“Dia dos Legendários” em Anápolis é um bom negócio, menos para a população; saiba por que

Movimento, que cobra até R$ 80 mil por "experiências", conseguiu apoio político de Wederson Lopes, mas enfrenta resistência de vereadores que boicotaram votação na Câmara Municipal

Samuel Leão Samuel Leão -
“Dia dos Legendários” em Anápolis é um bom negócio, menos para a população; saiba por que
Legendários tristes no plenário da Câmara de Anápolis. (Foto: Divulgação/ Câmara Municipal de Anápolis)

A Câmara Municipal de Anápolis pode aprovar nesta quarta-feira (20), em segunda e definitiva votação, a criação do “Dia dos Legendários” na cidade.

O projeto, de autoria do vereador Wederson Lopes (União Brasil), teve a votação adiada na terça-feira (19) por falta de quórum. Isso obrigou o autor da proposta a se desculpar com os cerca de 11 membros do movimento que acompanhavam a sessão no plenário.

O movimento Legendários, que se apresenta como uma iniciativa cristã para “resgatar valores” e “transformar homens”, também opera como empresa lucrativa. A “experiência” oferecida pelo grupo pode custar de R$ 1.490 até mais de R$ 80 mil, dependendo do local e do tipo de retiro escolhido.

Em Anápolis, o movimento possui CNPJ desde abril de 2024, usando como nome empresarial “Legendários Goiás Assessoria e Eventos Ltda”.

O capital social é de R$ 5 mil e a sede fica na Avenida Recife, no bairro São João, na região Sudoeste da cidade.

Para não deixar dúvidas quanto à associação com o que se conhece como Legendários no Brasil, o núcleo em Anápolis tem como único sócio o guatemalteco Nelson Ruela de Lima, que é o próprio “fundador” dos Legendários a nível mundial.

Vereador que propôs pertence à polêmica igreja de Anápolis

Wederson Lopes já esteve no centro de outras discussões públicas. O vereador, que já foi uma aposta política da Luz para os Povos, hoje integra a Church City. A congregação, também conhecida como “igreja da parede preta”, chegou a ser investigada pela Polícia Civil e pelo Ministério Público de Goiás, em 2023.

A investigação foi motivada por suposta “cura gay” promovida por uma ex-trans, que dava “testemunhos” de correção de rota de gênero em colégios públicos de Anápolis.

O caso, tornado público pelo Portal 6, repercutiu nacionalmente e resultou no afastamento das diretoras por parte da Secretaria Estadual de Educação (Seduc-GO).

Deputado Coronel Adailton quer ir mais além com os Legendários

O interesse político pelos Legendários não se restringe a Anápolis. Na Assembleia Legislativa de Goiás (Alego), o deputado estadual Coronel Adailton (Solidariedade), que já participou de uma edição do movimento, propôs no último mês de julho que os Legendários sejam considerados patrimônio imaterial de Goiás.

Outros políticos como Paulo Cezar Martins (PL), Ismael Alexandrino (PSD) e o ex-prefeito Gustavo Mendanha (PSD) também já estiveram em eventos do grupo.

Negócio, fé e muitas críticas na internet

O movimento-empresa tem gerado reações diversas na internet, onde internautas questionam os valores cobrados e a mistura entre fé e negócio. Os Legendários também estiveram envolvidos em episódios recentes que ganharam repercussão, como o ataque de abelhas que deixou dezenas de feridos durante um evento em Caldas Novas no último dia 16.

A votação desta quarta-feira (20) dirá se Anápolis oficializará um dia em homenagem ao movimento que, em pouco mais de um ano, conseguiu se estabelecer comercialmente na cidade e conquistar apoio político suficiente **para se impor** no plenário da Câmara Municipal.

Participar de uma “experiência” com os Legendários pode custar mais de R$ 80 mil

Ser um Legendário, realmente, não é para os fracos. Além dos testes físicos e das “torturas psicológicas”, os participantes têm de pagar, conforme já repercutido pela imprensa nacional, de pouco mais de R$ 1.400 a mais de R$ 80 mil — se a “subida no morro” for no Pantanal ou no Rio de Janeiro.

Nesses dois lugares, a empresa cobra pela experiência “top”. O fundador nega que seja isso tudo, mas não faltam notícias que atestam o valor.

Legendários prometeram transformar “cidade da boemia”

Por meio de um corretor imobiliário fortão, o grupo publicou nas redes sociais que Caldas Novas “vai viver algo inédito” e que a cidade, “por muito tempo, foi marcada por lazer e boemia”, mas agora “uma nova história está sendo escrita”. Em pouco tempo, os internautas descobriram que ele era expert em trair a esposa e, por isso, teve de ir a público para se explicar.

Abelhas se vingaram pela população de Caldas Novas

O evento em Caldas Novas, que prometia transformar homens em “guerreiros”, acabou com dezenas de participantes sendo atacados por abelhas.

Dez pessoas precisaram de atendimento médico, algumas ficaram internadas e o Samu teve de ser acionado. A coordenação do evento minimizou o ocorrido, mas a natureza não respeitou os altos valores pagos pela experiência.

Políticos de Goiás fazem fila para “subir o morro” com os Legendários

Além de Wederson Lopes e Coronel Adailton, outros políticos goianos já participaram dos eventos dos Legendários. Paulo Cezar Martins (PL), deputado estadual veterano na Alego, chegou a propor cidadania goiana para o fundador guatemalteco do movimento.

O deputado federal Ismael Alexandrino (PSD) e o ex-prefeito de Aparecida de Goiânia, Gustavo Mendanha (PSD), também já estiveram em retiros.

Nota 10

Para o Grupo Especial de Investigação Criminal (CEIC), de Anápolis, pelo avanço nas investigações sobre compra e venda de diplomas falsos.

Só faltou a TV Anhanguera, que obteve com exclusividade diálogos que até então só a Polícia Civil tinha, lembrar que o Pastor Dênis também foi servidor da Prefeitura de Anápolis na segunda gestão Roberto Naves (Republicanos).

A emissora associou o religioso apenas a Wederson Lopes. Justo no dia de maior revés da carreira do “vereador de quatro mandatos”.

Nota Zero

Para ex-diretora de Cultura da Prefeitura de Anápolis, Delvanira Bernardo Silva. A atuação dela na última audiência pública realizada na Câmara Municipal foi um verdadeiro manual do que não se fazer em evento como aquele.

*Colaborou Danilo Boaventura

Samuel Leão

Samuel Leão

Jornalista formado pela Universidade Federal de Goiás, com passagens por veículos como Tribuna do Planalto e Diário do Estado. É mestrando em Territórios e Expressões Culturais no Cerrado pela Universidade Estadual de Goiás e atualmente assina a coluna Rápidas, no Portal 6, onde publica informações exclusivas e os bastidores da política, economia e outros temas de interesse público.

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