Com pandemia, déficit no atendimento a crianças com cardiopatia congênita cresce em Goiás

Um a cada 100 nascidos vivos, de acordo com a Sociedade Goiana de Pediatria, tem doença cardíaca

Isabella Valverde Isabella Valverde -
Com pandemia, déficit no atendimento a crianças com cardiopatia congênita cresce em Goiás
Samuel e Yhan são crianças com cardiopatia congênita e filhos das idealizadoras da Associação Amigos do Coração. (Foto: Arquivo Pessoal/Martha Camargo)

O atendimento a crianças com cardiopatia congênita em Goiás encara um déficit histórico, que piorou depois da pandemia de Covid-19, segundo a Sociedade Goiana de Pediatria (SBP).

Dados do Ministério da Saúde e do departamento de cirurgia cardiovascular da Sociedade Brasileira de Cardiologia demonstram o quão preocupante é esta situação.

A região Norte do país lidera com maior déficit de atendimento, com 93%. Em seguida, é possível notar o Nordeste. com 77,4%, Sudeste, com 57,6%, Centro-Oeste, com 57,4% e a região Sul, com 46,4%.

Ao Portal 6, a pediatra, cardiopediatra e membro da entidade, Mirna Sousa, afirma que, até o momento, nenhuma região do Brasil conseguiu oferecer o devido tratamento para todos que precisam.

“Nem Goiás nem nenhum outro estado brasileiro tem conseguido atender e tratar todas as crianças com cardiopatia. Temos um déficit histórico em atendimento dessas crianças. Essa deficiência de atendimentos é séria e antiga, mas piorou depois da pandemia”, afirmou.

Dra. Mirna aponta que, apesar da deficiência, Goiás possui capacidade para tratar qualquer cardiopatia. O problema maior reside na qualidade dos tratamentos.

“Atualmente o estado de Goiás tem capacidade de tratar qualquer cardiopatia, mas os resultados não são bons em algumas cardiopatias críticas que levam a morte ainda no período neonatal como a síndrome de hipoplasia do coração esquerdo”, apontou.

“Nos últimos 5 anos, Goiás avançou muito em melhoria de resultados no tratamento de cardiopatias, principalmente depois que passou a realizar cateterismo intervencionista e procedimentos híbridos onde cirurgia e cateterismo se unem e tratam ao mesmo tempo a criança”, completou.

Segundo a médica, Goiás é um dos poucos estados do país que conta com UTI cardiológica e cateterismo intervencionista pelo SUS. As crianças que recebem o diagnósticos podem ser atendidas no Hospital Estadual da Mulher (HEMU), Hospital Estadual da Criança e do Adolescente (HECAD) e Hospital de Urgências Governador Otavio Lage (HUGOL), em Goiânia.

Diagnóstico

O diagnóstico da cardiopatia congênita pode ser realizado ainda mesmo durante a gestação, por meio de um ecocardiograma fetal, ou após o nascimento no bebê.

“[O diagnóstico] Pode ser feito ainda no pré-natal através do ecocardiograma fetal ou após o nascimento. Desde 2015 é obrigatória a realização do teste do coraçãozinho em todos os bebês nascidos em território nacional antes da alta da maternidade com objetivo de buscar cardiopatias graves que não foram detectadas na gestação. A realização do ecocardiograma após o nascimento é o método de ouro para diagnóstico de cardiopatia”, explicou Dra. Mirna.

Laura Barboza, cirurgiã cardíaca pediátrica, apontou para a reportagem que “a incidência de cardiopatia congênita é de 1 criança a cada 100 nascidos vivos”.

Associação Amigos do Coração 

Como o diagnóstico de cardiopatia congênita e todo o processo de tratamento não são nada fáceis para os familiares que acompanham de perto e sentem toda a angústia, a Associação Amigos do Coração age no estado como uma forma de acolher todos aqueles que estão passando por isso e precisam de ajuda.

A organização foi criada há 13 anos por Martha Camargo, juntamente com Eliade Pontes, sendo ambas mães de crianças cardiopatas.

Desde o início, sabendo as dificuldades que podem rondar o diagnóstico, como é o caso até mesmo da falta de informações, as mães buscaram um meio de poder orientar outras famílias que estivessem passando pela mesma situação.

“A associação surgiu há 13 anos, quando precisei ir pra fora buscar tratamentos! Juntamente com outra mãe, Eliade Pontes, formamos a Associação de Crianças Cardiopatas no intuito de buscar informações centradas, lutar pelo serviço de qualidade aqui em Goiás. Nossa intenção é de que as famílias possam ter informações seguras quando recebe o diagnóstico e que busque tratamento adequado em tempo adequado”, contou Martha.

A idealizadora do projeto explica que o intuito da Associação Amigos do Coração é de realmente acolher todos aqueles que de alguma forma precisam de ajuda envolvendo o tratamento, seja com hospedagem ou apenas com informações seguras.

“Somos a parte que acolhe! Ajudamos as famílias que vem do interior com hospedagem, temos uma casa que tem parceria conosco para receber essas famílias. Entendemos que conhecimento é poder , por isso, quando se recebe o diagnóstico é um turbilhão de informações e na maioria das vezes , informações distorcidas que acabam fazendo a família perder o foco. Buscamos acolher , informar encaminhar e prosseguir para ver essa criança chegar a vida adulta plena”, pontuou Martha Camargo.

“Sabemos que existe um longo caminho a frente, mas o que não pode acontecer é assistirmos famílias buscando recursos próprios pra lutar por tratamento fora do estado. O direito à saúde é instituído em lei por nossa constituição federal, então, quem deve prover é o governo para que nossos cardiopatas tenham vida. Nosso lema é : existe vida além da cardiopatia congênita”, complementou.

Com a palavra, a Secretaria Estadual de Saúde

Em nota encaminhada ao Portal 6, a Secretaria Estadual de Saúde (SES) destacou que atualmente o atendimento ambulatorial de cardiopediatria está concentrado no Hospital Estadual da Criança e do Adolescente (HECAD), havendo um profissional com dedicação exclusiva para tal de segunda a sexta-feira.

A pasta ainda reforça que “no momento não há planejamento para contratação de mais profissionais que atuam nesta área, pois a organização atual é suficiente para o atendimento das demandas do HECAD, que são ambulatório de cardiologia e pareceres internos”.

O órgão ainda reforça que não há demora da parte da gestão estadual e que o”Complexo Regulador Estadual (CRE), responsável pela gestão das vagas no Hecad e Hospital Estadual de Urgências Governador Otávio Lage de Siqueira (Hugol), informa que há 20 pacientes aguardando consultas cardiopediátricas, os quais serão agendados para a unidade HUGOL e sendo caso cirúrgico, o médico da unidade lançará o pedido para a SES conferir, validar e autorizar”.

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