Câmara vota nesta terça projeto que reduz pena de Bolsonaro e demais condenados por golpismo

Movimento ocorre dois dias após senador Flávio Bolsonaro se lançar à Presidência da República

Folhapress Folhapress -
Moraes nega pedido da defesa e mantém prisão domiciliar de Bolsonaro
(Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom / Agência Brasil)

CAROLINA LINHARES E RAPHAEL DI CUNTO

BRASÍLIA, DF (fOLHAPRESS) – O presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos), decidiu que o projeto de redução de penas dos envolvidos na trama golpista será votado nesta terça-feira (9) pelo plenário. Motta comunicou a decisão aos líderes partidários durante reunião no início da tarde e, em seguida, fez um pronunciamento à imprensa.

De acordo com Motta, não houve conversas com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), a respeito de quando a Casa poderia votar o projeto. O relator do texto, deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), diz que conversou apenas com o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e que sentiu receptividade ao tema entre os senadores.

O movimento de Motta ocorre dois dias após o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), que se lançou à Presidência da República, anunciar que o preço para desistir de sua candidatura seria a aprovação de uma anistia e que seu pai, Jair Bolsonaro (PL), pudesse concorrer no ano que vem —o ex-presidente está inelegível. Em entrevista à Folha, Flávio voltou atrás e disse que sua candidatura é irreversível.

Força majoritária na Câmara dos Deputados, o centrão reagiu mal à candidatura de Flávio, por preferir Tarcísio de Freitas (Republicanos), e defende a redução de penas em vez da anistia. Por isso, a fala do senador foi vista como chantagem por políticos desse grupo.

Motta afirmou que a decisão de pautar o projeto foi pessoal e “não foi tomada para atender a pedido de ninguém”, referindo-se de forma velada a Flávio. O presidente da Câmara não quis responder a perguntas dos jornalistas e não se manifestou ao ser questionado sobre a influência do senador no anúncio da pauta.

A decisão de Motta pegou inclusive o relator e o líder do PL, Sóstenes Cavalcante (RJ), de surpresa.

Foi costurado um acordo entre a cúpula da Câmara e os bolsonaristas, porém, para que o PL não apresentasse alterações, durante a votação no plenário, para tentar transformar a redução de penas em anistia. Sóstenes afirmou que o partido seguirá insistindo no perdão completo, mas só no ano que vem.

A pressão do PL para transformar o texto de redução de penas em anistia era uma das razões que travava o andamento do projeto na Câmara. Com o compromisso de que o partido não tentaria aprovar mudanças, Motta decidiu pautar o tema.

Sóstenes afirmou que os bolsonaristas não estão satisfeitos, mas resolveram ceder porque o calendário de votações até o fim do ano está apertado e, com a medida, presos pelo 8 de Janeiro poderiam passar o Natal fora da prisão.

“Jamais vamos desistir da anistia, mas o calendário legislativo nos pressiona. É o degrau possível nesse momento para que as famílias possam dignamente passar o Natal em suas casas”, disse.

Segundo Motta, não há possibilidade de votação de anistia, apenas de redução de penas. “A questão da anistia está superada. Foi o tema de mais discussão na Casa ao longo deste ano. Nada mais natural do que chegar ao final do ano com a decisão final”, declarou.

O projeto que será colocado em votação na Câmara foi fruto de um acerto entre o centrão e ala do STF (Supremo Tribunal Federal) para restringi-lo à redução de penas em vez do perdão amplo, geral e irrestrito para Bolsonaro e os presos por participação nos ataques às sedes dos Poderes em 8 de janeiro de 2023.

Por outro lado, o texto beneficia o ex-presidente, condenado pelo STF a 27 anos e 3 meses de prisão, ao evitar a soma das penas de crimes pelos quais ele foi condenado no processo da trama golpista.

Paulinho indicou que seu texto tem o aval do STF, pois não recebeu reclamações dos ministros, e que possíveis recursos à corte em relação à medida devem ser indeferidos. Ele, que tem uma relação próxima com Alexandre de Moraes, disse que tudo o que fizer “o Supremo vai bater o martelo”.

A ministra Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais) disse que o governo irar orientar o voto contrário ao projeto, e chamou o texto de grave retrocesso. “Um arranjo político não pode fragilizar uma legislação tão importante para a democracia e o país”, escreveu no X (antigo Twitter).

Para o líder do PT, Lindbergh Farias (RJ), Motta foi influenciado por Flávio. O petista criticou a decisão de pautar a anistia. Já Sóstenes, na mesma linha do presidente da Casa, também negou que a votação tivesse relação com a declaração do senador.

“Foi uma decisão pessoal dele [de Motta], sem nenhuma outra circunstância”, disse o líder do PL. Sóstenes acrescentou ainda que Flávio pleiteia a anistia geral e, portanto, Motta não lhe atendeu.

Nesta segunda (8), em resposta à pressão de Flávio por anistia, Paulinho afirmou que adeclaração do senador não muda nada na proposta.

“O pessoal do PL voltou a falar nessa história de anistia”, disse ele. “No meu relatório não tem anistia. Anistia zero. O que tem é redução de penas”, declarou o deputado.

Reivindicação do bolsonarismo desde o ano passado, o projeto de anistia teve a urgência aprovada no plenário em setembro por 311 votos favoráveis a 163 contrários. Naquela ocasião, o texto já foi transformado por Paulinho de anistia em redução de penas sob a justificativa de não afrontar o Supremo.

O projeto, porém, havia perdido força em meio à insistência do PL pela anistia e aos embates entre a Câmara e o Senado, que resultou em receio dos deputados de que os senadores enterrassem a matéria, a exemplo do que fizeram com a PEC (proposta de emenda à Constituição) da Blindagem.

Bolsonaro foi condenado por cinco crimes: organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça e deterioração de patrimônio tombado.

Moraes afirmou que ele “colaborou para incitar a população” contra o sistema eleitoral. “Espera-se que aquele que foi eleito democraticamente para o posto mais elevado da República se conduza com maior rigor. Infelizmente, não foi o que ocorreu, então a culpabilidade é desfavorável”, declarou.

Do total da pena, o ministro defendeu que 24 anos e 9 meses sejam cumpridos em regime de reclusão. Os demais 2 anos e seis meses, em regime de detenção, além de 124 dias-multa fixados em dois salários mínimos.

Quando Bolsonaro iria para o regime aberto

Segundo estimativa da Vara de Execução Penal divulgada no início do mês, ele poderia ir para o regime semiaberto em 2033 e ter liberdade condicional apenas em 2037.

A previsão, enviada ao STF, usa como data-base o dia 4 de agosto de 2025, quando Moraes decretou prisão domiciliar do ex-presidente por descumprir medidas cautelares.

A partir disso, a projeção é que o ex-presidente deve passar para o regime semiaberto em 23 de abril de 2033. A liberdade condicional, por sua vez, pode ser alcançada em 13 de março de 2037. Já o término da pena é previsto para 4 de novembro de 2052. Bolsonaro completou 70 anos em março.

Ele está preso na PF na chamada sala de Estado-Maior, espaço onde ele não convive com outros detentos e no qual há maior conforto do que num presídio. A estrutura atual é um quarto de 12 m², com televisão, ar-condicionado, banheiro privado e uma escrivaninha.

Folhapress

Folhapress

Maior agência de notícias do Brasil. Pertence ao Grupo Folha.

Você tem WhatsApp ou Telegram? É só entrar em um dos grupos do Portal 6 para receber, em primeira mão, nossas principais notícias e reportagens. Basta clicar aqui e escolher.

+ Notícias