla que estava pela segunda vez apresentando um longa de arte com o personagem da DC Comics.
Phoenix afirmou que só disse sim ao projeto quando leu um roteiro que fez sentido para ele. A ideia de ter Lady Gaga no elenco foi a cereja do bolo.
Já ela afirmou que precisou aprender a “cantar menos bem” para interpretar sua personagem no filme, impossível de definir sem dar um pequeno spoiler, mas que, afinal de contas, atende pelo nome de Lee Quinzel, quase um anagrama do que será seu codinome de vilã, Harley Quinn. “O público é que vai definir se este é ou não um musical”, afirmou a cantora.
CORINGA: DELÍRIO A DOIS
– Quando Estreia nesta quinta (3) nos cinemas
– Classificação 16 anos
– Elenco Joaquin Phoenix, Lady Gaga, Brendan Gleeson
– Produção EUA, 2024
– Direção Todd Phillips